Incêndios. Península Ibérica sem tréguas

Portugal entra hoje na terceira onda de calor que foi registada desde junho, enquanto Espanha está dividida entre temperaturas elevadas e precipitação. Será que os incêndios darão tréguas à Península Ibérica?

APenínsula Ibérica está a arder há semanas e o fogo parece não dar tréguas tanto a Portugal como a Espanha. No entanto, há outros países que também têm sido assolados pelos fogos, como a França. 

Começando pelo território nacional, ao início da tarde desta sexta-feira, tendo em conta a vaga de calor e o risco de incêndio, o Governo decidiu decretar situação de alerta para estes dias 21, 22 e 23 de agosto, com reavaliação na segunda-feira, como foi anunciado pelo ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro. O governante deixou claro ainda que existirá o reforço do patrulhamento dissuasor com 25 equipas das Forças Armadas «que reforçarão todos os meios no terreno e no país».

Em declarações aos jornalistas, numa conferência de imprensa realizada na sede da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC), em Carnaxide, José Luís Carneiro afirmou também que a ANEPC «fica com autorização para a avançar com a contratação de mais de 100 equipas de bombeiros, o que significa mais 500 homens, tendo em vista reforçar os meios humanos e permitir que esta reposição de meios mantenha o rigor e a eficácia que tem existido até agora».

O Executivo vai antecipar os pagamentos às corporações de bombeiros que se têm integrado no dispositivo especial de combate a incêndios rurais, num montante que chegará a um milhão de euros. De resto, o Governo determinou, como tem vindo a ser habitual em épocas como esta, «especiais limitações» em relação ao uso do fogo, de máquinas, aos trabalhos agrícolas e ao acesso aos espaços florestais. 

No período compreendido entre os meses de julho e agosto, terá duplicado o número de incêndios cujas causas estarão relacionadas com incendiarismo, passando de 13 para 26 por cento. «Significa que é necessário reforçar os meios de vigilância e de fiscalização», avisou, sendo que o Nascer do SOL pediu dados à PSP e à GNR mas, até à hora de fecho desta edição, não obteve qualquer resposta.

José Luís Carneiro recordou, no entanto, que 54 por cento das causas devem-se ao uso indevido do fogo e ao uso de máquinas e de trabalhos realizados no domínio da agricultura e da floresta. 

À hora de fecho desta edição, o caso mais preocupante continuava a ser o da Serra da Estrela. «Neste momento, estamos a falar de um plano macro. Ainda não estamos a falar do plano de revitalização, esse é numa próxima fase. Neste momento, a nossa prioridade é estabilizar a rede viária, estabilizar as linhas de água e a erosão dos solos», disse, à agência Lusa, o presidente da Câmara de Manteigas. Flávio Massano falou em nome das seis autarquias abrangidas pelo Parque Natural da Serra da Estrela – Manteigas, Celorico da Beira, Covilhã, Guarda, Gouveia e Seia – e ainda de Belmonte, também presente por ter sido igualmente atingido pelas chamas. 

A reunião de ontem, em Manteigas, foi promovida pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), com os autarcas e ainda a Infraestruturas de Portugal (IP) e a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), para que sejam delineados os passos a dar no futuro próximo.

Pelas 16h30 de ontem, na Serra da Estrela, continuavam a surgir pontos de ignição que poderiam dar origem a novos reacendimentos e, por isso, permaneciam 800 bombeiros no local, apoiados agora por seis pelotões do exército. 
Infelizmente, a gravidade de outros incêndios estava a escalar rapidamente. Em Ourém, a título de exemplo, as chamas que tinham começado a deflagrar pelas 14h40, volvidas duas horas, ainda se desenvolviam velozmente e havia habitações na sua linha de propagação. «É um incêndio com grande velocidade e capacidade de propagação.

Há alguns aglomerados de habitações na linha de fogo e os bombeiros estão a protegê-los», explicou uma fonte do Comando Distrital de Operações de Socorro (CDOS) de Santarém.

Pelas 16h30, combatiam este fogo 134 operacionais, 36 viaturas e cinco meios aéreos. Perto das 19h, este fogo obrigou ao corte da circulação na Linha do Norte e atingiu um aviário, como contou à Lusa uma fonte do mesmo CDOS. 

Espanha com pior verão dos últimos 50 anos 
Se durante a semana se dizia que este já era o pior verão dos últimos 15 anos em Espanha, a realidade tornou-se ainda pior. Nesta sexta-feira, o El País mencionava que estes meses estão a ser terríveis e vários fatores tem contribuido para que o combate às chamas sempre seja eficaz. Por exemplo, apenas 10 dos 18 hidroaviões da Força Aérea do país vizinho estão operacionais, mas as horas de voo triplicaram relativamente às do ano passado.

Até ao final do dia de ontem, a Comunidade Valenciana continuava a ser a comunidade autónoma mais afetada, tendo acordado com um novo foco de perigo na localidade de Olocau, na província de Valência. O fogo de Bejís (Castellón), a seu lado, continuava a avançar com uma evolução muito lenta. As chamas já destruíram mais de 19 mil hectares num perímetro de 120 quilómetros nos últimos cinco dias. Contudo, a situação em Vall d’Ebo era muito mais favorável. Embora o fogo ainda estivesse ativo com alguma reprodução ao longo da noite de quinta-feira, que foi controlada, a precipitação que se fez sentir acalmou as chamas. 

Apesar disso, o fogo queimou mais de 12 mil hectares num perímetro de 100 quilómetros e o Consórcio Provincial de Bombeiros de Alicante indicou que não planeava considerar o incêndio dominado até ao final de sexta-feira. Segundo os dados do Sistema Europeu de Informação sobre Incêndios Florestais (EFFIS) divulgados, nesta quinta-feira, pelo programa de satélites comunitário Copernicus (Programa de Observação da Terra da União Europeia), cerca de 270 mil hectares foram queimados nos quase 400 incêndios que foram registados, em território espanhol, desde o início do ano corrente.

Os dados apurados pelo EFFIS mostram a gravidade da multiplicação dos incêndios florestais em Espanha, sendo que a superfície queimada nos primeiros oito meses do ano já supera a devastada, em todo o ano de 2012, em mais de 85 mil hectares, até então o pior ano desde que há registos. Por outro lado, a área queimada em 2022 já é  superior, em mais de 190 mil hectares, àquela afetada em todo o ano de 2021.

«Os dados mais recentes do Copernicus Atmosphere Monitoring Service (CAMS) mostram a França registando as maiores emissões de carbono de junho a agosto desde 2003 no conjunto de dados Global Fire Assimilation System», era explicitado, na quinta-feira, numa nota publicada no site do sistema Copernicus. «Desde o início de junho de 2022, a energia radiativa do fogo mostra valores significativamente mais altos para França, Espanha e Portugal durante as ondas de calor em julho e agosto», foi salientado. 

Relativamente ao caso nacional, ainda que as emissões de carbono tenham sido relativamente «mais baixas» quando comparamos o valor atual com os de anos anteriores, o sistema Copernicus percecionou que «é o país com a maior área queimada», tendo em conta a superfície total, com mais de 61 mil hectares queimados.