“Nunca coloquei ninguém da minha família em lugar nenhum”

Luís Carito desfiliou-se do PS e vai candidatar-se como independente à Câmara de Portimão. Critica o nepotismo e lamenta ter sido ignorado por António Costa.

Quando lançou a candidatura disse que tinha o apoio do PSD, mas depois esse apoio foi-lhe retirado pela direção nacional. O que é que aconteceu para gerar esta confusão?

Houve um contacto por parte das estruturas do PSD local e do CDS a motivarem-me para me candidatar. Pediram uma reunião comigo e falaram comigo. Eu fui militante do PS durante muitos anos e pedi algum tempo para pensar. Houve uma grande pressão e disse que estava disponível. Achei que faria sentido dar uma ajuda para desenvolver a cidade. Coloquei como condição: concorrer como independente com o apoio do PSD e do CDS. Fizemos uma convocatória aos jornalistas da região e fiquei muito espantado com a decisão do PSD.

Tem alguma explicação…

Houve pressões. Sei que houve algumas pressões para a distrital do PSD e a direção nacional não viabilizarem o apoio à minha candidatura.

O PSD não o apoiou por ter pertencido durante muitos anos ao Partido Socialista?

Acho que não tem nada a ver com isso, porque se fosse assim não teria havido a abordagem que existiu. Houve algumas pressões para o PSD não viabilizar, mas isso é algo que vamos saber mais tarde. Há interesses cruzados nestas coisas. Há interesses políticos e económicos. Há um bloco central de interesses.

A Iniciativa Liberal também negou que lhe tivesse dado esse apoio…

Nunca falei com a Iniciativa Liberal. Quem terá falado foi a concelhia do PSD que me disse que eles apoiavam. Eles sentiram-se ultrapassados e reagiram de uma forma agressiva, mas com alguma razão. E, portanto, o PSD e a Iniciativa Liberal saltaram desta possível coligação. Mas houve uma pressão enorme. Não quiseram apoiar e aquilo que está no terreno é uma candidatura independente que tem o apoio do CDS, da Aliança e do Nós, Cidadãos.

Foi vice-presidente da Câmara de Portimão, eleito pelo PS, e presidente da concelhia. Falou com as estruturas do PS antes de avançar como independente?

Mandei uma mensagem ao dr. António Costa, mas ele não respondeu. Pode não ter visto a mensagem porque é uma pessoa muito ocupada. Falei com o responsável regional do PS que me disse para não me candidatar, porque poderia haver outras situações. Isto é um processo  com oito anos e durante esses anos nunca houve uma palavra de solidariedade.

Está a referir-se ao processo que enfrentou na Justiça relacionado com a criação da ‘Cidade do Cinema’…

Sim. As pessoas têm direito à presunção da inocência, mas da parte das estruturas do PS não houve uma única palavra. Quando tudo se passou eu era membro do PS. Depois, para além disso, não me revejo nas práticas que são desenvolvidas pelo PS a nível local e a nível nacional. Achei que, independentemente de ter muitos anos de militância, estaria na altura de sair. Há muitas coisas com as quais não concordo. Estive durante muitos anos na política e nunca coloquei ninguém da minha família em lugar nenhum. É uma prática muito negativa e isso verifica-se. Continuo a ser social-democrata, mas não me revejo naquilo que é a prática do Partido Socialista. É aquilo a que se chama o aparelho partidário. As pessoas estão nos partidos para encontrarem algum conforto económico e um emprego.

Acabou por ser absolvido num processo que envolvia crimes  de burla qualificada, participação económica em negócio e branqueamento de capitais. Esperava outra atitude da parte do PS?

Houve um distanciamento do PS muito grande em relação a mim. Provavelmente pensaram que eu era culpado. Foi um processo que demorou oito anos, mas no final o processo termina com o pedido da acusação para o coletivo de juízes me absolver.

Quando decidiu sair do Partido Socialista?

Desfiliei-me do PS quando apresentei a candidatura. 

Este processo judicial em que esteve envolvido  ficou conhecido por ter engolido uma folha de papel durante as buscas da Polícia Judiciária. Quer contar o que aconteceu?

O que aconteceu foi muito simples. Nunca falei sobre isso, mas o que aconteceu foi que às sete da manhã bateram-me à porta e a minha casa foi invadida por sete pessoas, pertencentes à PJ, que entraram com alguma agressividade. Tinha um cão e a primeira coisa que me disseram foi: prenda-o já  ou damos um tiro no cão. Por volta das 11 da manhã e depois de muitas provocações, houve um agente que agarrou num papel Falou-se numa folha A4, mas era um papel pequeno. Às tantas  deu-me um vaipe e saquei-lhe o papel da mão. Nem sabia o que era. Criou-se ali uma grande tensão e simulei que estava a pôr o papel na boca, mas tinha-o na mão. Fui à cozinha e atirei o papel para o lixo. Depois das buscas o juiz Carlos Alexandre perguntou-me se tinha comido um papel. Expliquei o que se tinha passado.  Acharam que aquilo era muito relevante, mas não era. Na realidade o papel continua a ser o motivo pelo qual se fala neste processo. 

Foi uma situação caricata…

Não é algo que me preocupe. Pode acontecer a qualquer pessoa numa situação de grande tensão. Basta falar com um psicólogo ou um psiquiatra e percebemos que numa situação destas pode haver um descontrole emocional. 

Quando este processo ficou encerrado disse, à saída do Tribunal de Portimão, que «toda esta situação foi um equívoco, ou outra coisa».  tem alguma desconfiança em relação a este processo? 

Dei a entender que na minha convicção houve manipulação da justiça. Os juízes são pessoas corretas, mas podem ser manipulados. Não estou a colocar em causa a independência dos magistrados, mas sabemos que pode haver manipulação de forma a que as pessoas sejam levadas a tomar determinado tipo de decisões. Acho que foi o que aconteceu neste processo. Havia adversários políticos que pretendiam atingir determinados lugares e não teriam qualquer hipótese se não tivesse acontecido aquilo que aconteceu. Como se veio a provar, depois de ste anos, não existia nada. Tenho a convicção que quiseram afastar-me do lugar onde estava [na Câmara Municipal de Portimão].

Depois de tudo isso decidiu voltar a candidatar-se à Câmara. O que o motivou?

Inicialmente não estava inclinado para me candidatar à câmara. Tenho a minha vida profissional estável, estou bem a nível profissional, mas o facto de viver e trabalhar em Portimão e verificar que a cidade não se encontra bem levou-me a avançar com uma candidatura alternativa ao atual poder. Por outro lado, fui desafiado por algumas pessoas de Portimão e achei que era minha obrigação assumir este desafio e tentar mudar as coisas.