Com as eleições legislativas marcadas para 30 de janeiro de 2022, o calendário para a disputa eleitoral interna no PSD ficou muito apertado e, em rigor, tanto Rui Rio como Paulo Rangel terão de mandar os estatutos do partido às malvas se quiserem que os novos órgãos sociais estejam em plenas funções e sejam já eles a aprovar as listas de candidatos a deputados da Assembleia da República.
O calendário fica fechado no Conselho Nacional de hoje, em Aveiro, e tanto Rui Rio como Paulo Rangel propõem antecipar o calendário estabelecido na última reunião deste órgão social-democrata: diretas a 4 de dezembro e congresso a 14, 15 e 16 de janeiro.
Ao Nascer do SOL, Marques Mendes, vencedor das primeiras diretas no PSD (em 2006), desdramatiza as condicionantes estatutárias, dando exemplos históricos de que é sempre «possível» uma leitura dos estatutos com uma maior «flexibilidade».
Seguindo as linhas estatutárias de forma restrita, caso Paulo Rangel consiga levar hoje avante a sua proposta de antecipar o congresso para 17,18 e 19 de dezembro, só poderia validar a sua lista de candidatos à Assembleia da República no dia 22 de dezembro. Isto porque a lista tem de ser validada em Conselho Nacional, e este (mesmo extraordinário) tem de ser convocado com uma antecedência mínima de 3 dias. Ou seja, caso vença as diretas a 4 de dezembro e seja empossado a 19 de dezembro, o líder eleito só conseguiria convocar Conselho Nacional para 22 de dezembro. Ora, de 22 de dezembro até à data das eleições – 30 de janeiro – vão 40 dias: ou seja, um dia a menos do obrigatório por lei para se apresentarem as listas no Tribunal Constitucional (41).
Marques Mendes relativiza a formalidade estatutária e adianta que, «se for necessário, no dia do encerramento do Congresso faz-se logo o Conselho Nacional».
Também Rui Rio defende uma proposta que viola os estatutos do partido. Na quinta-feira, em entrevista à TVI, o presidente do PSD defendeu a antecipação das diretas e do congresso «uma ou duas semanas» sob o argumento de que tal fortaleceria o partido e colocá-lo-ia mais rapidamente coeso para as legislativas, assim como provaria que ele não está a «suspender a democracia» ou com medo de eleições (algo de que Rangel o acusa). Rio deu a entender que levará esta sua proposta ao Conselho Nacional de hoje. Ora, acontece que a proposta é antiestatutária, uma vez que a convocatória para eleições diretas no partido tem de ser feita com a antecedência mínima de 30 dias.
Confrontados com esta limitação estatutária, apoiantes de Rio ouvidos pelo Nascer do SOL argumentam que tal poderia ser ultrapassado considerando que se trata de uma mera «alteração da data» e poder-se-ia contar o prazo a partir da primeira convocatória – o que também não tem qualquer cabimento estatutário.
O exemplo de Durão em 1999
Por mais contas que se façam para desencaixar prazos ou normas nos calendários de Rio ou Rangel, a convicção é a de que, atendendo à aproximação de posições do líder recandidato e do candidato, estes podem entender-se no sentido de permitirem que o partido faça a sua clarificação interna e possa pacificar-se e unir-se em torno da sua principal ‘batalha’: as legislativas de final de janeiro.
Ou seja, se isso incluir encurtar prazos ou flexibilizar estatutos não há qualquer problema, como explica Marques Mendes ao Nascer do SOL: «Estes prazos são encurtados em condições especiais. Situações excecionais requerem medidas excecionais e, por isso, é possível os estatutos serem flexibilizados». E dá um exemplo prático, também ele referente à história do PSD: «Em 1999, quem fez as listas do PSD ao Parlamento Europeu? O partido estava sem líder – Marcelo tinha saído – e era candidato único à liderança Durão Barroso. Ainda que Barroso nem sequer tivesse sido eleito, foi ele quem fez as listas. Era suposto o partido ficar sem listas?».
Mas há ainda um outro ‘pormenor’: durante esta semana, Nuno Miguel Henriques anunciou que se encontrava a recolher assinaturas para concorrer contra Rangel e Rio. Ora, a confirmar-se esta candidatura, o calendário que hoje será fixado terá de contemplar a hipótese, mesmo que académica, de uma segunda volta.
Conselho Nacional animado
Estão assim reunidos todos os ingredientes para um animado Conselho Nacional extraordinário, hoje, em Aveiro. Neste, Rangel proporá a antecipação do Congresso (marcado para 14, 15 e 16 de janeiro) para 17, 18 e 19 de dezembro. Já Rui Rio, ao que deu a entender, procurará antecipar mais ainda os processos eleitorais: ou seja, diretas a 27 de novembro e congresso no fim-de-semana de 4 ou 11 de dezembro.
Esta posição de Rio, lançada na quinta-feira, é um volte-face com a por si defendida no início da semana: recorde-se que Rio, na segunda-feira, enviou um email aos militantes do PSD a sugerir que refletissem sobre a atual data das diretas no sentido de as adiar (email esse que, no dia a seguir, levou Rangel a fazer o mesmo mas na direção oposta).
Para já, Rangel apresenta-se em Aveiro com vantagem no Conselho Nacional – em que teve uma clara vitória na reunião passada – e nas estruturas do aparelho, somando apoios entre líderes das distritais e concelhias do partido.
Mas Rio não atirou ainda a toalha ao chão.
Se é certo que a vantagem teórica de ser líder em exercício nem sempre foi decisiva – Marques Mendes, nessa condição, saiu derrotado em 2007 por Luís Filipe Menezes -, a verdade é que o método de eleição direta pelos militantes relativiza a importância do apoio das cúpulas e dos chamados ‘barões’ e ‘caciques’ do partido.
Veja-se, aliás, o caso da Madeira. Um dia depois de Alberto João Jardim escrever o seu manifesto de apoio a Rio, Miguel Albuquerque veio manifestar o seu apoio ao…. silêncio.
Num artigo de opinião publicado no Jornal da Madeira, Alberto João Jardim elencou uma série de razões para votar em Rio. Entre elas, o histórico presidente do Governo Regional da Madeira nota não se deixar «tribalizar pelas modas do ‘politicamente correto’, pelo exibicionismo do que deve ser íntimo e livre, e pelas ‘causas fraturantes’». Situando o PSD ao «centro», João Jardim realça Rio ser «um Companheiro desde a fundação do PSD, sempre na linha ao Centro social-democrata definida por Sá Carneiro», acrescentando nunca este ter aderido à «partidocracia» ou «jogos de interesses, pessoais ou de grupo (como a maçonaria)». «Por experiência própria, sei que isto não nos torna populares ou “simpáticos” dentro da organização partidária. Mas fará de Rui Rio um bom primeiro-ministro».
Já Miguel Albuquerque, líder do PSD/Madeira, afirmou, nesta quinta-feira, que não irá apoiar nenhum dos candidatos à liderança do partido. «Manter a liberdade de escolha dos militantes aqui na Madeira e não fragmentar a unidade do partido» é o seu objectivo.