O aparecimento e o crescimento de fenómenos como o Chega ou a Iniciativa Liberal estão a baralhar as contas à direita. Até agora, o PSD, quando vencia eleições mas não tinha maioria absoluta, governava em coligação com o CDS (foi assim na AD de Sá Carneiro, Freitas do Amaral, Amaro da Costa e Ribeiro Telles; também na de Durão Barroso e Paulo Portas, que se prolongou por mais uns meses com Santana Lopes na liderança do partido e do Governo; e finalmente com a coligação fechada entre Passos Coelho e Portas).
Mas a fragilidade dos centristas e o crescimento de novas forças políticas obriga a direita a repensar a política de alianças.
Foi com estes dados em cima da mesa que Rui Rio, nas últimas semanas, resolveu não fechar a porta a um entendimento com o Chega "mais moderado". Que foi o suficiente para abrir uma discussão interna, e não só, sobre se a direita deve integrar um partido como o Chega numa coligação de Governo.
Guilherme Silva, ex-líder parlamentar do PSD, desafiado a comentar um eventual entendimento com o Chega, é cauteloso, mas coloca todos os cenários em cima da mesa. "O PSD muito dificilmente voltará a ser governo sozinho e com a situação de fragilidade em que o CDS se encontra não se pode criticar a direita se fizer um alargamento de entendimentos para ter uma solução alternativa à direita semelhante àquela que a esquerda adotou", diz ao SOL o antigo vice-presidente da Assembleia da República.
Guilherme Silva vai mais longe e dá o exemplo da ‘geringonça’, que abriu a porta a alianças com partidos que até agora estavam afastados do poder.
"Não se pode ter uma duplicidade de posições. Radicalismo por radicalismo teríamos de criticar também a solução de geringonça", acrescentou o antigo líder parlamentar social-democrata.
Miguel Albuquerque também abriu a porta a uma aliança com o Chega para retirar a esquerda do poder.
O presidente do Governo Regional da Madeira, numa entrevista à Rádio Renascença, defendeu que "tudo o que seja coligações no sentido de derrotar a esquerda em Portugal é bem vindo".
A possibilidade de uma aproximação ao Chega está, porém, longe de ser pacífica dentro do partido. Várias e destacadas figuras do PSD consideram que é um erro político. O histórico do PSD Rui Machete avisou, em declarações ao i, que seria "descaracterizar por completo o PSD".
O ex-deputado social-democrata Pacheco Pereira escreveu, num artigo na revista Sábado, que a declaração do líder social-democrata "representa um erro de posicionamento". Para o comentador, "não vale a pena andar a demarcar-se da forte deslocação à direita do PSD" nos tempos de Passos Coelho "e agora abrir ao Chega, que assim só se fortalece e legitima".
A esquerda aproveitou para colar o PSD ao radicalismo do Chega. "Significaria uma rutura do PSD com a sua cultura social-democrata", disse o secretário-geral adjunto do PS, José Luís Carneiro.
Paulo Cafôfo (candidato do PS Madeira nas últimas eleições regionais) respondeu a Miguel Albuquerque nas redes sociais considerando que o líder do PSD madeirense "enterra a social-democracia e faz um corte ideológico com a história do seu partido".
"Não tenhamos medo das palavras, o presidente do Governo regional defende uma coligação com um partido da extrema-direita, racista e xenófobo", escreveu Cafôfo.
André Ventura não se cansa de repetir que "não haverá novas maiorias de direita sem o Chega", mas garante que não está disposto a abdicar de algumas das principais bandeiras. Garante, no entanto, que não vê sinais de aproximação do lado do partido de Rui Rio. "O PSD sabe quais são as nossas exigências e não tem dado passos nesse sentido. A luta contra a corrupção e a criminalidade violenta é uma prioridade para nós e o PSD tem estado sistematicamente ao lado do PS e do Bloco de Esquerda", diz o líder do Chega.
'CDS vai morrer às mãos desta gente’, diz Borges de Lemos
O CDS aproveitou a declaração de Rui Rio para se distanciar do Chega. Francisco Rodrigues dos Santos saiu a terreiro a garantir que a "probabilidade de entendimentos do CDS com o Chega é nula".
A estratégia dos centristas é demarcar-se de André Ventura numa altura em que vê alguns dos seus militantes a saltarem para o lado do Chega. Pedro Borges de Lemos, que liderava a corrente não formalizada CDS XXI, anunciou esta sexta-feira que se desfiliou do partido e manifestou-se disponível para aderir ao Chega.
A guerra entre Borges de Lemos e a direção do partido estalou depois de o militante centrista ter participado na manifestação do Chega para provar que não há racismo em Portugal.
"A direção do CDS e o seu líder ainda não perceberam que nunca me intimidei com as ameaças e pressões que me fizeram para me calarem, ao longo dos últimos sete anos, e não será agora. É lamentável o CDS acabar por morrer às mãos desta gente", escreveu, nas redes sociais, Pedro Borges de Lemos.
O CDS, em comunicado, garantiu que "o senhor Lemos não representa nada nem ninguém no CDS-PP, para além da sua isolada militância".