A equipa das Finanças liderada por Mário Centeno fez a apresentação do Orçamento do Estado para 2020 com sorriso de orelha a orelha estampado no rosto.
Para quem mais não fizesse e se limitasse a observar, pareceria que ministro e seus secretários de Estado acabavam de tirar dos ombros pesadíssimos fardos e, aliviados da carga, anunciavam agora boas novas para o ano vindouro.
Ouvindo-os, ou melhor, ouvindo o ministro que é também presidente do Eurogrupo, aumentava a convicção sobre o alívio coletivo: um «orçamento histórico» com superavit e um conjunto de outros vários indicadores como «nunca se viu».
Ri-se o ministro Centeno e seus ajudantes; ri-se o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro; ri-se o primeiro-ministro nas redes sociais; ri-se o presidente da Assembleia da República, o também socialista Ferro Rodrigues, ao receber a proposta.
Em suma – como classificou Portugal no quadro europeu, nos idos 90 do século passado (mais concretamente em setembro de 1992), Jorge Braga de Macedo (ministro das Finanças que Cavaco Silva trataria de substituir por Eduardo Catroga no ano seguinte) –, ‘um oásis’.
Oásis é um lugar de abundante vegetação, em razão da existência de água, no meio de um deserto. São lugares vitais para os grupos de nómadas ou viajantes do deserto descansarem e reabastecerem de água, sobretudo os cavalos, burros e camelos.
Vejamos, então, o que nos reserva o Governo para o próximo ano.
No conjunto das tais boas novas anunciadas por Mário Centeno, há pelo menos uma absolutamente surpreendente: a carga fiscal vai continuar a agravar-se no próximo ano.
Ou seja, ao fim de uma legislatura em que se bateram todos os recordes de receita fiscal sem que o Estado tenha cumprido minimamente as suas funções essenciais e em que os serviços públicos continuaram em progressiva e acelerada degradação, no próximo ano os contribuintes são convocados a contribuir ainda mais para os cofres do Estado.
Ou seja, ao fim de mais de três anos sem troika e de austeridade politicamente renegada, a austeridade não só continua como ainda se agrava.
A única diferença em relação aos tempos da troika, é que os representantes do povo agora no poder andam e falam de sorriso aberto, como se a realidade do país fosse tão boa como os indicadores exemplares que a Europa e as famigeradas agências de rating aplaudem.
O problema é que o desinvestimento continuado e as insuficiências e deficiências estruturais atingiram já um nível insustentável.
E a única solução para este Governo socialista é que, uma vez mais, sejam os contribuintes a pagar a fatura.
Seja por força da habilidosa equação entre aumentos salariais e inflação em sede de IRS, seja pelo agravamento do IVA para as touradas, seja pelo aumento de taxas e outros impostos por razões ditas culturais, ambientais ou de saúde pública. Balelas que só atentam contra a inteligência dos contribuintes.
E o anúncio compensatório de umas migalhas para os mais jovens ou de ridículos descontos para os mais carenciados ou para os pequenos consumidores de energia elétrica só reforça o direito à indignação.
Se o Governo já nos habituou a ir além das metas a que se compromete com Bruxelas, sempre o fez com escrupuloso cumprimento da receita prevista (ou mesmo logrando ultrapassá-la) e com sacrifício (ou cativação) do investimento prometido com pompa e circunstância no início de cada ano e, no final, nunca cumprido.
Na verdade – e recorrendo ao léxico parlamentar que Ferro Rodrigues só admite a si próprio e seus camaradas –, o facto de um orçamento que se diz ‘histórico’ por apresentar excedente pela primeira vez desde o 25 de Abril consagrar um novo agravamento da carga fiscal é indigno!
E eles riem-se?
Sim, não têm mesmo vergonha!