O impasse mantém-se dentro do Governo, em torno da redução da carga fiscal no próximo ano, nomeadamente do IRC. Se António Costa Silva defende a medida, Fernando Medina pede cautela. Ao nosso jornal, João César das Neves, António Bagão Félix e Eugénio Rosa levantam o véu em relação às prioridades do próximo Orçamento do Estado.
Para César da Neves, o “próximo Orçamento vai ser marcante, porque é o primeiro do novo ministro – o anterior não conta, pois já estava feito. A inflação facilita a coleta dos impostos, mas cria várias pressões sobre a despesa (salários, pensões, apoios) e em breve o efeito da subida de juros começará a sentir-se. Vai ser um teste à nova atitude da maioria absoluta face ao equilíbrio orçamental”.
E defende que o documento deveria contemplar medidas como a redução do IRS e do IRC, por considerar que seria “uma ajuda importante para as famílias e para as empresas com vista a enfrentar a subidas de preços”, diz, defendendo mesmo que estas hipóteses são “melhores do que algumas das medidas já anunciadas”. No entanto, diz que duvida que o Governo opte por essa via, por entender que “seria um grande risco orçamental”.
Também Bagão Félix entende que o Orçamento do Estado para o próximo ano vai enfrentar o aumento nominal considerável da despesa pública, sobretudo devido às despesas relacionadas com pessoal, com juros e despesa social.
Quanto aos impostos, acredita que não haverá grandes mexidas em 2023. “Primeiro, porque há a obsessão tributária, aqui e na Europa, de tudo querer resolver mantendo ou até aumentando a carga fiscal. Depois, porque o Governo não dá indicação de querer propor reformas estruturantes neste domínio, antes pequenos (e às vezes) ilusórios ajustamentos” e dá, como exemplo, o que se verifica com a chamada ‘tributação de lucros anormais’, depois do discurso da presidente da Comissão Europeia.
Mais crítico é Eugénio Rosa ao afirmar que “uma coisa é o Orçamento do Estado que o país e os portugueses precisam devido à situação dramática que enfrentam, outra coisa diferente é o Orçamento que o Governo, dominado pela obsessão do défice, de ‘contas certas’, submisso à Comissão Europeia e ávido por aplausos de Bruxelas, deverá apresentar”.
Quanto à revisão dos impostos, o economista defende o IRS em detrimento do IRC, dando como exemplo a execução até julho. “Nessa altura, o Estado tinha arrecadado de IRS 7336 milhões e de IRC apenas 4385 milhões. Já para todo o ano de 2022, o Orçamento prevê que as receitas de IRS atinjam 15202 milhões e as de IRC somente 5211 milhões, ou seja, pouco mais de um terço das de IRS. Portanto, as empresas e, nomeadamente, os grandes grupos económicos, já pagam pouco relativamente ao que pagam os trabalhadores (91,8% dos rendimentos declarados para efeitos do IRC são de trabalhadores e pensionistas)”.