Giovanni Brusca, de 64 anos, executor de mais de uma centena de pessoas durante as guerras da máfia siciliana, nos anos 90, incluíndo o procurador Giovanni Falcone, a mando do então todo poderoso Totò Riina, chefe dos chefes da Cosa Nostra, foi libertado após 25 anos na prisão. Não se tratou de uma surpresa, estava previsto, dado que Brusca – mais conhecido como “O Porco” ou “U Scannacristiani” (qualquer coisa como “O Mata Gente”, no dialeto siciliano) – tornara-se pentito, ou arrependido da máfia, a troco de uma redução da sua pena de prisão perpétua. Naturalmente, o facto de um dos homens mais odiados e temidos do país voltar às ruas tem deixado itália em polvorosa.
Com Brusca, voltaram também as recordações do tempo em que a Cosa Nostra dominava a Sícilia, infiltrando-se em todas as esferas do poder, chegando a declarar guerra aberta ao Estado italiano. E, no dia fatídico em que escalou o conflito, 23 de maio de 1992, foi o dedo de Brusca que detonou 400 kg de explosivos escondidos num túnel debaixo da autoestrada de Palermo, assassinando Falcone, o procurador que mais perseguia a máfia, junto com a sua mulher e três guarda-costas.
“Recordo-me desse dia como se fosse ontem”, escreveu Lorenzo Tondo, correspondente do Guardian em Itália. “Lembro-me das lágrimas da minha mãe, colada à TV, a assistir ao que parecia um terramoto. Carros enterrados nos destroços, ruas rasgadas”, continuou. “Um cenário que na minha cabeça só podia ter sido um desastre natural”.
O que se seguiu foi o envio de milhares de tropas italianas para a Sicília, quase uma invasão militar, com o clã Corleonesi, de Riina, a retaliar com sequestros, tortura, homicídios. Aliás, à época, a imprensa chegava a comparar Palermo com Beirute.
Durante anos, Brusca – bisneto, neto e filho de mafiosos do clã San Giuseppe Jato, aliado dos Corleonesi – fez de ponta de lança de Riina, assassinando, segundo a sua própria confissão, entre 100 a 200 pessoas. Tantas que dizia não se recordar de todos os nomes.
Alguns destes casos ficaram encravados na garganta dos italianos. Como o sequestro e a tortura de Giuseppe Di Matteo, um menino de 11 anos, filho de um pentito, mantido em cativeiro durante três anos, para pressionar o seu pai, acabando estrangulado e dissolvido em ácido por ordem de Brusca, em 1996.
Meses depois, Brusca acabaria por ser detido, tornando-se um pentito – à semelhança do pai de Giuseppe, que durante o julgamento, em 1997, jurou arrancar-lhe a cabeça, avançou à época o La Repubblica – e garantindo a sua saída em 2021, mediante bom comportamento. Agora, o mafioso fica protegido pelo programa de proteção de testemunhas italiano, em local desconhecido.
“Esta notícia magoa-me”, reagiu Maria Falcone, irmã do procurador, à agência ANSA. “Mas a lei de redução de sentenças por colaboração de mafiosos é uma lei que o meu irmão queria, por isso deve ser respeitada. Só espero que o poder judicial e a polícia se mantenham vigilantes”.