Paulo Rangel teve entrada de leão no Conselho Nacional do PSD. Se já tinha todo um elã à sua volta em face das expectativas que vinha criando, os holofotes centraram-se todos nele quando, ainda antes de os conselheiros entrarem na sala, fez saber que iria ao Conselho Nacional anunciar a sua candidatura à liderança do partido. Chamando a si toda a energia positiva da reunião dos sociais-democratas e perante um Rio zangado (por nunca mais chegar a sua vez de falar). Rangel foi o indubitável vencedor do primeiro round deste combate para a São Caetano à Lapa – e a pancada foi tão grande que Rio ficou atordoado e a ponderar se deve ou não disputar a contenda ou sair já pelo seu próprio pé. E, enquanto isso, Moreira da Silva continua na retranca.
O líder do PSD decidiu jogar uma cartada inesperada no Conselho Nacional: na sequência dos cenários traçados por Marcelo Rebelo de Sousa quanto a uma possível crise política na sequência de um eventual chumbo da proposta de Orçamento do Estado para 2022 e a convocação inevitável de eleições antecipadas, defendeu o adiamento das diretas no partido até à votação do OE no Parlamento.
E logo à entrada da reunião, deixou claro que essa era a única «proposta responsável» e que os sociais-democratas deviam pensar «primeiro no país e no partido» e não em «interesses pessoais».
Sabendo desde a véspera desta ‘intenção’ de Rio, os conselheiros tiveram um dia para pensar e decidiram perentoriamente contra o líder: 70 votos contra 40 (uma inversão do resultado com que Rio venceu a moção de confiança contra Luís Montenegro, em 2019).
Rio viu-se rejeitado pelo próprio aparelho do partido.
Juntando-se a todo este cenário apocalítico, Rio assistiu ainda a um êxodo de vários apoiantes seus para as fileiras de Paulo Rangel: desde Alberto Machado, presidente da distrital do PSD Porto, até Cancela Moura, candidato autárquico derrotado do PSD a Gaia, passando por José Manuel Fernandes, camarada de Rangel em Bruxelas e líder da distrital de Braga, ou Pedro Alves, da distrital de Viseu, bem como de Emídio Sousa, de Santa Maria da Feira.
Bem como conta com toda a máquina associada a Miguel Pinto Luz, com destaque para o manobrador e sempre influente Miguel Relvas, antigo secretário-geral do partido e ministro de Passos Coelho.
O pretexto para Rio
Encarando este cenário, a candidatura de Rio – que era até então vista como «certa» pelos seus mais próximos – passou a estar bem mais ‘incerta’: mesmo os seus mais próximos colaboradores admitem a efetiva possibilidade de o líder social-democrata não ir mesmo a jogo em dezembro. Aos jornalistas, no fim do Conselho Nacional, Rio realçava a importância desta reunião e das suas decisões (contra a sua vontade) como «um parâmetro de ponderação»: «É um parâmetro da equação (…). Agora vou fazer a equação, e depois vou ver: X1, X2 e depois vou tirar a média». Visivelmente agastado com o que havia acontecido dentro de portas, explicava «discordar profundamente da maioria do Conselho», realçando nunca ter visto «o partido a correr um risco desta dimensão» e avisando que, assim, este «ficava numa situação de completa fragilidade». Admitindo anunciar «brevemente» a sua decisão, Rio mostrou-se de corpo presente para eventual queda governativa oriunda do chumbo do Orçamento: «O presidente do PSD chama-se Rui Fernando da Silva Rio. Foi eleito e está lá até haver um Congresso em que tome posse outro. Ou o mesmo».
Para várias fontes sociais-democratas ouvidas pelo Nascer do SOL, Rui Rio só pode ter insistido na tentativa de adiamento das diretas para, assim, apalpar terreno no Conselho Nacional e avaliar a correlação de forças no aparelho. E, perante tamanha derrota, «o mais certo é mesmo não apresentar a recandidatura, lamentando o assalto ao poder de que foi vítima, ainda por cima quando o partido, com ele já começava a apresentar resultados, como aconteceu nas autárquicas».
Rangel e o toque a reunir
Aos conselheiros, Rangel afirmou anunciar a sua candidatura com toda a «liberdade e lealdade».
«Não aceito que o PSD seja o partido da espera: esperando que o Governo de Costa caia de podre. Temos de passar do partido da espera para o partido da boa esperança», afirmou Rangel, não se poupando à crítica e atirando ainda «não ser a denunciar sondagens e a imprensa» que o PSD passa a ter «um projeto para o país».
Já ontem, na apresentação oficial da sua candidatura, o eurodeputado propôs-se «unir o PSD» para conseguir «uma solução de governo estável, promover o seu crescimento e vencer as próximas legislativas de 2023». Segundo Rangel, esta união do PSD será possível «agregando diferentes correntes e sensibilidades do partido» e «afastando o espírito de fação e de tribo». Tal como havia feito um dia antes, Rangel voltou a não poupar críticas à oposição (ou não-oposição) de Rio, dizendo que esta jamais poderia «ser frouxa».
Prometendo recuperar os debates quinzenais na AR caso seja eleito líder, Rangel disse ainda que, com a sua candidatura, «o PSD está de volta».