Provavelmente sem dar por isso, ao comprar as mesmas marcas de pizzas congeladas e refrigeradas, iogurtes, batatas fritas e outros snacks do género, ou ainda leites, cereais, sumos ou refrigerantes, os portugueses consumiram nos últimos três anos menos 25,6 toneladas de sal e menos 6 mil toneladas de açúcar, uma redução de 11,5% no sal e 11,1% no açúcar.
O balanço do compromisso para reduzir teores de sal e açúcar fechado em 2019 entre o Programa de Alimentação Saudável da Direção Geral da Saúde e a indústria alimentar portuguesa, representada pela Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) e Federação das Indústrias Portuguesas Agro-Alimentares (FIPA), foi apresentado esta terça-feira, tendo sido ultrapassadas as metas definidas para 2022 em cerca de metade dos produtos.
O objetivo: contribuir para prevenir doenças crónicas evitáveis como a obesidade, doenças cerebro-vasculares e diabetes tipo 2, depois de um último levantamento a nível internacional ter calculado que em Portugal os hábitos alimentares inadequados estão entre os cinco fatores de risco que mais determinam a perda de anos de vida saudável.
Se o objetivo é este, não se parece estar a avançar à mesma velocidade em todos os alimentos: no que toca à redução do sal, foi nas pizzas que se conseguiu uma maior redução, com um teor de sal, em 2021, 22,3% inferior ao que se registava em 2018, ao passo que nas batatas fritas e companhia não foi atingida ainda a meta de uma redução de 12% face aos valores iniciais (em 2021 verificava-se um decréscimo de 7,1%).
Já no açúcar, os refrigerantes, alvo de um imposto adicional sobre os teores de açúcar desde 2017, os gramas de açúcar por cada 100 mililitros baixaram 16,5% neste período, tendo já sido também atingida a meta de uma redução de pelo menos 10% no leite achocolatado (-10,4%).
Mais atrasados nos objetivos estão os cereais de pequeno almoço, que superaram os objetivos na redução de sal (-14,5%) mas até ao final de 2021 só tinham reduzido em 2,1% o teor de açúcar. E os néctares fogem ao balanço positivo, tendo aumentado ligeiramente o teor de açúcar neste período – embora inicialmente tenham ficado de fora do imposto do açúcar decidido em 2016, passaram a ser taxadas em 2018.
Ao i, Maria João Gregório, responsável pelo programa da DGS, fala de um balanço positivo, explicando que os produtos avaliados, por exemplo nas pizzas mais de 80 variedades, representam cerca de 80% dos produtos vendidos em cada categoria em Portugal.
A responsável sublinha que esse é um aspeto importante deste acordo com a indústria alimentar, por procurar uma mudança transversal “nos produtos que os portugueses mais consomem” e não em marcas de nicho ou nas mais caras. “No fundo, alteramos a oferta alimentar sem que o consumidor tenha de fazer escolhas diferentes, o que nos permite chegar a todos os grupos da população e reduzir nesse sentido o efeito de desigualdades na saúde”.
Se este é um dos lados positivos, a diferença de velocidades no cumprimento das metas fica à vista nesta que é a penúltima avaliação antes do final deste ano, para quando estavam traçadas as metas. “Se me pergunta porque é que umas categorias atingiram primeiro as metas, não diria que são resultados surpreendentes mas mostram sobretudo o empenho dos setores em melhorar a componente nutricional dos seus produtos e que é possível fazê-lo de forma sustentável e consistente ao longo do tempo, por isso pode ser um incentivo para outras categorias que ainda não conseguiram”, responde Maria João Gregório, destacando o trabalho que ainda há a fazer na redução de açúcar nos cereais de pequeno-almoço ou nos iogurtes e avançando que há outras categorias de alimentos que o programa pretende abranger, como as sopas embaladas, pelo teor de sal.
“Educar o paladar” Como acontece esta mudança também pesa. As empresas não poderão estar a substituir o açúcar por exemplo por adoçantes artificiais?
Maria João Gregório admite que neste momento o sistema de monitorização do acordo não permite analisar a composição nutricional global dos produtos, apenas o teor de sal e açúcar, mas a expectativa é que não seja isso que está a acontecer, um trabalho que a DGS tem acompanhado com sensibilização junto do setor, havendo projetos paralelos em curso para fazer uma caracterização da oferta alimentar no mercado, diz Maria João Gregório.
A responsável sublinha que a preocupação de que não se esteja a disfarçar sabor mas a educar o consumidor para produtos menos açucarados ou salgados foi um dos motivos para se definirem como metas reduções na casa dos 10% a 12% a quatro anos.
“Um dos objetivos das reduções estarem a ser graduais foi precisamente esse: procurar que não haja uma substituição do açúcar por exemplo por edulcorantes mas que exista efetivamente uma redução do açúcar sem uma compensação. O que é importante nestes processos é educar o paladar do consumidor. Se as reduções forem graduais, é fácil conseguirmos manter a aceitação por parte do consumidor e ao mesmo tempo garantir a manutenção da qualidade e características dos produtos, porque sabemos que um processo de reformulação é sempre difícil.”
O que ainda não foi também medido é o impacto em termos de resultados em saúde destas reduções, algo que será feito pela primeira vez no final do ano quando terminar esta primeira etapa do compromisso, diz Maria João Gregório. Os ganhos são esperados no entanto mais a longo prazo do que no imediato, com os hábitos a alimentares desde criança já ligados a marcas ao longo da vida, quer no microbioma (mais conhecido como a ‘flora intestinal’) ou na própria relação com a comida.