Os números do FMI apontam para uma recessão de quase 8% e uma taxa de desemprego de 14%. As previsões são otimistas ou poderão ser ainda piores?
Neste momento está tudo em aberto. A estimativa que o FMI apresentou encaixa com a de outras entidades – o Banco de Portugal apresentou muito melhor mas já disse que não era para levar a sério. A minha universidade [Católica] também fez uma estimativa e anda à volta disso. É possível ser muito pior, mas também é possível ser melhor. Ninguém sabe. Mas penso que é uma estimativa razoável, perder 8% este ano é aceitável.
A economia portuguesa está numa situação mais frágil face aos restantes países europeus…
Estamos sempre numa situação mais frágil e vamos também ser os mais atingidos. Para já, estamos a ser atingidos pelo próprio vírus, mas vamos ser mais atingidos economicamente por causa da fragilidade da economia que vem de trás. No fundo, podemos dizer que estamos com a herança da crise terrível anterior que ainda não estava resolvida.
Chegou a dizer que íamos entrar numa crise brevemente. Fica surpreendido por acertar? Talvez não pensasse que fosse por um vírus…
Ninguém pensa uma coisa destas. Mas parece que se confirma. Andámos a fingir que estava tudo bem, que tínhamos o problema resolvido e que estávamos a crescer pelo melhor, o que era mentira. E como não era verdade, qualquer pequeno sopro iria afetar, não estávamos era à espera de uma coisa desta dimensão. A primeira queda do produto mundial foi em 1945. Depois foi em 2009 e foi de 0,15%. Neste momento, o FMI prevê uma desvalorização de 3%. É 20 vezes maior. Atualmente está a prever uma queda no produto mundial que nunca aconteceu, a não ser em 2009 e na Segunda Guerra Mundial e está a prever uma coisa que é 20 vezes maior do que aquela que tivemos em 2009. É uma coisa que ninguém podia pensar que era possível. Grande parte da nossa recuperação – e não é uma crítica, é uma constatação – foi baseada em turismo e nesse tipo de coisas que estão a ser os setores mais afetados nesta crise. E Portugal tem depois todo o problema financeiro que vem da dívida do Estado, das empresas e das famílias, que vai estar connosco muito tempo ainda e é um peso que arrastamos. Em qualquer circunstância difícil é sempre aí que sofremos.
Cair é fácil, a recuperação é que é mais difícil….
Exatamente. O próprio FMI prevê uma recuperação para o ano já de 5%. Não é uma situação parecida com a crise anterior. A anterior foi uma crise muito longa, levou vários anos e provocou uma queda ainda maior do que os 8% que vamos perder este ano se acumularmos tudo o que aconteceu naqueles anos. Esta não. Esta, em princípio, na segunda metade do ano, a economia até já pode estar a crescer. É completamente diferente, mas todas as fragilidades que andam por aí e andaram escondidas durante este período de algum alívio vêm todas agora ao de cima.
E temos uma economia muito baseada no turismo, que é um dos setores mais afetados…
É muito temperamental e vamos ver como é que as pessoas reagem. Já estão muitos a dizer que este ano e o próximo estão perdidos, não tenho a certeza disso, vamos ver. Esta coisa é inesperada, no início de março, ninguém estava a contar o que ia acontecer logo a seguir. Agora estamos no fundo do buraco e já dizemos que vai ser o fim do mundo. Não me parece que seja razoável nem uma nem outra. É possível que ainda consigamos salvar alguma coisa este ano e é possível que para o ano tenhamos um ano normal e, se calhar, um ano bom. Não estou a dizer que seja o mais razoável, mas é possível. Não vale a pena especular. Acho que há muitas pessoas a especular, o que é compreensível porque as previsões são difíceis, mas temos de manter a cabeça fria e esperar.
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