O Parlamento discute hoje a alteração do diploma que desde 2014 criminaliza os maus-tratos a animais de companhia. Em cima da mesa estão quatro projetos de lei do PS, PSD, Bloco de Esquerda e PAN que, apesar das diferenças, têm como principal objetivo atribuir penas mais gravosas a quem maltrate os animais de companhia – e não só.
“Pretendemos alargar a outras espécies como, por exemplo, os cavalos, vacas ou porcos. Animais de pecuária não existem no nosso ordenamento jurídico. Isto é uma lacuna grave”, explica a deputada do PAN Inês de Sousa Real. Atualmente, a lei prevê que “quem, sem motivo legítimo, inflija dor, sofrimento ou quaisquer outros maus-tratos físicos a um animal de companhia” seja punido com pena de prisão de até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias. Se destas agressões resultar a morte do animal, o arguido vê os limites destas penas duplicarem.
A Assembleia fecha esta semana a discutir não só a duração das penas, mas também os conceitos dos crimes. A questão do abandono é abordada nos projetos. Para o Bloco, não só o abandono deverá ser punível como também a falta de cuidados médico-veterinários adequados ou a situação em que não é garantido “o acesso a água e alimento de acordo com a necessidade do animal”, como se pode ler no diploma.
Também o PAN aborda esta questão no seu diploma e, ao i, Inês de Sousa Real dá o exemplo dos cães do cavaleiro João Moura, que foram encontrados, em sua casa, desidratados e abaixo do peso, acabando por morrer um dos animais. “Verificámos condições de alojamento completamente indignas. Aqueles animais não tinham uma cama, não tinham alimentação, não tinham água, não viam a luz do dia no espaço onde se encontravam, não tinham sequer onde procurar outro tipo de refúgio ou de alimentação. Isto é um exemplo que acabou por trazer a nu aquilo que, infelizmente, ainda persiste no nosso país. E quantos casos existirão desta natureza que nós desconhecemos?”, questiona-se, dando ainda o exemplo da cadela Roxy, “esquartejada pelo ex-companheiro da sua detentora num contexto de violência doméstica”. “Se não combatermos nem dissuadirmos estes fenómenos de violência, pode até haver uma escalada e haver atos praticados contra pessoas”, explica.
Em declarações ao i, o socialista Pedro Delgado Alves explica que “o grau de perigo e risco não é necessariamente o mesmo”. Para o PS, a lei, que prevê pena de prisão de até seis meses ou multa de 60 dias, encontra-se adequada para as “situações em que a pessoa que procede ao abandono o faz até de forma a tentar minimizar esses riscos”, explica o vice-presidente do grupo parlamentar, dando o exemplo das situações em que o animal é deixado “junto de um canil ou num local com alimentos e na expetativa de que alguém o possa recolher”. Nos restantes casos, de que é exemplo “o abandono no meio de uma autoestrada”, deve aplicar-se o dobro da pena.
Penas acessórias mais pesadas Em relação às penas acessórias para os crimes de abandono, maus-tratos ou morte do animal, o PS e o Bloco são quem propõe a pena mais dura, defendendo “a privação do direito de detenção de animais pelo período máximo de 10 anos”. “Na sequência de alguns contributos recebidos ao longo dos anos, verificou-se que, em casos de crimes mais graves, as sanções acessórias poderiam ter uma duração máxima insuficiente”, explica Pedro Delgado Alves. Sublinhando que “as sanções acessórias já constam hoje do Código Penal”, o deputado explica que “ainda que as sanções acessórias não sejam automáticas e dependam sempre da decisão do juiz”, pretende-se com este teto máximo dar “uma margem mais ampla” aos magistrados. Para o PAN, ainda mais importante do que esta proibição durar até cinco anos, como o partido prevê no seu diploma, ou dez anos, “é que se esclareça e clarifique que o animal que é detido pelo agressor é perdido, seja a favor do Estado, seja encaminhado para uma associação de proteção animal”, reforça Inês de Sousa Real. O facto de, atualmente, as sanções acessórias não preverem a perda do animal pode levar “ao absurdo” de alguém condenado por maus-tratos a um animal possa, após esse período terminar, ter o animal de volta. É isto o mais importante, “para além de acautelar que a pessoa não pode ter outros animais”. Além do reforço das molduras penais, Bloco e PAN focaram-se ainda em dar um futuro digno ao animal, defendendo que, ainda durante o processo judicial, a sua guarda possa ser entregue a um familiar que não viva com o arguido ou a uma associação que tenha as condições necessárias para receber o animal.
Três anos em caso de morte Sem contar com as penas acessórias, são o PAN e o PSD quem propõe alterações que podem vir a ser mais demoradas de cumprir se aceites. Apesar de os dois partidos preverem que quem mate um animal “sem motivo legítimo” possa vir a cumprir até três anos de prisão, o PAN define logo à partida uma pena mínima a cumprir, algo que não existia na lei de 2014. Como alternativa, o projeto de lei do partido não aceita uma pena de multa inferior a 240 dias. “Existia dificuldade de aplicação também das próprias penas, uma vez que não havia estes limites temporais da aplicação, que agora passam a estar expressamente previstos”, explica Inês de Sousa Real.
O aumento previsto no diploma do PAN é justificado pela deputada pelo facto de, atualmente, quem mate um animal fique sujeito a uma pena menor do que quem destrua algo. “Não nos faz qualquer sentido que a morte de um ser vivo seja punida de forma inferior àquilo que possa ser a destruição de uma coisa ou de um bem”.
Propostas de aletração
PAN
• Mais animais protegidos pela lei
• Criação de pena acessória de até 5 anos
• Criação de pena de prisão mínima com a duração de seis meses
• Maior responsabilização no caso de crimes serem cometidos pelos donos
• Animal entregue a outro familiar ou associação
Partido Socialista
• Criação de pena acessória de até 10 anos
• Pena de até seis meses para casos de maus-tratos
• Pena de até 2 anos de prisão para mortes resultantes de maus-tratos
Bloco de Esquerda
• Agravamento da pena em casos de reincidência
• Alargamento do conceito de abandono
• Criação de pena acessória de até 10 anos
PSD
• Agravamento da pena de prisão até 3 anos
• Tentativa é punível