Os verdadeiros racistas

Então agora o critério da cor é que deve ser definitivo numa eleição? 

Esta semana assistimos a uma discussão, embora estranhamente discreta, sobre a nomeação do representante de Portugal na Bienal de Arte de Veneza que me fez rir. Penso que é o retrato perfeito da parvoíce que estamos a viver, onde uns tantos nos tentam impingir uma verdade obtusa, sectária, xenófoba e até racista. Vamos por partes. O concurso para a eleição do representante português, da responsabilidade do Ministério da Cultura, através da Direção-Geral das Artes (DGartes), selecionou dois finalistas. Uma artista de origem africana, negra, e um homem que se identifica como não-binário. Ganhou o segundo e foi um forrobodó em certos meios, havendo mesmo um abaixo assinado onde figuram nomes ‘insuspeitos’ como Mamadou Ba e Boaventura Sousa Santos. Racismo, gritou-se, calculando eu que se tivesse ganho Grada Kilomba que se teria gritado homofobia.

Num excelente artigo de Augusto M. Seabra, no Público, este disserta sobre a polémica e traz à baila um texto publicado em defesa de Kilomba que me deixou banzado. Ana Teixeira Pinto, a autora do artigo citado por Augusto M. Seabra, publicado no Ípsilon, acusa o júri de ser «misógino e racista». Entre outras pérolas idiotas, Ana Teixeira Pinto escreve: «A supremacia branca não é só o Ku Klux Klan ou os grupúsculos neo-nazis. É uma estrutura geopolítica que me coloca a mim, europeia branca, no topo duma pirâmide cujos benefícios são tanto materiais (passaporte europeu, segurança social, integridade e autonomia física) quanto imateriais (presunção de inocência, acesso institucional, valorização simbólica)».  Calculo que a artista deseje que todos caminhemos até às Filipinas na Páscoa e que nos autoflagelemos por sermos brancos. Mas Pinto vai mais longe: «Os portugueses celebram a revolução dos cravos sem nunca mencionarem que a derrota do fascismo foi paga com o sangue de Angolanos, Moçambicanos e Guineenses; o racismo implícito e explícito infecta o espaço público. Escolher Grada Kilomba para representar Portugal em Veneza não resolveria o problema da desintegração social, mas abriria uma porta, uma perspetiva, a possibilidade de imaginar um futuro um pouco diferente, um pouco, mesmo que marginalmente, melhor. Foi essa possibilidade que o júri nos negou. No seu lugar fica a ferida, aberta, a que Portugal recusa atentar». 

Então agora o critério da cor é que deve ser definitivo numa eleição? Quererá Pinto que as equipas de futebol só tenham negros? Esta história fez-me lembrar a minha chegada a Moçambique há uns bons anos, onde muitos brancos, alguns com dupla nacionalidade, se manifestavam contra a chegada de novos brancos, falando do colonialismo e de como nenhum caucasiano devia ter direito a lá trabalhar, além deles, como é claro. Curiosamente, fui recebido por muitos moçambicanos, negros, mulatos, mais ou menos escuros, de uma forma simples: com cordialidade e respeito, tal como eu encaro todos os outros, independentemente da cor, religião ou sexo. Eram esses brancos, felizmente há exceções, que acicatavam o ódio, não os moçambicanos, e muito menos eu.

O mais curioso desta polémica é que aqueles que protestaram contra a obra de Grada Kilomba, uma artista reconhecida, à semelhança do vencedor, não apresentaram um único argumento racional. E é assim que vivemos.

Talvez por isso, os ataques a cristãos – brancos, negros ou amarelos – na Índia, durante o Natal, tenha merecido tão pouco destaque na imprensa portuguesa. Aqui diga-se que os muçulmanos sofrem do mesmo problema que os cristãos, pois também são perseguido na terra de Gandhi. Talvez por esta nova narrativa dos polícias do politicamente correto, que eu apelido de racistas e xenófobos, se tenha, também, dado tão pouco destaque ao camionista português assassinado por imigrantes ilegais em França que se tinham ‘infiltrado’ no seu camião, e que pretendiam entrar na Grã-Bretanha. Posso dizê-lo com toda a propriedade, abomino o racismo, a xenofobia e a misoginia, venha de onde vier. Mas não me peçam para pedir perdão por ter nascido branco. Isso é absurdo

vitor.rainho@sol.pt