O fim das taxas moderadoras nos centros de saúde e em consultas ou exames prescritos por profissionais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) vai ser faseado, não entrando em vigor já no próximo ano, como previa o projeto de lei do Bloco de Esquerda (BE).
O diploma foi aprovado no parlamento na generalidade no passado dia 14 de junho. No entanto, o Governo decidiu contrariar mais uma vez a esquerda na saúde e deu ordem aos socialistas para mudar o projeto-lei na especialidade. Fonte do Executivo disse ao Expresso que a isenção das taxas moderadoras, que custa “cerca de 150 milhões de euros/ano” vai ser faseada porque “não há dinheiro para isso”.
“O faseamento, penso que não só é exequível, como é a única forma que teremos para fazer a redução daquilo que neste momento é o valor das taxas moderadoras”, disse Marta Temido, ministra da Saúde aos jornalistas, após uma iniciativa do Partido Socialista (PS) ontem, em Faro.
A ministra apontou que é imperativo refletir sobre como o faseamento irá ser realizado, salientando que as taxas moderadoras são “uma receita para o sistema”. “Há, agora, eventualmente, a necessidade de estudar o faseamento” e “como vão ser repostos esses cerca de 160, 170, 180 milhões de euros”, explicou.
Esquerda fica indignada
Quem discorda destes argumentos é a coordenadora do BE que considerou o “recuo dos socialistas” uma decisão “surpreendente” e contraditória. “O PS aparece surpreendente, porque recua em relação ao que já tinha sido acertado, dando agora outro argumento, de que as taxas moderadoras são muito necessárias para financiar o SNS”, apontou
Catarina Martins, este domingo, no encerramento de um encontro das estruturas do BE do litoral alentejano. A líder bloquista ainda recordou que os socialistas tinham afirmado, há cerca de seis meses, que o peso das taxas moderadoras era irrelevante para o financiamento do SNS. “Corresponde a cerca de 1% do orçamento, quando na verdade o grande custo são os dois milhões de tratamentos, consultas e meios de diagnóstico que ficaram por fazer por as pessoas não conseguirem pagar as taxas moderadoras”, acrescentou.
Mais, a coordenadora do BE ainda garantiu que “fica muito mais caro para o país” que os utentes desistam dos tratamentos receitados por não terem capacidades financeiras. “Depois a doença agrava-se, a prevenção não é feita e aí sim, temos problemas de saúde a aumentar no país”, sublinhou.
Jerónimo de Sousa, secretário-geral do PCP, também partilhou da mesma indignação e pediu esclarecimentos ao PS. “Avançar é preciso, andar para trás não. Não podemos permitir que o PS, de mãos livres, possa fazer este retrocesso que este processo da saúde demonstra”, reiterou o líder comunista num almoço da CDU, em Viana do Castelo.
O Partido Ecologista Os Verdes também veio dar força à esquerda reforçando que a medida deveria ser aplicada imediatamente. “É uma decisão premente para o país”, disse Heloísa Apolónia, em declarações aos jornalistas à margem de uma da reunião do Conselho Nacional do partido.
Divórcio à esquerda, casamento ao centro?
Mas se a relação do PS com a esquerda está a dar as últimas, o PSD parece disponível para dar a mão aos socialistas. Se o BE e o PCP votarem contra, o Governo pode contar com os sociais-democratas para aprovar a medida, apesar de o partido de Rui Rio ter votado favoravelmente o projeto dos bloquistas, que só contou com os votos contra da bancada do CDS.
Esta aproximação do PS e PSD pode mesmo vir a estender-se na aprovação da nova Lei de Bases da Saúde. Socialistas não escondem a tentativa de chegar a acordo com os sociais-democratas e estão marcadas reuniões sobre a matéria para esta semana.