Mais de um mês depois de no arranque do debate sobre o estado da Nação António Costa ter garantido estar “em condições de anunciar” que havia concluído “o acordo com a União das Misericórdias e a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (IPSS), que assegura o cumprimento de uma das principais medidas do Orçamento, a gratuitidade das creches para as crianças do primeiro ano já em setembro”, as crianças das creches privadas que não têm vaga no setor social serão abrangidas pelo programa da gratuitidade previsto pelo Governo, como anunciou ontem a ministra da Solidariedade e Segurança Social.
Esta sexta-feira, arranca o programa de gratuitidade das creches, que inclui todas aquelas que nasceram depois de 1 de setembro do ano passado que estejam em estabelecimentos do setor social e cooperativo. Em janeiro de 2023, a medida será alargada aos bebés da mesma idade que não consigam vaga no setor social, como referiu Ana Mendes Godinho, em declarações à agência Lusa.
A ministra acrescentou também que o Ministério está “a definir os requisitos para que seja simples para as famílias a operacionalização desta medida nas situações em que não haja capacidade de resposta do setor social”. Assim, as regras permitem verificar “de uma forma simples sem necessidade de as famílias andarem a percorrer várias entidades do setor social para comprovar que não há capacidade de resposta”. “Hoje é um dia muito importante e transformador na vida das nossas crianças e na nossa vida coletiva”, salientou.
Realidade colide com teoria A ministra adiantou ainda que o Ministério continua a trabalhar com a associação representativa do setor privado para “preparar o alargamento da medida às creches do setor privado quando não existe a capacidade de resposta por parte do setor social”, frisando que será preciso estabelecer “um acordo e suportar o custo integral”. O plano prevê o alargamento faseado do programa até 2024, quando todas as crianças a partir dos dos três anos estejam abrangidas pela gratuitidade.
No final do mês de julho, o Ministério do Trabalho e da Segurança Social esclareceu que “as crianças, agora abrangidas pela gratuitidade, mantêm-na durante todos os anos que estiverem na creche”, sendo que “o objetivo é chegar a 100 mil crianças no final da implementação da medida (2024)”.
Como o i noticiou há dois meses, mesmo com as medidas que estão a ser tomadas, “há crianças que são excluídas porque há listas de espera enormes”, explicou ao i a educadora de infância Daniela Galveias. “Tive um caso de uma mãe a pedir-me ajuda porque a filha mais velha não entrou na IPSS da irmã, quando supostamente dão prioridade aos irmãos”, observa a autora da página @desabafosdeducadora no Instagram. “Basicamente, a menina frequentava aquela instituição desde o berçário e ia para o jardim de infância agora. Avisaram-na de que não teria vaga”.
O que parece incomodar mais os restantes educadores de infância ouvidos pelo i, e que preferem não revelar a identidade, é o facto de decisões como esta serem “morosas” e ainda não abrangerem mais crianças e não apenas aquelas que têm um ano ou menos.
“Se vivemos num Estado Social, como os nossos políticos apregoam, acho que algo está extremamente errado para que a educação ainda não seja 100% gratuita como noutros países mais desenvolvidos do que o nosso”, diz uma, enquanto outra concorda com Daniela Galveias que, em declarações ao i, em julho, afirmou:
“Não seria mais justo atribuir um determinado valor de apoio aos pais para ficarem com os filhos nos primeiros anos de vida ou escolherem eles o contexto educativo, em vez de se dar esse montante às IPSS?”, questionou Daniela, pois o Estado vai pagar 460 euros por mês por cada criança junto das Instituições Particulares de Solidariedade Social para garantir a gratuidade das mesmas.