A questão de Taiwan

Termino com a resposta que me deu em Macau a nossa empregada chinesa, jovem instruída, quando lhe perguntei como seria resolvido o problema de Taiwan: «Quando a China for como Taiwan, estará tudo resolvido».

Num fundamentado e muito oportuno artigo, o embaixador Duarte de Jesus, sabedor e experiente das questões diplomáticas do Oriente, traz os factos que importa lembrar, repondo a verdade histórica – e enfrentando a ignorância e parcialidade da generalidade dos comentários. Factos que revelam o tempo e o modo do poder americano, empenhado da pior maneira em enfrentar o crescimento económico e a afirmação internacional da China, que sentem como uma ameaça à sua hegemonia imperial. Transcrevo o possível, do que me parece essencial. E não se esqueçam de ler Kissinger.

«A ilha de Taiwan começou a ganhar uma importância internacional a partir de 1620, quando os primeiros europeus por lá passaram, nomeadamente portugueses e espanhóis. Os portugueses, que a batizaram com o nome de Formosa e que pensaram ali ter um estabelecimento a longo prazo, acabaram por optar definitivamente por Macau.

A ilha passou a fazer parte integrante do Império Chinês ainda durante a dinastia Ming, mas dado que nela se estabeleceram elementos que não aceitaram a nova dinastia Qing, esse facto veio a trazer um período de prolongada crise que só veio a terminar com o Imperador Kang Xi, depois de haver derrotado os chamados Estados Feudatários e assim ter recuperado vários territórios, entre eles a ilha Formosa ou de Taiwan, em 1683.»

Depois foi uma longa história.  «No seguimento da operação de diplomacia secreta entre Zhou en Lai e Kissinger, dá-se a famosa visita de Nixon a Pequim em 1972 e é assinada a Declaração de Xangai, de fevereiro de 1972, que deveria ter marcado a solução do problema de Taiwan até aos nossos dias, não fora novo ziguezaguear da diplomacia americana.

Citemos somente as conclusões da aludida Declaração no que diz respeito ao problema de Taiwan:

‘Ambas as partes reviram as disputas de longa data entre a China e os Estados Unidos. A parte chinesa reafirmou a sua posição: a questão de Taiwan é a questão crucial que cria um impedimento à normalização das relações entre a China e os Estados Unidos; O governo da República Popular da China é o único governo legal da China; Taiwan é uma província da China que há muito foi devolvida à mãe-pátria; a libertação de Taiwan é um problema interno chinês em que nenhum outro país tem o direito de intervir; e todas as forças e instalações militares americanas devem deixar Taiwan. O governo chinês opor-se-á firmemente a qualquer atividade que tenha por objetivo a criação de ‘uma China, um Taiwan’, ‘uma China, dois governos’, ‘duas Chinas’ ,’um Taiwan independente’ ou ‘que o estatuto de Taiwan fique para ser determinado posteriormente’.

Os EUA declararam: ‘Os Estados Unidos reconhecem que todos os chineses em ambas as partes do Estreito de Taiwan mantêm-se onde estão, mas só existe uma China e Taiwan é parte da China. O governo dos Estados Unidos não põe em questão esta posição. Reafirma o seu interesse numa solução pacífica da questão de Taiwan pelos próprios chineses. Com este objetivo em mente, afirmam como o último objetivo a retirada das Forças Armadas e instalações militares americanas de Taiwan. Entretanto reduzirão progressivamente as suas forças e instalações militares em Taiwan na medida em que a tensão na área diminua. As duas partes concordaram na necessidade em alargar a compreensão mútua dos dois povos. Para este fim, ambas as partes discutiram áreas específicas, como ciência, tecnologia, cultura, desporto, jornalismo, tal como formas de contacto pessoa a pessoa para benefício mútuo’.

O texto define igualmente que nenhuma das partes procurará a hegemonia na região asiática.

Nada podia ser mais claro do que estes propósitos de ambas as partes, para que o problema de Taiwan viesse a ter uma solução pacífica a médio prazo.

Em 27/10/71, a ONU reconhece a República Popular da China, como único estado representante da China e desacredita os representantes diplomáticos de Chiang Kai-Shek. A RPC passa a ocupar o lugar de Taiwan no Conselho de Segurança, que lhe tinha sido atribuído desde o fim da II Guerra Mundial.

Com este facto, Taiwan deixa de ter estatuto de Estado, em termos de direito internacional. Hoje, só cerca de 17 países reconhecem Taiwan e têm relações diplomáticas; e mais de 40 têm somente relações comerciais e ou culturais.

Infelizmente, em breve, a política externa americana abandona toda esta arquitetura delineada por Kissinger e Zhou en Lai, com o comprometimento de Nixon e de Mao. Como se sabe, Nixon abdicou em agosto de 1974.»

Termino com a resposta que me deu em Macau a nossa empregada chinesa, jovem instruída, quando lhe perguntei como seria resolvido o problema de Taiwan: «Quando a China for como Taiwan, estará tudo resolvido».

Futuro de paz que o poder imperial americano tem feito tudo para inviabilizar.