Por Felícia Cabrita e Marta F. Reis
O jovem de 18 anos detido ontem pela Polícia Judiciária por suspeitas de planear um ataque contra os colegas da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa estava “viciado” em vídeos de massacres em escolas e tinha um plano detalhado para atacar uma ala da faculdade, provocando uma chacina. Segundo o i apurou junto de fonte próxima de investigação, o plano continha as horas do ataque e a localização, estando em causa uma ala frequentada por alunos do curso de engenharia informática, que o jovem frequentava. O suspeito não tem ligações a grupos extremistas radicalizados em Portugal, que são monitorizados pela Polícia Judiciária no combate ao terrorismo. Fonte da PJ indicou ao i que o jovem não estava sinalizado neste contexto nem teria motivações políticas ou religiosas. Trata-se de uma pessoa instável, com dificuldades de adaptação, cujas pretensões vão ser agora avaliadas, mas cuja vigilância nos últimos dias revelou perigo iminente.
O seu mundo reduzia-se praticamente à internet, onde a consulta regular de sites “muito violentos”, nomeadamente relacionados com massacres em escolas nos EUA, foi sinalizada pelo FBI, que monitoriza este tipo de sinais com agentes infiltrados, e reportou estes elementos às congéneres portuguesas. Mas a informação enviada à PJ no último fim de semana era ainda muito incipiente e obrigou a uma autêntica caça ao homem sem certezas de que as suspeitas teriam fundamento. As autoridades norte-americanas tinham apenas o nickname de alguém que, tendo o IP em Portugal, frequentava regularmente sites com conteúdos habitualmente associados a “mass shootings” nos Estados Unidos, massacres violentos em escolas, centros comerciais e outros estabelecimentos.
Esta sinalização levou a PJ a intervir para localizar o suspeito, o que obrigou a cruzar dados de redes sociais. Localizado, iniciou-se a vigilância diária, que mostrou um comportamento compatível com o perfil de risco traçado, culminando nas buscas e detenção desta quinta-feira. Foi durante estas diligências que o nível de alerta subiu: foi intercetado um plano concreto para um alegado ataque, que em termos de violência replicava os conteúdos que o FBI reportou que o jovem andava a consultar com frequência. O alegado ataque estaria a ser preparado para esta sexta-feira, o que motivou a atuação imediata da polícia, havendo a convicção de que o plano foi travado no limite, o que é muito raro neste tipo de criminalidade. Em comunicado, a PJ indicou que foi impedida “atividade terrorista”, crime pelo qual o jovem, oriundo da Batalha mas que residia nos Olivais, está agora indiciado.
Esta sexta-feira, o estudante será presente a primeiro interrogatório judicial, sendo expectável também a sua avaliação psicológica. Serão igualmente determinadas as medidas de coação.
Forte arsenal para provocar mortandade
Segundo a informação veiculada ontem, o plano teria como alvo colegas da faculdade e o jovem estava na posse de várias armas brancas como facas de ponta e mola, catanas, uma besta com dardos e engenhos incendiários, apurou o i.
Fonte oficial da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa confirmou que colaborou desde a primeira hora com as autoridades. O alerta surgiu numa altura em que os estudantes estão em exames e apanhou a comunidade académica de surpresa, com as primeiras informações ao final da tarde a não dizerem qual o polo da Universidade de Lisboa em causa. O ataque estava planeado para o dia em que os estudantes têm exame de programação.
Em comunicado, a PJ veiculou apenas que a investigação foi desencadeada por suspeitas de um atentado dirigido a estudantes universitários da Universidade de Lisboa. Face à gravidade destas suspeitas, “foi atribuída a máxima prioridade à investigação, a qual permitiria, no dia de hoje, às primeiras horas do dia, interromper a atividade criminosa em curso”, indicou a Polícia, relevando que nas buscas que tiveram lugar esta quinta-feira foram apreendidos elementos de prova, que confirmaram as suspeitas iniciais. “Para além de várias armas proibidas, seriam igualmente apreendidos outros artigos suscetíveis de serem usados na prática de crimes violentos, vasta documentação, isto, para além um plano escrito com os detalhes da ação criminal a desencadear.”
Ao que o i apurou, o suspeito vangloriava-se dos preparativos na darkweb, o que foi sinalizado pelos agentes do FBI, treinados para comunicar qualquer suspeita que possa resultar num ataque. Há vários anos que a polícia federal norte-americana tem agentes infiltrados especificamente focados neste tipo de criminalidade. Em 1999, o massacre no liceu de Columbine chocou os Estados Unidos, o que levou a reflexão profunda das autoridades sobre como avaliar e responder a esta ameaça, trabalhando no perfil dos atacantes.
Entre o ano 2000 e 2019, o último balanço disponível no site do FBI, houve 333 incidentes de tiroteio nos EUA, com 2851 vítimas mortais, 62 dos quais em escolas, com 179 vítimas mortais.
Um jovem “sozinho”, alvo de bullying. Investigação começou com um “nickname”
As informações recolhidas pelo FBI chegaram a Portugal no fim de semana passada: em causa, o “nickname” de um jovem em Portugal que vinha a consultar com “muita frequência” sites com conteúdos muito violentos”. Segundo fonte próxima da investigação, estes conteúdos coincidiram com um plano que acabou por ser intercetado pela Polícia Judiciária nas buscas realizadas esta quinta-feira. No perfil traçado para já do suspeito de 18 anos, é definido como um jovem sozinho, com poucas competências sociais, não obstante se tratar de uma pessoa muito inteligente. Seria alvo de bullying por parte de alguns colegas mas não foram colhidos indícios de que o ato que estava a ser planeado se devesse a instintos de vingança, havendo antes uma “fixação” em massacres em massa. No plano que tinha elaborado, o suspeito replicava massacres ocorridos em contexto escolar nos EUA e tinha como objetivo provocar uma grande mortandade.