Ao Postigo

Mas é, este debate, contemporâneo do caos nos hospitais, da exaustão dos profissionais de saúde, da angústia semeada. E assiste ao pronunciamento dos Sindicatos dos Professores que se juntam à Ordem dos Médicos na opção declarada pelo encerramento das escolas. 

A situação do país é tão grave que já não esperava muito do debate parlamentar de hoje. Veio atrasado, veio muitos casos e muitas mortes depois. Veio depois de várias tentativas absurdas de inventar e experimentar iniciativas de confinamento.Veio depois de não ser possível explicar como se limitavam alguns ajuntamentos e se insistia noutros. Veio depois de o Governo meter os pés pelas mãos. Veio depois de recusar a sua responsabilidade no desenho inadequado da resposta e na desastrada previsão. Veio depois de recusar a responsabilidade na ineficácia e de a tentar endossar aos portugueses que em Abril eram extraordinários. Veio depois do ridículo confinamento do postigo.

Mas é, este debate, contemporâneo do caos nos hospitais, da exaustão dos profissionais de saúde, da angústia semeada. E assiste ao pronunciamento dos Sindicatos dos Professores que se juntam à Ordem dos Médicos na opção declarada pelo encerramento das escolas. Ou ao pronunciamento da Associação dos Administradores Hospitalares a dizer ser impossível manter este cenário. Ou, ao anúncio do Presidente da República da convocatória dos especialistas.

Felizmente, estudos anteriores e pareceres daqueles últimos concorreram para formar na opinião pública a indispensabilidade de mudar de critério. Nem a isso se curvou o Governo, surdo aos apelos e em verdadeiro estado de negação da realidade. Mas, agora, o primeiro dos ministros constata o seu isolamento. Está contra o mundo e cai-lhe o céu sobre a cabeça como, infelizmente e como consequência, acontece a todos nós.

Concede, finalmente, que está pronto a substituir o ensino presencial pelo ensino à distância hoje, ou amanhã, ou depois, ou para a semana. Como se o tempo fosse indiferente. Mas acrescenta uma condição: a de concluir que a estirpe do vírus inglês, aquele que há quase um mês por aqui anda, é dominante. Quer, portanto sair por cima, recusar o erro.

E é mais claro, ainda, quando se dirige ao PSD e o acusa de, caso faça o que deve, preparar a denúncia do seu recuo. Não, não é um argumento, não é a manobra de diversão admissível, é um estratagema, é uma esperteza saloia. Por menos que se esperasse deste debate, talvez se não aguardasse tanto. Perdeu a razão, o primeiro. E a compostura. O futuro próximo do país repousa no medo. Talvez as pessoas se recolham em casa. Talvez receiem não ter cuidados médicos. Talvez tentem salvar-se. Sabem que o momento não pode ser pior. Têm culpa pela sua falta de civismo mas não estão sozinhos na culpa. Há um mês atrás cortejos de ministros e de secretários de Estado e de diretores-gerais e particulares corriam a anunciar a boa nova da vacina próxima.

Infelizmente, nos dias seguintes, foi necessário esclarecer como o tempo de aplicação da mesma vacina vai ser longo, como setores merecedores de máxima proteção vão recebê-la mais tarde, como estamos tão dependentes da cadência do seu fornecimento. Até à próxima segunda-feira a campanha eleitoral servirá de cortina de fumo com os insultos, a procura de notoriedade, o bâton e a candidatura a secretário-geral a tentarem chamar a atenção.

Depois, fecha-se o postigo. Será o país com a crueza da realidade.