O PSD vive dias de incerteza com alinhamentos que se vão fazendo quase hora a hora. Mas ontem surgiu uma declaração escrita inesperada de uma figura que é uma referência interna no PSD: Aníbal Cavaco Silva. E o texto não é simpático para o atual líder social-democrata.
O ex-Presidente da República assumiu a sua tristeza pelos resultados eleitorais. “Como social-democrata com fortes ligações à história do PSD, o resultado obtido pelo partido não pode deixar de me entristecer”, escreveu Cavaco Silva numa nota pedida pela Lusa e a que o i também teve acesso. Mais, o também antigo primeiro-ministro e líder do PSD não deixou passar em branco a estratégia de Rio que afastou ou deixou afastar algumas figuras do partido. Para o efeito, Cavaco Silva recuperou o nome de Maria Luís Albuquerque como um dos exemplos a chamar ao partido em nome do debate e da reconstrução da unidade interna do PSD. Ora foi Rui Rio não quis a ex-ministra como cabeça-de-lista do partido em Setúbal. A decisão ditou um afastamento tácito da ex-governante.
Para Cavaco Silva a “tarefa mais importante e urgente” para o PSD é mesmo essa, a de “trazer ao debate das ideias e ao esclarecimento e combate político os militantes que, por razões que agora não interessa discutir, se afastaram ou foram afastados, como é o caso de Maria Luís Albuquerque”. O ex-chefe de Estado considerou mesmo que a ex-ministra é uma “das mulheres com maior capacidade de intervenção” que conheceu no seu tempo de Presidente da República.
O apelo e o elogio não passaram despercebidos dentro do PSD, sobretudo entre quem gostaria de ver a ex-ministra das Finanças na contenda eleitoral interna que se avizinha em janeiro. Mesmo que não tivesse sido essa a intenção de Cavaco Silva. Mais, começou a crescer a ideia interna no PSD de que Maria Luís Albuquerque estava a ponderar também a entrada em cena com uma eventual candidatura à liderança do PSD. Contactada pelo i, a ex-governante não quis fazer qualquer comentário, nem à declaração escrita de Cavaco Silva, nem responder se estava a fazer alguma ponderação sobre o seu futuro na contenda interna. Porém, no PSD há quem assegure que Maria Luís Albuquerque esteve envolvida no processo de janeiro de 2019, em que Montenegro avançou e desafiou Rui Rio a ir a eleições diretas. Ou seja, poderá estar alinhada com Luís Montenegro quando o antigo líder parlamentar avançar.
Montenegro declara hoje disponibilidade A disponibilidade de Luís Montenegro deverá ser anunciada hoje numa entrevista à SIC. E, no próximo dia 11 participará num jantar de aniversário das eleições autárquicas em Espinho com presença prevista de cerca de 600 pessoas.
Já Cavaco Silva não falou em mais nomes do PSD, mas não deixou de assinalar que “apesar da dinâmica revelada durante a campanha eleitoral e da indiscutível qualidade do programa económico proposto aos portugueses, o número de deputados eleitos pelo PSD ficou muito aquém daquele que as vicissitudes que o país conheceu durante os quatro anos do governo da “geringonça” justificavam para o maior partido da oposição”. Ou seja, para o ex-chefe de Estado, a estratégia de Rui Rio não chegou lá, ou seja, ao patamar a que o PSD se deveria impor. E apresentou mais dados para descolar de Rio. O atual presidente do PSD foi acusado pelos críticos de afunilar o partido. Cavaco Silva prefere lembrar que “a história do PSD mostra que a pluralidade de opiniões, no quadro dos valores básicos da social-democracia moderna – liberdade, democracia, dignidade da pessoa humana, solidariedade e justiça social, igualdade de oportunidades e livre iniciativa – é uma força estimulante e enriquecedora do partido”. Dito de outra forma, todos são necessários no PSD.
António Capucho, que pediu recentemente a refiliação do PSD, disse à Rádio Renascença que a intenção do antigo chefe de Estado em analisar o que é preciso fazer é “excelente”, mas a referência e exemplo de Maria Luís Albuquerque foi “infeliz”.
Por seu turno, o presidente dos sociais-democratas não abre o jogo sobre o seu futuro, aguarda que se forme a solução governativa e só deve esclarecer o que pretende fazer na próxima semana. Em Belém, preferiu não falar sobre a mensagem de Cavaco Silva. Nem mesmo quando foi questionado se estaria incomodado com o ex-Presidente. “Não vou falar sobre isso, esse não foi um tema tratado aqui”, disse Rio à saída da reunião com o Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa, no rescaldo dos resultados eleitorais.
Esta semana não será convocada qualquer comissão política, nem o conselho nacional no PSD.
Certo é que se Rui Rio não marcar um conselho nacional na próxima semana e arrastar o processo está já pensado um plano B entre os críticos: se for necessário serão recolhidas assinaturas para convocar um conselho nacional extraordinário para convocar diretas e um congresso extraordinário.
Para já, Rio estará a avaliar com o que conta na oposição ao Governo ( se serão dois ou quatro anos) e os apoios internos no PSD. Ontem, Pedro Duarte colocou-se ao lado de Luís Montenegro, sem surpresas.
Miguel Pinto Luz, autarca de Cascais, também vai recolhendo apoios para avançar, mas a distrital de Beja apoia Rio. Já a de Portalegre quer uma reunião entre o líder e as distritais.
Perante um puzzle com várias peças por encaixar no PSD há ainda um outro nome que é preciso ter em linha de conta: Paulo Rangel. O eurodeputado tem sido alvo de algumas pressões para avançar, caso Rui Rio saia de cena. Contudo, o próprio não é candidato. Porém, em política tudo muda de um dia para o outro.
Por sua vez, Jorge Moreira da Silva, ex-ministro do ambiente, está concentrado no trabalho na OCDE, mas atento às movimentações no PSD. Mas, por agora, não esclarece se entrará na corrida interna do partido. O deputado do PSD Miguel Morgado também não esclareceu ainda se avança ou não.