A história deste caso começa com um artigo de opinião no Público, publicado este fim de semana. Ascenso Simões, deputado do PS, aponta que tal como os florões na Praça do Império, também o Padrão dos Descobrimentos poderia ser destruído.
“Os florões são, como bem demonstra Francisco Bethencourt em História da Expansão Portuguesa, uma invenção tardia semelhante ao mamarracho do Padrão dos Descobrimentos, são a eleição da história privativa que o Estado Novo fabricou, não têm qualquer sentido no tempo de hoje por não serem elemento arquitetónico relevante, por não caberem na construção de uma cidade que se quer inovadora e aberta a todas as sociedades e origens. Mesmo o Padrão, num país respeitável, devia ter sido destruído”, escreveu Ascenso Simões num texto onde defende que o “Salazarismo não morreu”.
Ora, o presidente do CDS, Francisco Rodrigues dos Santos, decidiu comentar a opinião de Ascenso Simões e num texto enviado às redações sustentou que é tempo de o primeiro-ministro colocar os seus deputados (PS) na ordem. Na resposta, Ascenso Simões ripostou: “Depois de ter ficado claro que o grupo parlamentar do CDS não se identifica com o líder partidário não deve haver um só português que registe a seriedade desse pedido do jovem Rodrigues dos Santos”, declarou ao i o deputado numa mensagem por SMS.
E o que disse Rodrigues dos Santos? Primeiro, “os últimos dias têm sido pródigos em insultos da esquerda e da extrema esquerda à nossa História. Nada de novo vindo de quem sempre quis rescrevê-la. Mas há insultos que para além de disparatados são graves: ver um deputado do PS, partido que suporta o Governo, a defender a demolição do Padrão dos Descobrimentos é o cúmulo da falta de noção. Isto só daria para “Os Apanhados”!”, atirou o presidente democrata-cristão. Mais, “exige-se de António Costa que coloque os seus deputados na ordem e trave a “Bloco de Esquerdização” do PS, ou então que abra a porta de saída aos que não sabem dignificar o lugar que ocupam”.
O artigo que esteve na origem da polémica surgiu também na sequência de um voto de pesar pelo tenente-coronel Marcelino da Mata aprovado no Parlamento. Militar que combateu na Guerra Colonial, Marcelino da Mata foi apelidado por uns de herói e, por outros, de “criminoso de guerra” num tempo que deixou feridas profundas na sociedade portuguesa.
Na ocasião, Ascenso Simões votou contra, desalinhando com a maioria da sua bancada. E o artigo recordava em jeito de pergunta: “Quantos soldados africanos combateram ao lado das tropas portuguesas pela defesa de um império inconcebível? O que fizemos a esses milhares? Como os acompanhamos e lhes garantimos sustento? Portugal quase esqueceu todos eles, mas salvou Mata como normalizou Kaúlza de Arriaga”, numa referência ao general e estratega militar na guerra colonial ao serviço do Estado Novo, falecido em 2004.
O texto começava com referências ao 25 de abril e Ascenso Simões até admitia que “devia ter havido sangue, devia ter havido mortos”. Ao Observador esclareceu que pretendia dizer “cortes epistemológicos […]. Cortes verdadeiros do ponto de vista da política, da transformação da sociedade”.
Quanto ao Padrão dos Descobrimentos, a sua ideia é a de que da mesma forma que se retiraram estátuas, ou se mudou o nome da Ponte Salazar para Ponte 25 de Abril, que liga Lisboa a Almada, também se poderia retirar ou destruir o Padrão dos Descobrimentos.
Nas redes sociais, o tema aqueceu o debate. João Soares, ex-ministro, ex-deputado e ex-presidente da Câmara de Lisboa também se pronunciou no Facebook: “Durante 12 anos como autarca de Lisboa ocupei-me diretamente do Padrão dos Descobrimentos. Penso que, passe a imodéstia, nessa altura se fez por lá uma pequena revolução. Com a criação de salas de exposições, auditório, acesso ao pequeno terraço no topo, visitas guiadas. E toda uma interessante e diversificada programação de qualidade . Passe a imodéstia outra vez, exposições da Frida Kahlo, à fotografia contemporânea portuguesa [… ]. Ver agora por aí escrito que os socialistas querem demolir o Padrão dos Descobrimentos, sendo eu indefetível socialista PS, entristece-me. Dá a medida da perfídia e da estupidez que por aí anda”. João Soares não visou diretamente Ascenso Simões, mas o debate que se gerou em torno do assunto colado ao PS. E não terá interpretado o texto do camarada de partido como um pedido literal de demolição do monumento.