Vai fazer campanha pelo CDS nas eleições europeias de 26 de maio?
Sim, se for convidado.
Significa que houve aproximação do CDS a Manuel Monteiro ou de Manuel Monteiro ao CDS?
Interiormente, tenho a convicção de que voltei a aderir ao CDS. Era uma questão relevante para mim, sob o ponto de vista emocional e racional. As duas questões estão ultrapassadas. Sob o ponto de vista formal, da inscrição, por agora, não se me coloca o problema. Se tiver de acontecer, acontecerá.
Não precisa de um cartão de militante para fazer parte do CDS?
Não. Uma coisa era participar como participei na campanha para a Junta de Freguesia de Alvalade nas eleições autárquicas em que Assunção Cristas foi candidata à Câmara de Lisboa. Outra coisa era dar aquele salto interior de aproximação. E fiz esse salto. O programa é o mesmo, não houve mudanças, e depois há aqui um dado para mim muito relevante que é o discurso de Nuno Melo nas eleições europeias.
A aproximação deve-se a Nuno Melo ?
Sim, sim. Agora, do lado do CDS também tem existido uma aproximação manifestada por variadíssimos convites que tenho recebido de estruturas distritais e concelhias e de outros grupos para participar em conferências organizadas pelo próprio partido. Penso que chegámos a meio da ponte. Acho que há aqui uma tranquilidade imensa e daí lhe dizer que nestas eleições europeias vou votar Nuno Melo. Penso que os conservadores lhe deveriam dar o apoio e não deveriam utilizar estas eleições europeias como protesto.
Porquê?
Nuno Melo está a conseguir fazer uma síntese inteligente do legado do partido em termos europeus. Ao mesmo tempo está a fazer a reafirmação de uma ideia da Europa das Nações. Isso a mim mobiliza-me, motiva-me, entusiasma-me e penso que o povo conservador português que tem estado quase a ser perseguido por ser conservador…
Em que se baseia para dizer que há uma quase perseguição ao povo conservador português?
Hoje quem tem uma visão conservadora da sociedade é quase perseguido por uma lógica de inquisição que conduz a que as pessoas tenham receio de dizer o que pensam, a dizer o que são, a aderirem e a manterem os seus valores e as suas convicções tradicionalistas.
E a que se deve a sua análise? Quais são os fatores?
Deve-se a duas coisas que não são património exclusivo de Portugal. São património europeu e ocidental. Deve-se a um ativismo que estava adormecido e teve início no Maio de 68 e que hoje – a partir de muitas escolas de sociologia e pensamento sociológico – voltou a dar cartas, mas a aparecer de uma forma inquisitorial. Há uma geração à qual eu pertenço que a seguir ao 25 de Abril foi perseguida por não ser de esquerda. E resistiu. Em Portugal, a determinada altura quem não era de determinados partidos era fascista. Eu era da Juventude Centrista e era perseguido. Tive colegas que foram agredidos fisicamente por serem da Juventude Centrista.
Mas isso hoje não acontece.
Bom, repare, essas pessoas que tiveram essa experiência não podem ter medo de dizer o que são. Eu não posso aceitar que as pessoas, que são conservadoras, tenham medo de dizer o que são, porque a democracia não é o quintal apenas do Marxismo ou do Leninismo.
Falou de ativistas inquisitoriais. Onde é que eles estão?
Estão no BE, estão no Podemos, estão em todos estes partidos que ao nível europeu têm tido uma presença cada vez mais ativa, a partir de uma ação que foram tranquilamente desenvolvendo nas escolas, na cultura, na área das ciências humanas e as outras pessoas foram recuando, foram tendo medo. A democracia precisa de confronto de ideias. No dia em que se retirar o confronto de ideias a democracia vai morrer. E esta gente não percebe isso. Esta gente diz: você é de direita, logo não tem direito a existir, a não ser que seja a direita que a esquerda gosta.
E qual é essa direita?
É aquela direita que se preocupa em dizer só o que a esquerda quer que se diga, a direita que tem receio em afirmar que não concorda com o aborto, com a eutanásia, ou com o casamento entre pessoas do mesmo sexo, como se isso fosse colocar em causa o respeito que todos os seres humanos devem ter, independentemente, das suas opções sexuais. Penso que esta lógica avassaladora pode levar a que muitas pessoas conservadoras não votem, ou então, possam ser conduzidas ou induzidas a votarem em partidos recém-chegados ou em grupos recém-chegados que possam ter no discurso uma voz panfletária. Os conservadores devem ter consciência que esse seu voto deve ser naqueles que, pertencendo a partidos estruturados, pensam também como eles. Nesse aspeto, creio que Nuno Melo é uma lufada de ar fresco para a renovação do pensamento conservador português.
A que partidos ou movimentos recém-chegados se está a referir? À coligação Basta?
O Chega, a [coligação] Basta, o Aliança, o Iniciativa Liberal, a Democracia 21, todos têm direito a expressarem-se em democracia e a dizer presente. Não há nada da minha parte que seja contrário à lógica legítima de qualquer pessoa querer formar um partido político e de querer afirmar os seus pontos de vista. Bem pelo contrário. Outra coisa completamente diferente é as pessoas não perceberem que a campanha que está a ser protagonizada por Nuno Melo responde aos anseios desses conservadores que poderiam ser tentados a votar em qualquer uma dessas formações políticas, num sinal de protesto. Esse sinal de protesto faria sentido se, dentro dos partidos já estruturados, não existisse uma voz que vai ao encontro desse mesmo pensamento.
Está a excluir o PSD dessa equação de discurso conservador.
Sim, sim, o PSD nunca foi um partido conservador. Em determinado momento foi um guarda-chuva onde se albergaram pessoas de várias áreas e várias matizes ideológicas, mas o PSD hoje não é conservador. Há três candidaturas que têm um pensamento claro sobre o que deve ser a Europa na sua globalidade. É a candidatura de Nuno Melo, a de Paulo Rangel, e a de João Ferreira, da CDU. Penso que são os três candidatos que melhor corporizam e que defendem pontos de vista muito próprios e muito distintos sobre modelos de sociedade e modelos de Europa.
Exclui o PS e o BE.
O PS não tem uma candidatura ao Parlamento Europeu. Tem uma candidatura antecipada à Assembleia da República. Creio que António Costa lançou uma armadilha muito bem montada para estas eleições europeias quando determinou: não discutam a Europa. Quando vem dizer que estas eleições são a primeira volta das eleições legislativas, são uma moção de confiança ao Governo, o que ele quer? Não quer discutir a Europa. Porquê? Porque António Costa sabe que discutir as questões europeias aumenta a clivagem com os seus parceiros de Governo.
António Costa quis nacionalizar as eleições europeias?
Sim, para garantir a estabilidade do Governo. Esta armadilha deve ser desmontada para se perceber que António Costa é a única pessoa neste país que tem vantagem em não discutir Europa, ou apenas em ter umas conversas pontuais sobre a questão europeia.
E Paulo Rangel?
Paulo Rangel tem um pensamento próprio que respeito. Penso que é das pessoas melhor preparadas politicamente no país. Não concordo com ele, mas o facto de não concordar com as suas ideias, não significa que não o respeite e não o admire. O BE tem uma agenda sobre a Europa, para mim, totalmente incoerente. Nós nunca soubemos até hoje verdadeiramente qual é o pensamento daquele partido em relação à Europa. Querem rendimentos mínimos europeu. Está bem, mas querem maior concentração de poderes nos parlamentos nacionais ou concordam com a transferência continuada de poderes para o Parlamento Europeu?
Em relação à Europa, o CDS de hoje não é o mesmo de há 20 anos.
Nenhum de nós é o que foi há 20 anos para o bem e para o mal. Mas creio que Nuno Melo tem procurado fazer a síntese dos vários legados do CDS sem excluir o Partido Popular. Essa questão para mim é uma questão relevante. Quando Nuno Melo coloca a tónica da defesa da Europa das nações e de uma defesa de uma Europa que não abala e não prejudica o bilateralismo e a capacidade atlântica de Portugal, penso que todos aqueles que se reveem nesta ideia têm nele alguém que pode ser o porta-voz destas preocupações no Parlamento Europeu.
Ou seja, é a única alternativa de direita nas eleições europeias?
Nuno Melo é a única alternativa de direita democrática.
É um eurocético.
Sou um eurocético em relação a este modelo da União Europeia. Totalmente. É por isso que digo que quanto maior for a liberdade dos Estados para decidirem questões centrais da sua própria vida, mais forte será a União Europeia. Tenho uma grande expectativa sobre o que vai acontecer nas eleições europeias em Inglaterra.
No Reino Unido há uma fase de transição. As eleições estão marcadas apenas porque não há acordo aprovado para o Brexit.
Não me surpreenderia que, havendo eleições para o Parlamento Europeu, os críticos da União Europeia e os defensores do Brexit voltassem a ganhar.
Bruxelas passou as últimas décadas fechada em si própria?
É autofágica. É auto-convencida. Está ciente de que tudo o que diz tem de ser lei. Se não for a bem é a mal e não admite que alguém possa duvidar. O Brexit é o resultado disso e também do mau cálculo da globalização.
Defende que é preciso refundar a Europa. Como se faz isso?
Em primeiro lugar, a melhor forma para sabermos se uma solução é boa é, pelo menos, admitir discuti-la. Penso que se continuarmos a ter o desinteresse permanente – e esmagadoramente maioritário – dos povos europeus em relação às eleições para o Parlamento Europeu, então as pessoas devem pensar se deve haver um Parlamento Europeu constituído por representantes eleitos diretamente ou por representantes designados pelos próprios parlamentos nacionais, como era antigamente.
Isso é colocar em causa todo o projeto da União Europeia.
O modo como esse projeto está a ser seguido está falido. O problema é saber se apenas o projeto vai ao fundo ou se nos vai levar ao fundo a todos nós. E eu não quero ir ao fundo por causa do projeto em que não acredito.
Há um consenso nacional de que Portugal está melhor dentro da União Europeia.
Mas isso eu não ponho em causa. Nunca me viu, nem verá a defender saída de Portugal da União Europeia. O que discordo é desta União Europeia. E entendo que é um erro total para a própria Europa, para os Estados da Europa e mais importante do que isso, para as democracias nacionais europeias, estarmos a querer manter artificialmente um projeto que vive de balões de oxigénio e com os compromissos permanentemente atrás. Não podemos ter a ideia de que se as pessoas não acreditam, se isto não funciona, que a culpa é sempre dos outros, porque também tenho de admitir que possa estar errado. Essa é aliás uma essência de quem é um conservador. Um conservador não é um dogmático. É alguém que tem certezas mas não põe em causa dúvidas sobre a construção dessa certeza.
A solução para a abstenção nas eleições europeias poderia ser resolvida juntando duas eleições: Parlamento Europeu e Assembleia da República?
Isso é colocar panos quentes numa dor. Houve um tempo em que existiam três correntes muito claras sobre o modelo europeu. O modelo federalista, claramente defendido por François Miterrand, Helmut Kohl, Mário Soares, Freitas do Amaral, António Guterres; um modelo antieuropeísta defendido por pessoas como a senhora Le Pen, (e defendido pelo PCP); e o modelo soberanista, muito na linha do general De Gaulle e também da senhora Tatcher. E que, em determinado momento, procurei corporizar em Portugal. Não descansaram enquanto não procuraram destruir a corrente soberanista. E agora levaram apenas com os antieuropeus. Porque os soberanistas nunca foram contra a União Europeia, tinham era uma ideia diferente de União Europeia.
Nuno Melo foi acusado de normalizar a extrema-direita por admitir o Vox, a força política espanhola que obteve 24 deputados nas eleições espanholas, no PPE. Concorda?
O que ele disse não foi entendido.
O Vox é ou não é de extrema-direita?
Sinceramente, não sei. Felizmente não sou espanhol, sou português e não tenho que me envolver nessa classificação. Não obstante, tenho de dizer que acho extraordinário esta democracia que admite que haja extrema-esquerda, mas não admite que exista extrema-direita. Não tenho de ter receio da extrema-direita que aceita o jogo da democracia. A democracia não pode ser constituída apenas pelas pessoas que vestem todas da mesma forma, que pensam todas mais ou menos da mesma forma e que decidem entre si o que é que eu posso discordar. Estamos a assistir a uma democracia totalizante, em que os conservadores têm de pedir licença para respirar, para dizer que são católicos, para educarem os seus filhos como muito bem entendem, porque as escolas hoje funcionam como faróis, guias, orientadores, condutores do pensamento da educação dos próprios pais… É isso que leva aos radicalismos.
Mas defender um número para receber os migrantes não é uma ideia de extrema-direita?
Entendo que Portugal, obviamente em nome da solidariedade, nunca deve dizer nós não queremos que venham pessoas de fora. Isso não é correto. Mas penso que também não é correto nem sério que nós recebamos as pessoas sem termos condições de as receber e que o façamos sem saber se aqueles que vivem cá têm condições de sustentabilidade e de dignidade que não os leve eles próprios a tornarem-se radicais.
Hoje não tem dúvidas que votará em Cristas nas legislativas?
Não tenho dúvidas que votarei Nuno Melo nas europeias. Espero com ansiedade o programa para poder votar em Assunção Cristas com o mesmo entusiasmo com que vou votar em Nuno Melo. Mas poder-lhe-ia responder de outra forma: se Nuno Melo foi escolhido por Assunção Cristas, eu estou a votar indiretamente em Cristas.
Qual é o melhor resultado possível nas europeias para o CDS?
Ganhar. Mas isso penso que ninguém acreditará que vá acontecer…
Pedro Santana Lopes chegou a sugerir que para se derrotar a esquerda nas legislativas seria útil haver uma junção de forças entre PSD, CDS e Aliança. Faz sentido discutir-se coligações pré-eleitorais, criando dois blocos – um de direita e um de esquerda?
Respeito imenso Santana Lopes, mas não entendi muito bem essa sua proposta, ainda para mais tendo ela surgido logo após a sua saída do PSD. Não entendi bem, mas admito que seja falha minha.
Essa aliança pré-eleitoral não seria um sinal de mera sobrevivência?
Claro. Acho que uma coisa que desprestigia a política e afasta as pessoas é que é tudo muito bonito na altura de juntar posições e depois chegam ao poder e não podem fazer rigorosamente nada daquilo que disseram. Mal chegam ao poder são oposição de si próprios. A única forma que podemos superar isso é ter claramente denominadores comuns que superam os aspetos que não são comuns – que era o que tinham Sá Carneiro, Freitas do Amaral, Amaro da Costa e Ribeiro Telles. Eles tinham isso.
Rui Rio nunca poderia ser líder de um bloco de direita?
Penso que não.
Faria mais sentido Rui Rio ser o rosto de um bloco central do que de um de direita?
Eventualmente.
Está mais próximo do PS do que do CDS?
Em termos ideológicos sim. E ele nunca negou isso.
Isso é uma vantagem para o CDS?
Eu acho que sim. Mas repito: fazer blocos pela negativa, para sermos contra, para tirarmos os que lá estão para irmos para lá nós, penso que é um erro a prazo.
Foi líder do CDS-PP entre 92 e 98, saiu em rutura sobretudo com o então líder Paulo Portas, fundou o partido Nova Democracia em 2003, foi extinto em 2010.
Mas eu já estava afastado do Nova Democracia há mais tempo.
Ao longo destes anos todos, voltou a falar com Paulo Portas?
Não.
Em 2003 lança o Nova Democracia, chegou a ser candidato às europeias. Arrepende-se de ter criado este projeto, uma vez que não conseguiu levá-lo avante?
Não lhe sei dizer se me arrependo ou não. Penso que é sempre difícil avaliarmos o que fizemos há 10 anos com os olhos de hoje. Neste caso, até foi mais algum tempo. Quase 16 anos. Há uma lição que tirei desse tempo: dê as voltas que eu der, principalmente para um determinado tipo de pessoas acima dos 40 anos, a minha cara é de CDS. E senti isso quando estava na Nova Democracia.
Chegou a fazer campanha e a confundirem-no com o candidato do CDS?
Chegaram a dizer-me ‘Sr. Dr. conte connosco, vamos votar no CDS’.