Moção de Censura apenas com o voto a favor do Chega

Como esperado, a moção foi rejeitada. Só o Chega votou a favor e ainda levou pancada de todas as bancadas.

A luta pela liderança da oposição está ao rubro. O Chega partiu sozinho para o ataque no debate da moção de censura ao Governo. No arranque, André Ventura insistiu que “esta moção de censura não é feita por qualquer motivo de agenda política”, mas de imediato foi interrompido por risos irónicos vindos das bancadas. Estava marcado o tom para o debate.

O líder do Chega começou por criticar a resposta do Governo à crise do SNS, mas foi disparando para todos os lados: desde os aumentos nos combustíveis, ao caos no aeroporto de Lisboa e apontou ainda para o “ministro que já não existe”.  Mas acabaria a sua intervenção com um repto provocador, apelando a que a “putativa direita” reconsiderasse a sua abstenção. “O castigo dos bons que não têm a coragem de fazer política é serem governados pelos maus”, atirou.

Em resposta, o primeiro-ministro acabou por deixar a descoberto a verdadeira intenção do Chega quando decidiu apresentar a moção de censura, precisamente no dia em que começava o Congresso do PSD: “Nada é por acaso…”, sublinhou. Aos olhos de António Costa, esta moção “mais do que dirigida ao Governo é um exercício de oportunidade na competição com os outros partidos da oposição”.

E foi mais longe, afirmando até que Ventura procurou usar a moção de censura para “desafiar a nova liderança do PSD, obrigando-a a clarificar se aceita, ou não, ser aliada do Chega na Assembleia da República.”

Sobre o “último pretexto” da moção, relativo ao caso do novo aeroporto de Lisboa envolvendo o ministro Pedro Nuno Santos, Costa relativizou. Afinal de contas, o “erro efetivamente grave” era “tão efémero que já tinha sido resolvido na véspera da apresentação da moção de censura”. 

A resposta da bancada socialista à moção estava alinhada e o líder parlamentar não desafinou. A 15 dias do Estado da Nação, não era preciso haver “um debate sobre o estado da oposição”, ironizou Eurico Brilhante Dias.

Na segunda intervenção, Ventura atirou-se à bancada social-democrata, considerando “uma vergonha que o maior partido da oposição” ficasse em silêncio na primeira parte do debate. “Afinal Luís Montenegro não é Rio 2.0, é o caminho da desgraça da direita”, vincou.

Tardou quase duas horas, mas a resposta do PSD foi clara: “A nossa ambição não é liderar a oposição, é liderar a governação”. Do púlpito, o deputado Paulo Rios Oliveira explicou que os sociais-democratas não quiseram alinhar no “enorme frete” que o Chega fez ao PS e que, apesar de tantos motivos de censura, o Parlamento “não merece nem precisa de brincar às figuras regimentais” para “ofuscar o congresso do PSD”. 

Acusou depois que até a convocação surpresa das jornadas parlamentares do Chega aconteceu para “impedir a normal eleição” do novo líder parlamentar do PSD.

“Não somos nem seremos os campeões das moções de censura, não pediremos a demissão de ministros todas as semanas nem assumiremos atitudes de forcado numa qualquer tourada parlamentar. Se o Governo merece censura, também censura nos merece o Chega com esta iniciativa”, rematou.

Pela Iniciativa Liberal, João Cotrim Figueiredo tomou a palavra para perguntar a Costa se ia agradecer ao Chega por uma moção de censura apresentada a um Governo de maioria absoluta ao fim de seis meses. “É um favor ao Governo e ao PS. É colaboração, dar oportunidade ao Governo de se regenerar e fortalecer”, avaliou. “Nas minhas funções não está mediar conflitos entre IL e Chega”, ironizou o primeiro-ministro.

Pedro Filipe Soares, do Bloco de Esquerda, assinalou mesmo a “cara de alívio” de Costa perante o terreno do debate, admitindo que o primeiro-ministro possa mesmo ter “alguma sorte” porque o Chega só quis “disputar o lugar de oposição” ao “fazer o joguinho da direita”. Já o PCP não alimentou muito a questão, resumindo-se a dizer que a moção do Chega “não resolve nenhum dos problemas que afetam os trabalhadores”.

Pelo PAN, Inês Sousa Real explicitou o óbvio: “Uma moção absolutamente ineficaz”. “O PAN não alinha com golpes de propaganda”, acrescentou a deputada única. O líder do Livre comparou mesmo André Ventura a “um miúdo à frente de uma consola com muitos botões”. “É preciso carregar em todos, sobretudo se disserem perigo”, completou Rui Tavares, esclarecendo que uma moção de censura é um “instrumento sério”, não é uma oportunidade para “entalar o vizinho do lado” nem para tentar “entrar nos programas de comentário do próximo fim de semana”.

Com o chumbo garantido por toda a esquerda e os deputados únicos e perante a abstenção anunciada do PSD e da Iniciativa Liberal – a votação confirmou o chumbo da moção com os votos contra de PS, PCP, Bloco e dos dois deputados únicos, as abstenções de PSD e IL e os votos a favor do Chega.