OE 2020: como ficam as famílias e as empresas

Para já, pelo caminho ficou a redução do IVA da eletricidade – que vai ter de esperar pelo Ok de Bruxelas. Mas conte com propinas mais baixas, aumento extra das pensões, fim dos ‘vistos gold’ em Lisboa e Porto e muito mais.

«Este é o melhor Orçamento dos últimos cinco anos». Foi desta forma que Mário Centeno classificou o documento que acabou por ser aprovado na quinta-feira, mas apenas com os votos a favor do PS. BE, PCP, PAN, PEV e a deputada não inscrita Joacine Katar Moreira (ex-Livre) abstiveram-se, enquanto PSD, CDS-PP e os parlamentares da Iniciativa Liberal e do Chega votaram contra a proposta orçamental do Executivo. 

Depois de longas maratonas no Parlamento para discutir, aprovar e chumbar 1.329 propostas de alteração, os três dias ficaram marcados pela polémica em torno da redução do IVA da eletricidade e do impacto que as medidas iriam ter aos cofres do Estado. Em causa estava o impacto da redução do IVA da luz de 23% para 6% no consumo doméstico que, segundo os sociais-democratas, teria um impacto anual de 376 milhões de euros, contra os 800 milhões referidos pelo Governo.

Nas contas do Ministério das Finanças, as propostas das coligações negativas aprovadas no Parlamento vão custar 40 milhões, mas não afetam o excedente de 0,2% do PIB.

Já em relação à «grande baixa de impostos» para os portugueses com rendimentos médios… só no em 2021. O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais justificou este timing com o «caminho orçamental prudente» que está a ser levado a cabo pelo Governo. Uma medida que, segundo Mário Centeno, não representa qualquer surpresa. «Já estava calendarizado para 2021. Estamos a falar de IRS, numa redução que pode envolver vários parâmetros do IRS», cujo «impacto previsto [no Orçamento do Estado para 2021] é de 200 milhões». 

IVA da luz

Após as várias propostas chumbadas, avançou a sugerida pelo Governo, que prevê criar escalões de consumo de eletricidade diferenciados. No entanto, está dependente de aprovação do Comité do IVA da Comissão Europeia, já que precisa de autorização legislativa para que sejam alterados os critérios sobre o princípio da estabilidade do imposto. A medida está a ser avaliada por Bruxelas e a decisão não deverá ser conhecida antes de março, altura em que deverá ocorrer a próxima reunião do comité do IVA do órgão comunitário. Na prática, significa que quem consome menos energia vai pagar menos IVA e quem consome mais pagará também mais imposto.

Vistos gold
Apesar das várias críticas do setor ao defenderem que o programa vai acabar,  a proposta socialista de travar os vistos gold para «retirar a pressão das áreas metropolitanas», com vista a «acabar com especulação imobiliária» em Lisboa e no Porto foi aprovada. O programa mantém-se para investimentos no interior do país.

Reformados  estrangeiros
O PS propôs avançar com uma taxa mínima de 10% de IRS para os reformados estrangeiros que se mudem para Portugal e que atualmente estão isentos de imposto sobre os rendimentos e a medida foi aprovada. No entanto, haverá um período de transição que deixa de fora quem se inscrever no regime de Residentes Não Habituais até 31 de março de 2021.

Pensões
O aumento extraordinário das pensões mais baixas, entre seis e 10 euros, vai entrar em vigor um mês após o OE 2020. Uma medida acordada entre Governo, BE e PCP. A atualização extraordinária será de 10 euros para os pensionistas cujo montante global de pensões seja igual ou inferior a 1,5 vezes o valor do Indexante de Apoios Sociais (658,2 euros) e de seis euros para pensionistas que recebam, pelo menos, uma pensão cujo montante fixado tenha sido atualizado no período entre 2011 e 2015.

Também vão  mudar as regras de acesso ao Complemento Solidário para Idosos, passando a não serem ponderados os rendimentos dos filhos até ao quarto escalão na condição de recursos do requerente, o que determina o valor da prestação a receber.

Creches e manuais escolares
A proposta do PCP para garantir creches gratuitas para o 1.º escalão de rendimentos e para o 2.º escalão a partir do segundo filho sempre avançou. De acordo com as contas dos comunistas, a medida deverá abranger cerca de 56 mil crianças que, desta forma, terão, ainda este ano, acesso a creches gratuitamente.
Também foi aprovada uma proposta comunista que prevê a distribuição gratuita de manuais escolares novos no 1.º ciclo nas escolas públicas, pondo fim à obrigatoriedade da sua reutilização.

Propinas
A redução em 20% do valor máximo das propinas dos estabelecimentos de ensino superior, proposta pelo Bloco de Esquerda, foi aprovada. O valor máximo das propinas fica limitado a 697 euros, o que traduz uma descida de 20% face aos 871 euros de valor máximo que foram fixados para o corrente ano letivo.

Também avançou a medida que preve que os alunos carenciados passem a ter bolsa no ensino superior de forma automática. Em causa está um projeto-piloto a implementar no ano letivo de 2020/2021 e tem como beneficiários os estudantes que «ingressem no ensino superior através do concurso nacional e que, no ano letivo anterior, tenham sido beneficiários do escalão 1 do abono de família». Assim como, um complemento de alojamento concedido aos estudantes do ensino superior. Este passa a ter um valor mensal até cerca de 219 euros.

Passes alargados
O alargamento do ‘passe 4_18’ e do ‘sub23’ aos estudantes do ensino profissional, proposto pelo PS, também foi  aprovado e será concretizado ainda durante este ano. 
De acordo com as contas dos socialistas, o universo potencial de beneficiário ronda os 12 mil estudantes. O PS diz ainda que atualmente o universo de possíveis beneficiários destas tipologias de passes ascende a 1,4 milhões no caso dos alunos dos ensinos básico e secundário, a que se somam os 205 mil que frequentam o ensino superior. 

IMI
A proposta de alteração do CDS-PP que determina que os casais em união de facto ou os cônjuges não separados judicialmente passam a poder pagar, em prestações, o imposto municipal sobre imóveis (IMI) sempre avançou. Mas esta medida aplica-se apenas a «prédios ou parte de prédios urbanos afetos à habitação própria e permanente dos sujeitos passivos e no qual esteja fixado o respetivo domicílio fiscal».

Os deputados também aprovaram a medida que determina o agravamento da taxa de IMI dos terrenos para construção com aptidão para uso habitacional localizados em zona de pressão urbanística e devolutos há mais de dois anos. 
Recorde-se que no ano passado entrou em vigor legislação que permite que a taxa possa ser «elevada ao sêxtuplo», podendo ainda ser agravada em mais 10% por cada ano em que persista o estado devoluto ou em ruínas – até um limite máximo de 12 vezes.

Já os imóveis avaliados em mais de um milhão de euros vão passar a pagar uma taxa de Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) mais pesada: de 6% para 7,5%.
Em matéria de alojamento local, os rendimentos obtidoscom estes imóveis em zonas de contenção passam a ser taxados sobre uma parcela de 50%, face aos anteriores 35%. Por outro lado, há um alívio do IRS na transferência de imóveis de alojamento local para arrendamento acessível, pondo fim às mais-valias atualmente implicadas neste processo.

Impostos 
Também a penalização do crédito ao consumo através do aumento do imposto do selo sobre estes contratos foi aprovada pelos deputados. Feitas as contas, os créditos inferiores a um ano e os descobertos bancários passarão a pagar 0,141% face aos 0,128% atuais e o crédito entre um e cinco anos passará a ser tributado a 1,76% face aos 1,6% atuais. No entanto, os deputados aprovaram uma proposta do PSD que salvaguarda deste agravamento os contratos já celebrados.

Este agravamento também se vai sentir no imposto especial sobre os jogos online, que vai subir de 15% para 25%.

Iva das touradas
A taxa de IVA de bilhetes para as touradas vai subir de 6% para 23%. No entanto,  a medida gerou divisão na bancada socialista, com um grupo de 40 deputados a assumir publicamente que só votava favoravelmente a medida para seguir a disciplina de voto do PS.

Reforço saúde
Os deputados aprovaram o reforço de 180 milhões de euros na conta financeira do SNS em despesas de capital, «a afetar preferencialmente a investimento que permita internalização das respostas em meios complementares de diagnóstico e terapêutica nas instituições e serviços públicos de saúde».

A medida tem como objetivo a renovação deste equipamento do SNS, reduzindo o recurso a prestadores convencionados, que custa quase 500 milhões de euros por ano ao SNS, segundo as contas dos bloquistas. A par disso, o Governo terá de dar prioridade à implementação do Plano Nacional de Saúde Mental. A ideia é criar equipas de saúde mental comunitárias, programas de prevenção e tratamento da ansiedade e depressão ou a oferta de cuidados continuados de saúde mental em todas as regiões de saúde, entre outros. 

Foi também aprovada uma proposta do BE que põe fim às taxas moderadoras nos cuidados de saúde primários.

Novo Banco
A proposta do PSD que obriga o Governo a submeter à aprovação do parlamento injeções de capital no Fundo de Resolução que ultrapassem os 850 milhões de euros foi aprovada. Na proposta do OE 2020, apesar de o Governo prever a recapitalização de 600 milhões de euros no Novo Banco, mantém o valor de 850 milhões de euros de empréstimos de médio e longo prazo ao Fundo de Resolução. 

Taxas sobre celulose
Foi aprovada a criação de uma contribuição especial sobre as empresas de celulose. A proposta foi do Bloco de Esquerda e estabelece uma taxa de base anual que incide sobre o volume de negócios de entidades que exerçam, a título principal, «atividades económicas que utilizem, incorporem ou transformem, de forma intensiva, recursos florestais».

Isenção iva

 

O Parlamento aprovou a proposta do PAN que aumenta dos atuais 10 mil euros para 12.500 euros o limite anual de rendimentos dos trabalhadores independentes que pode estar isento de IVA. Esta isenção contempla os contribuintes que não têm nem estão obrigados a ter contabilidade organizada para efeitos do IRS ou IRC, e não tenham atingido, no ano civil anterior, um volume de negócios superior a 10 mil euros.

 

Créditos fiscais
 Os deputados aprovaram as propostas do PCP e do PEV que estabelecem que as micro e pequenas empresas que tenham «créditos vencidos e não pagos sobre o Estado» poderão usufruir de acertos de contas no momento do pagamento de obrigações tributárias, «devendo pagar apenas a diferença entre o valor a receber e a pagar».

Linha metro 
Também polémica foi a suspensão do projeto de construção da linha circular do Metro de Lisboa.  A proposta partiu do PAN e acabou por ser aprovada, ficando definido que o Governo deve fazer um estudo «técnico e de viabilidade económica que permita uma avaliação comparativa entre a extensão até Alcântara e a Linha Circular», e ainda estudos com vista à «expansão prioritária» para Loures.