Mariana Mortágua poderá dizer adeus ao Parlamento devido à violação das regras de exclusividade

No parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados, são notados os dois momentos em que a deputada do Bloco de Esquerda violou a lei ao exercer funções como colunista do Jornal de Notícias, comentadora na SIC, a título remunerado, enquanto lhe foi concedido o abono mensal de despesas de representação. 

A deputada do Bloco de Esquerda Mariana Mortágua tem o seu lugar no Parlamento em causa devido ao facto de ter recebido uma remuneração pela função de comentadora do Jornal de Notícias (JN) e da SIC ao mesmo tempo que obtinha o subsídio por exclusividade nas funções parlamentares, apesar de ter devolvido parte do valor.

O seu destino vai ser conhecido esta quarta-feira, quando os deputados votarem na Assembleia da República a proposta de parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados, cujo documento aponta os dois momentos em que Mariana Mortágua violou a lei.

No documento de 25 páginas, acedido pelo Nascer do Sol, a deputada do PSD e relatora da proposta de parecer, Márcia Passos, contextualiza a polémica e o respetivo enquadramento legal.

Primeiramente, a social-democrata declara que a colaboração da bloquista com o JN – estabelecida com um pagamento por direitos de autor – não é incompatível com a condição de exclusividade e conclui, por isso, que Mariana Mortágua não violou o regime durante o exercício do seu mandato com esta função.

“Sucede que não há qualquer incompatibilidade ou impedimento no exercício simultâneo, por parte da Senhora Deputada Mariana Mortágua, do mandato parlamentar com as atividades de atividades de colunista do JN e de comentadora da SIC, porquanto tais atividades não constam, nem do elenco das incompatibilidades, nem no elenco dos impedimentos, previstos respetivamente nos artigos 20.º e 21.º do Estatuto dos Deputados”, lê-se na proposta redigida pela deputada do PSD.

No entanto, houve períodos em que Mariana Mortágua terá recebido uma remuneração como comentadora na SIC Notícias, enquanto recebia no Parlamento um abono mensal para despesas de representação.

De 1 de julho de 2015 a 30 de setembro de 2019 e de 1 de outubro de 2021 a 28 de fevereiro de 2022, a bloquista recebeu das atividades que exercia funções como do apoio que o Estado lhe concedeu.

Mariana Mortágua já era colunista e comentadora antes de 1 de julho de 2015, no entanto foi a partir do seu segundo mandato, que começou em 23 de outubro de 2015, que a bloquista requereu o “abono de despesas de representação previsto no n.º 6 do artigo 16.º da Lei n.º 4/85, de 9 de abril (Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticos), uma vez que declarou no registo de interesses que não exercia regularmente qualquer atividade económica ou de natureza liberal”.

De acordo com o documento, Mariana Mortágua recebeu este apoio durante “todo o período da XIII.ª Legislatura, ou seja, de 23/10/2015 a 24/10/2019”. Ou seja, durante esse mandato, a deputada “encontrava-se em regime de “exclusividade””.

“Sucede que a Senhora Deputada Mariana Mortágua não declarou no seu registo de interesses, que continuaria a exercer a atividade de colunista do JN, a título remunerado, e a atividade de comentadora televisiva na SIC, também a título remunerado (atividade que cessou em “2019-09-30”), em acumulação com o mandato de Deputada”, aponta.

Só na passada legislatura é que Mariana Mortágua “declarou, pela primeira vez junto da Assembleia da República, no campo relativo às atividades exercidas nos últimos três anos, ter exercido as atividades de colunista do JN desde “2015-04-01” e ter exercido as atividades de comentadora televisiva na SIC entre “2015-07-01” e “2019-09-30”, não referindo, porém, se tais atividades eram, ou não, remuneradas”, sublinha Márcia Passos.

No entanto, note-se que à data não havia um campo especifico no qual os deputados tinham de declarar esse dado. Essa lei foi alterada em 2020 e entrou em vigor em novembro desse ano, passando a haver um campo específico, no registo de interesses, para declarar se tais atividades eram, ou não, remuneradas.

Já na XIV.ª legislatura, Mariana Mortágua continuou a receber o abono mensal, mas quando este apoio sofreu alterações, em março de 2022, decidiu devolveu o vencimento que tinha recebido indevidamente ao Estado, dado que “deixou de estar em “exclusividade” no período entre 01/10/2021 a 28/02/2022”.

“Relativamente ao período de tempo mais antigo – “2015-10-23” e “2019-09-30” [ou seja, quase quatro anos] – a Senhora Deputada Mariana Mortágua não efetuou a reposição do valor total recebido a título de abono mensal para despesas de representação”, acentua a social-democrata.

"Já quanto à questão de saber se o entendimento da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados de 13 de fevereiro de 2020 tem, ou não, efeitos retroativos, é algo que competirá à própria Comissão a qual, salvo melhor entendimento, deverá emitir deliberação nesse sentido”, conclui o documento.