Sejamos claros: há mais de 25 anos, ver barracas em Lisboa, no Porto ou noutras cidades do país era tão normal como apanharmos um autocarro da Carris ou da STCP cheio e atrasado. Se é verdade que hoje em dia não de veem barracas nas principais cidades, o mesmo já não pode dizer-se dos atrasos e más condições dos transportes públicos. E, seja por ter sido com dinheiros comunitários ou não, a verdade é que o combate às barracas deu-se no Governo de Cavaco Silva.
Independentemente disso, há uma personagem na vida política portuguesa que tem dedicado parte da sua vida à batalha por uma habitação condigna dos cidadãos: Helena Roseta. A atual presidente da Assembleia Municipal de Lisboa e deputada eleita pelo PS, sempre se empenhou na causa e em 2016 propôs, na Assembleia da República, a criação do grupo de trabalho da Habitação, Reabilitação Urbana e Políticas de Cidade. Em 2017 dizia ao jornal i: «A lei não pode fazer tudo, mas pode apontar direções e é, por isso, que me tenho batido e estou a trabalhar por uma Lei de Bases da Habitação. A habitação é um direito social consagrado na Constituição da República que, ao contrário de todos os outros, nunca teve uma lei de bases. A educação tem uma Lei de Bases já há muitos anos, a Saúde, a Segurança social, o Ambiente, a Cultura… tudo tem leis de bases. A habitação nunca teve».
Esta semana o país foi informado, tanto quanto possível – atendendo ao silêncio de muitos, que estão no seu direito de noticiar o que bem entendem, é certo -, de que Helena Roseta se demitiu da coordenação do grupo parlamentar da habitação que procura encontrar a tal lei de bases do setor. O PS adiou pela terceira vez a votação na AR, e Roseta bateu com a porta: «Obviamente demito-me. Um partido não tem a maioria e pede o adiamento sucessivo das votações? Só por não ter a maioria? Acho que isto não se pode fazer. Em última análise, põe em causa a democracia. Não se pode fazer isto. Acho que é perigoso», confessou ao jornal i. Um dia depois de ter tomado publicamente esta decisão foi afastada do grupo de trabalho sem ter sido avisada. Roseta tinha-se demitido do cargo de coordenadora, mas não renunciara ao grupo de trabalho. «Ninguém me avisou», garantiu ao mesmo jornal. Como é possível o PS ter feito a uma deputada sua, que tem dedicado, como já foi dito, parte da sua vida à causa da habitação, o que fez? Será que o Governo não consegue conviver com vozes contrárias?
Não estão em causa os equilíbrios que o PS tem de fazer na AR. Por um lado, é preciso agradar à ‘geringonça’ e, por outro, é preciso o consenso com o bloco PSD/CDS para que estes aprovem o que os outros reprovam e vice-versa. Mas expulsar uma deputada do seu partido, sem a avisar, revela bem o que o PS pensa, e por conseguinte o Governo, nesta matéria como noutras. Os meios justificam todos os fins. Carlos César, o ilustre presidente da bancada parlamentar socialista, bem pode dizer o que quiser. Contra factos não há argumentos. Não será pois de estranhar que Helena Roseta, num futuro próximo, seja apagada da família socialista, apesar de lá estar como convidada. A Lei de Bases da Habitação pode esperar por melhores dias.
P. S. Também é óbvio que com a crise e a vinda da troika se voltaram a ver barracas na periferia das principais cidades, Veja-se o caso da Costa de Caparica. É pois urgente erradicar esse problema da sociedade portuguesa.
vitor.rainho@sol.pt