O Presidente da República toma hoje posse na Assembleia da República para o seu segundo e último mandato. Mas o quadro para os próximos cinco anos serão seguramente diferentes para Marcelo Rebelo de Sousa. Espera-se que o chefe de Estado seja mais exigente com o Governo – tal como o disse na noite da vitória eleitoral – e existirão duas áreas em que o inquilino de Belém estará particularmente atento: a economia (e a chamada bazuca europeia), mas também a Saúde, com o combate à pandemia da covid-19.
Sinal de que pode ser mais exigente, Marcelo apontou no seu discurso de vitória duas ideias: “a confiança é tudo menos um cheque em branco” ou “os portugueses querem mais e melhor”. Estas duas ideias podem sinalizar uma maior vigilância de Belém ao Executivo socialista, ainda que Marcelo seja um defensor permanente da governabilidade. E não queira, de todo, instabilidade política. Mas o seu mandato pode ter várias fases. A primeira é a da bazuca europeia. Marcelo escolheu consultores como Bernardo Pires de Lima, presidente do Conselho de Curadores da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD), com esse objetivo. Renovou a equipa, tem mais mulheres, e fez questão de ontem o referir numa nota oficial a propósito do Dia Internacional da Mulher.
“A todas as mulheres e em especial àquelas cuja invisibilidade, medo e desânimo são sofridos em silêncio, não só ao longo deste ano, mas ao longo das suas vidas, o Presidente da República, que passou das palavras aos atos, agora com 62% de mulheres consultoras na sua Casa Civil, expressa hoje o seu reconhecimento solidário, o seu agradecimento sincero e uma palavra de esperança”, escreveu no site da Presidência da República.
Em relação aos fundos europeus, as preocupações de Marcelo foram logo assumidas em campanha eleitoral num encontro com alunos do Campus de Carcavelos, da Universidade Nova de Lisboa. “Sabem em quanto é que já vai a conta da pandemia? 22 mil milhões, e estamos numa fase longe do fim da pandemia. Quando estivermos no fim da pandemia descobrimos que são 30 e tal mil milhões, o que equivale a muito dinheiro, equivale ao dobro do Plano de Recuperação e Resiliência e equivale a quase aquilo tudo que corresponde a vários anos do quadro financeiro multianual”. Ou seja, já nessa altura, Marcelo tentou explicar que é preciso gerir bem o dinheiro que vem de Bruxelas, e que não será assim tanto, tendo em conta a fatura que o país já está pagar. Nessa altura, Portugal já assistia a uma terceira vaga da covid-19, que se agravou – e muito – no mês de janeiro.
Na semana passada, Marcelo voltou a insistir que é preciso “saber gerir bem”, “ saber gerir bem com eficácia e com transparência” os fundos de Bruxelas. E fê-lo num curto depoimento ao Público (por ocasião do seu aniversário).
De facto, o novo mandato de Marcelo, que hoje se inicia, não será fácil. Este ano, além do início da chegada dos fundos europeus, é preciso gerir expectativas sobre a pandemia da covid-19, o desconfinamento e, a partir de setembro, o país terá pela frente eleições autárquicas e, em outubro, o início da discussão sobre Orçamento do Estado para 2022. Será no último trimestre de 2021 que se fará o chamado ‘teste de algodão’ à estabilidade política do país e ao desgaste do Governo. E Marcelo já avisou que não quer crises políticas.
“Tudo sem crises políticas. Tudo sem cenários de governos de unidade ou salvação nacional. Não se conte comigo para dar o mínimo eco a cenários de crises políticas ou eleitorais. Já nos bastam a crise da saúde e a crise económica e social”, afirmou o Presidente da República na penúltima renovação do Estado de Emergência. Ou seja, o chefe de Estado quer governabilidade para lidar com as várias crises que Portugal enfrenta. Aliás, Marcelo já antecipava um novo mandato mais difícil quando anunciou em novembro a sua recandidatura. “Não vou fugir às minhas responsabilidades e trocar o que todos sabemos que serão as adversidades e as impopularidades de amanhã pelo comodismo pessoal ou familiar de hoje”, declarou enquanto recandidato assumido, depois de semanas a gerir o ‘tabu’ presidencial.
Hoje, a posse não chegará a ter 100 pessoas no Parlamento, ainda que o dia inclua uma ida ao Porto para uma sessão ecuménica com as principais religiões representadas no país. Mas todos os eventos terão fortes restrições devido à pandemia.
A agenda ainda prevê a deposição de coroas de flores nos túmulos de Luís de Camões e Vasco da Gama, no Mosteiro dos Jerónimos.