Meio ano decorrido, o segundo Governo de António Costa, apoiado pela segunda maioria absoluta socialista, parece gasto, dividido, cansado, descoordenado, com ministros e secretários de Estado em ‘roda livre’, entretidos com quezílias intestinas ou desautorizando-se entre si.
Mesmo as relações entre Belém e São Bento já terão conhecido melhores dias. Ainda recentemente, Marcelo insistiu para que o Governo explicasse «a sua visão» para o próximo ano, que pode ser «mau», enquanto Costa descartou essa possibilidade com ironia, lembrando «os calendários» ao Presidente, e que o OE incluirá «como é obvio o cenário macroeconómico para o próximo ano».
Não são meras divergências de timing, embora Marcelo, sempre indulgente, teime em esquecê-las, para acudir ao Governo, em modo de ‘pronto socorro’.
Mal refeito da demissão de Marta Temido, e mal digerida a humilhação pública a que o primeiro-ministro sujeitou Pedro Nuno Santos, este Governo cria regularmente novos casos.
Um deles, foi o ministro da Economia, António Costa Silva, desautorizado por Fernando Medina – e até por secretários de Estado da sua equipa –, por se ter ‘atrevido’ a preconizar uma descida «transversal» do IRC.
Medina pregou um ‘ralhete’ ao colega, apontando-lhe, com deselegância, que o Governo só «tem uma voz», aquela que é «definida coletivamente».
A bordoada foi tão inesperada que até sacudiu Manuela Ferreira Leite do seu habitual torpor em antena, a ponto de ter preconizado, em termos pouco meigos, a renúncia do ministro.
A verdade é que Costa Silva, tal como Pedro Nuno Santos, aguentou o vexame e não se demitiu, enquanto a sua ‘boa estrela’ parece estar em queda livre.
Esquecido já do desaire nas autárquicas e querendo apagar o ‘passo em falso’ com o episódio do assessor, Medina tem ‘feito pela vida’, agora que os seus principais rivais na corrida à sucessão de Costa estão na ‘mó de baixo’.
Mas os casos não se ficam por aqui, num Governo que nasceu torto e que não consegue acertar o passo, atrapalhado com deslizes imperdoáveis dos seus membros. O último, envolveu Ana Abrunhosa e o potencial conflito de interesses, por causa do marido ter sido beneficiário de fundos europeus. Pode ser legal, mas não é ético.
Já na sensível pasta da Educação, João Costa derrapou na reabertura do ano escolar, com professores em falta e milhares de alunos com ‘furos’ nos horários de várias disciplinas.
E repetiu-se a cena: o ministro a tentar remendos pouco canónicos, ‘empurrando com a barriga’ os problemas crónicos da escola pública.
Em contrapartida, a nova ministra da Defesa, achou prioritário promover nas Forças Armadas «a igualdade de género e a implementação da agenda Mulheres, Paz e Segurança». Lapidar.
Para Helena Carreiras, a primeira mulher a ocupar a pasta da Defesa, o que é importante é avançar com o Plano Setorial da Defesa Nacional em nome da ‘igualdade’, um documento com várias medidas, entre as quais, a inclusão do ‘gabinete da igualdade’ na lei orgânica do Ministério. É obra.
Para quem tenha dúvidas sobre o estado de prontidão das Forças Armadas, o Plano Setorial de Helena Carreiras entretém-se com a «diversidade» e a «igualdade» no manual de «boas práticas». A cultura woke instala-se onde menos se espera.
Note-se que a ‘agenda do género’ na Defesa tem antecedentes. Foi em 2019 que o atual ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, na sua desastrosa passagem pela Defesa, fez ‘vista grossa’ a uma diretiva para a prevenção do assédio ou a utilização de linguagem não discriminatória nos documentos e discursos oficiais.
A coisa deu borrasca e Gomes Cravinho viu-se forçado a recuar e a anular a diretiva, após o mal-estar que se gerou entre os militares.
Helena Carreiras quer recuperar, pelos vistos, o espírito do documento, aliás, em coerência com o seu o perfil académico, onde consta uma tese de doutoramento sobre políticas de integração de género nas Forças Armadas dos países da NATO.
Em vez da prioridade ao reequipamento e à reestruturação das Forças Armadas, queima-se tempo e energias com linguagens inclusivas e outras bizarrias.
Bem avisou Paulo Rangel que o Governo e António Costa puseram o país «em lista de espera». Se não implodir antes, convém lembrar que ‘quem espera desespera’…