por Carlos Bonifácio, Mestre em Estratégia, e João Barreiras Duarte, Consultor e Gestor de Empresas
A cimeira da Nato em Madrid saldou-se por um enorme sucesso: as exigências turcas à Finlândia e à Suécia parecem ter vingado. No centro da discórdia estava o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), classificado como partido terrorista pelo regime turco, pela UE e pelos Estados Unidos, e a organização Fetö, considerada por Erdogan, como instigadora da tentativa de golpe de Estado de 2016 na Turquia. Ambos os movimentos têm membros radicados na Suécia e na Finlândia, e ambos os países comprometeram-se em tomar medidas legislativas para limitar a atividades destas organizações. Em simultâneo foi levantado o embargo da venda de armas à Turquia, ficando assim desbloqueado o veto turco à entrada da Suécia e da Finlândia na Aliança do Atlântica.
A «morte cerebral», como Emmanuel Macron classificou a Nato em 2019, espelhava então a ambiguidade ocidental após o avanço das tropas turcas em território sírio e depois da anexação da Crimeia. À época, o então Presidente Trump considerava a Nato um fardo e um sorvedouro de recursos para a sua presidência, enquanto o conceito estratégico, aprovado na cimeira de Lisboa, identificava a Rússia como um parceiro. Passados três anos tudo mudou e a Nato voltou a ter vida própria e a ser considerada pelos seus membros como um porto de abrigo.
Putin não calculou as consequências da invasão da Ucrânia, estava convicto que a Nato e UE não teriam qualquer reação perante o facto consumado de uma invasão surpresa. Não avaliou o fortalecimento da Aliança Atlântica e nem imaginou que as fronteiras partilhadas entre a Nato e a Rússia iriam aumentar.
A Nato alterou o seu conceito estratégico, mas não mudou os seus princípios. A Aliança Atlântica continua a ser uma organização defensiva que só reage quando diretamente atacada, mas no entanto, e perante as atuais circunstâncias, foi forçada a mudar o seu posicionamento estratégico em relação à Rússia, que passou agora a ser a sua principal ameaça. Simultaneamente, a China passou a ser encarada como um potencial desafio enquanto competidor estratégico. Em grande parte, esta mudança estratégica resulta muito por vontade e determinação dos Estados Unidos que é quem financia, ou seja, quem paga e quem lidera globalmente a política de defesa mundial. Em consequência desta alteração estratégica, a NATO viu-se na contingência de aumentar substancialmente a sua força de reação rápida junto das suas fronteiras a leste da Europa, exortando os Estados membros a uniformizarem os investimentos militares em 2% do PIB. Tal recomendação equivale nalguns casos a um esforço substancial, como é o caso de Portugal.
As operações de manutenção da paz (Partner in Peacekeeping) à escala global a que a Nato pretende reforçar, obrigam a que cada Estado membro possua umas Forças Armadas dimensionadas e bem equipadas. Isto equivale a custos suplementares a que todos vamos ser convocados como salvaguarda da democracia e liberdade do mundo livre.
Por fim, a NATO reiterou nesta Cimeira o apoio determinado à Ucrânia, tendo desbloqueado um novo pacote de apoio integral, assim como ajudas a países como a Moldávia, Geórgia e Bósnia-Herzegovina, num sinal fortíssimo para a Rússia de que a Nato não aceitará novas agressões e tudo fará para impedir as ameaças imperialistas russas.