No passado dia 16, este jornal fez 16 anos. Não é muito. Mas a esmagadora maioria dos jornais fundados em Portugal, desde que há jornais, não chegou tão longe…
Por estranho que pareça, a ideia da sua fundação ocorreu-me quando era ainda diretor do Expresso. Estava há 20 anos no lugar, apetecia-me o desafio de fazer um jornal de raiz e achava que havia espaço para isso. O Independente tivera um grande sucesso mas fora um fenómeno de moda e entrara em declínio. Mais tarde ou mais cedo surgiria um concorrente do Expresso.
Ora, antes que fossem outros a fazê-lo, por que não antecipar-nos… e criarmos essa concorrência dentro do nosso próprio grupo? Seria um lance inesperado, mas fazia sentido. O que um jornal perdesse, o outro ganhava. Ficaria tudo em família.
Falei com Balsemão. Ficou de pensar e uma semana depois deu-me a resposta: «Não». E acrescentou: «Seria dar um tiro no pé… ou mais acima». Respondi-lhe que, perante isso, iria procurar algum investidor interessado. Ficou assim claro que eu já não ficaria muito mais tempo à frente do Expresso.
Falei com as pessoas que me eram mais próximas no jornal e nas quais apostava para formar o núcleo duro do novo semanário: o José António Lima, o Mário Ramires e o Vítor Rainho. Todos abraçaram entusiasticamente a ideia. E enquanto eu começava a esboçar o novo projeto, o Lima e o Mário começaram a falar com possíveis investidores.
Contactaram muita gente. Até que apareceu Paulo Teixeira Pinto, então presidente do BCP, e a ideia ganhou asas.
Ficou definido que o banco ficaria com 25% do capital, dois empresários – Joaquim Coimbra e José Paulo Fernandes (não confundir com o presidente da Cofina) – ficariam com os mesmos 25% cada um, e o grupo de jornalistas fundadores, mais o Manuel Boto, meu primo, ficaria com os restantes 25%. Era um esforço financeiro muito considerável para nós, mas todos o assumiram com convicção.
O BCP disponibilizou-nos instalações no centro da Baixa, na rua de S. Nicolau, onde começámos a trabalhar e onde ficariam as instalações do jornal.
No último momento, Balsemão ligou-me a dizer que, afinal, talvez estivesse interessado em entrar como acionista. Falei com Teixeira Pinto e os outros sócios, que afastaram essa hipótese. Era tarde.
No rés-do-chão do prédio do Chiado, o jornal começou a tomar forma. As ideias eram claras: seria um projeto jornalístico e não um projeto político. Deveria ser sério como o Expresso, mas não tão institucional e tão pesado; deveria ter a irreverência e a acutilância de O Independente, mas não ser tão sensacionalista e ser mais rigoroso e responsável.
Como característica diferenciadora, recusava o politicamente correto, que surgia como a maior ameaça à liberdade de imprensa.
Quanto à embalagem, teria 4 cadernos – um caderno principal, em formato tabloide, um suplemento de economia em papel salmão, uma revista em papel couché e um guia de lazer em formato reduzido. Este seria o menu semanal.
Mas haveria mais.
No Verão, criaríamos um produto especial, colecionável. O primeiro seria uma coleção de livros para crianças, onde os grandes clássicos da literatura portugueses seriam ‘recriados’ para os mais jovens por autores vivos consagrados.
No fim do ano, publicaríamos um anuário com os principais acontecimentos nacionais e estrangeiros, que incluiria uma seleção de textos publicados no SOL.
Finalmente, estribados na ideia de que um jornal não poderia limitar-se a dar notícias e fazer reportagens, encomendaríamos regularmente a figuras de prestígio trabalhos de fundo sobre o futuro de Portugal. A primeira pessoa que contactei foi Ernâni Lopes, que aceitou.
Como se vê era um projeto vasto, ambicioso e muito completo. Mas tínhamos absoluta certeza de que o conseguiríamos concretizar e que seria um êxito.
As responsabilidades estavam claramente atribuídas: eu seria o diretor, o Lima o diretor adjunto, e o Mário Ramires e o Vítor Rainho os subdiretores – o primeiro com a responsabilidade do caderno principal, o segundo com a revista.
Quanto às secções, a Ana Paula Azevedo ficou com o Nacional geral, o António Costa com o suplemento de Economia, o José Cabrita Saraiva (meu filho) com a Cultura, o Pedro Prostes da Fonseca com o Desporto. A Margarida Vieira da Silva assumiu a chefia do guia semanal.
A equipa de gestão também já estava formada, sob a liderança do José Marquitos, que montou uma máquina muito profissional, em que destaco o Efraim Tavares – que trabalharia sempre de muito perto comigo, quer na campanha de lançamento quer nos projetos especiais.
Todos os jornalistas que convidámos, no Expresso ou fora dele, aceitaram o convite, com uma única exceção. Conseguimos os colunistas que quisemos: Marcelo Rebelo de Sousa, Paulo Portas, Miguel Coutinho, Margarida Rebelo Pinto, António-Pedro Vasconcelos…
A expectativa era muito grande. Todos os dias me telefonavam jornalistas a saber novidades. Na rua muitas pessoas interpelavam-me, dizendo que esperavam ansiosamente o novo jornal. Rui Veloso, que não conhecia, abordou-me no Chiado e perguntou: «Então, vai ser um sucesso?». «Não tenho dúvidas.», respondi. «Também acho», rematou ele.
Toda a gente achava.
Na véspera da saída, fui à Grande Entrevista da RTP, a convite da Judite Sousa. Era a cereja no topo do bolo.
A festa de lançamento, na Central Tejo, em Belém, atual Museu da Eletricidade, foi uma das maiores que se fizeram em Portugal. Retumbante. Estavam umas duas mil pessoas, a classe política em peso, gente do espetáculo e da TV. Marisa foi a artista convidada. A certa altura desceu do palco, encostou-se a mim, e assim cantou «Olha o Sol que vai nascendo…», de José Afonso.
Aí já tínhamos divulgado o nome do jornal, que fora um segredo bem guardado durante meses. No Verão havíamos feito uma campanha nas praias de oferta de t-shirts às crianças, com o slogan ‘Um jornal quando nasce é para todos’. Mas apesar desta ‘deixa’, ninguém adivinhou o nome – SOL. Quanto à revista, chamar-se-ia Tabu, o suplemento de economia seria o Confidencial, e o guia o Essencial.
Quando a 1ª edição saiu à rua, no dia 16 de Setembro de 2006, esgotou-se rapidamente. O Expresso, temeroso, oferecia cassetes de filmes de sucesso, mas não nos beliscou.
Hoje, somos mais pequenos. Todos os jornais são mais pequenos. Em Portugal e no mundo. Mas o SOL – que entretanto mudou para Nascer do Sol, por razões burocráticas – continua a brilhar.
Ao longo de 16 anos resistimos a várias mudanças de sócios, a ataques ferozes de figuras influentes (desde Balsemão a Sócrates), a dificuldades de toda a ordem. E resistimos. Porquê? Pela convicção enorme com que criámos este projeto, e que constituiu uma força indomável. Foi isso que manteve o jornal vivo e a equipa fundadora de um modo geral unida.
Hoje com novos investidores, que não se limitaram de investir dinheiro antes tiveram a coragem de dar a cara – Pedro Vargas David e Luís Santos – preparamo-nos para os próximos 16 anos. Depois logo se verá…
P.S. – Agradeço reconhecido ao Mário Ramires (um gigante, que aguentou este barco durante 7 anos em circunstâncias terríveis), ao José António Lima (que já saiu mas foi sempre um adjunto leal), ao Vítor Rainho (um bulldozer e um grande ser humano), à Carolina Silva (o meu insubstituível braço direito), à Felícia Cabrita (cujo talento dispensa comentários), ao Francisco Alves (um designer gráfico com raros dons jornalísticos), à Ana Paula Azevedo (uma magnífica jornalista, que também saiu), ao Óscar Rocha (um virtuoso), à Margarida Alexandre (uma joia), a confiança que depositaram em mim no arranque deste projeto e a enorme contribuição que deram para o pôr de pé. Todos saíram do Expresso para fazer o SOL.
E aos que chegaram depois e continuam connosco agradeço a forma como se integraram na equipa e contribuem semana a semana para o futuro do jornal. O meu cumprimento final vai para os colunistas que graciosamente enriquecem com os seus textos estas páginas.