As autoridades australianas aceleraram a evacuação de dezenas de milhares de pessoas do sudeste do país, devastado pelos fogos: é a pior época de incêndios registada na Austrália, onde já morreram pelo menos 20 pessoas desde setembro, dezenas estão desaparecidas, mais de 1300 casas foram destruídas e cerca de 3,6 milhões de hectares arderam. A retirada das populações antecipa que os incêndios saiam ainda mais de controlo este sábado, prevendo-se condições meteorológicas ideais para os fogos, com temperaturas altas acima dos 40ºC e ventos fortes.
«Infelizmente, é muito provável que percamos casas. Mas ficaremos muito felizes e chamar-lhe-emos um sucesso se não se perderem vidas», assegurou o número dois dos serviços florestais de Nova Gales do Sul, Rob Rodgers, de acordo com o Sydney Morning Herald, explicando que os fogos poderão mover-se de forma «assustadoramente rápida». Face às condições climatéricas, para lá dos fogos ciclónicos, os bombeiros ainda poderão enfrentar os chamados «relâmpagos secos», que ocorrem sem chuva, reacendendo fogos, de forma muito imprevisível, ainda para mais com ventos fortes.
«Ainda há uma janela de oportunidade para as pessoas saírem», notou esta sexta-feira Gladys Berejiklian, líder do executivo do mesmo estado, que declarou uma semana de estado de emergência. «Se não precisam de estar na área, precisam de sair», avisou.
Nos últimos dias foram demarcadas as chamadas «zonas de saída», que têm sido protegidas das chamas para permitir a escapatória das populações – dificultada pela escassez de combustível na região. Além disso, nesta corrida contra o relógio, muitos pessoas ficaram presas no trânsito, na quinta-feira, quando as filas de automóveis chegaram aos 30 quilómetros, segundo o Guardian.
Note que na sexta-feira os fogos ativos já cobriam uma área de 100 mil hectares, mas os serviços florestais estimam que o valor possa duplicar este sábado. Além disso, vários incêndios poderão convergir em Nova Gales do Sul. «Outro dia terrível», lamentou Berejiklian, que ainda assim insistiu que todas as preparações foram feitas. Além das evacuações, este sábado mais de três mil bombeiros combaterão a chamas só em Nova Gales do Sul, enquanto outros 500 ficaram de reserva em pontos estratégicos.
É neste estado que estão localizadas Sydney e a capital do país, Canberra. A qualidade do ar na capital, esta sexta-feira, foi qualificada a terceira pior entre todas as grandes cidades do globo, segundo a Air Visual, muito devido ao fumo e as cinzas lançadas pelos incêndios – o cenário ainda deverá piorar. Já Sydney chegou a ter no mês passado uma atmosfera com níveis de toxicidade mais de dez vezes superiores ao considerado «perigoso».
Resgate marítimo
Entretanto, no estado vizinho de Vitória, onde vivem cerca de 100 mil pessoas, também foram feitos apelos à evacuação e declarado o estado de emergência, esta sexta-feira. No mesmo dia, dois navios da marinha australiana resgataram mais de mil pessoas e os seus animais de estimação, em Mallacoota, uma popular estância balnear, onde quatro mil pessoas, incluindo três mil turistas, tiveram de se refugiar nas praias, para escapar aos incêndios florestais que cercaram a cidade.
«Não lhes podia agradecer o suficiente. Eles salvaram as nossas vidas», afirmou ao canal australiano ABC Shaun O’Connor, um turista de Melbourne, resgatado pela marinha, juntamente com o seu coelho. Já os feridos e os habitantes mais vulneráveis, como crianças pequenas e idosos, foram evacuados de helicóptero.
Glaciares castanhos
Os efeitos destes incêndios até já se fazem sentir do outro lado do mar da Tasmânia, a mais de dois mil quilómetros de distância, na Nova Zelândia, onde os glaciares passaram de brancos a castanhos, esta quinta-feira, devido ao fumo e às cinzas dos incêndios australianos. Teme-se que uma das consequências seja derreterem mais depressa, por absorverem mais luz.
«A brancura de um objeto reflete a radiação, afetando a temperatura», explicou Michael Guy, meteorologista da CNN. «Como tal, as áreas do planeta que estão cobertas de gelo e neve não absorvem radiação tão rápido». Ou seja, se o aumento da escala dos incêndios florestais na Austrália tem sido relacionado com as alterações climáticas, arrisca também acelerar estas alterações, não só pela emissão de CO2, mas também com a aceleração da perda dos glaciares.