Quando drones kamikaze iranianos furaram as defesas antiaéreas de Kiev, ameaçando áreas residenciais, agentes da Polícia Nacional deram por si sem outra opção que não tentar travá-lo como conseguiam, mostram imagens de câmaras corporais divulgadas pelas autoridades ucranianas.
Pararam os veículos em cima de uma ponte, ouvindo o som aterrorizante daquilo que parecia ser um Shahed-136, com um zumbido que lhe valeu a alcunha de “motoreta” entre as tropas russas. E abriram fogo com o que tinham à mão, metralhadoras, espingardas e até pistolas, conseguindo abater o drone, que se despenhou com uma enorme explosão, enquanto os agentes corriam.
Era apenas um entre os 28 drones de fabrico iraniano atirados pelos russos contra a capital ucraniana, na manhã de segunda-feira, sendo que só cinco atingiram os seus alvos, anunciou o presidente da Câmara, Vitaliy Klitschko. Apesar dos seus apelos para que a população ficasse em casa, podia-se ver bastante gente na rua, seguindo com a sua vida quotidiana, relatou um correspondente da BBC. O que poderia ilustrar o heroísmo dos habitantes de Kiev, mas também um certo cansaço por ouvirem sirenes de ataque aéreo a soar quase todos os dias, habituando-se a ignorá-las.
Os ataques com drones decorreram por toda a Ucrânia, causando pelo menos quatro mortes em Kiev e quatro em Sumy. Incluindo uma grávida de seis meses, Victoria, e o seu companheiro, Bohan, de 34 anos, cujos corpos foram encontrados nos escombros do seu apartamento, no bairro de Shevchenkivskyi, no centro da capital.
Poderia pensar-se que tal atrocidade seria um peso na consciência dos operadores destes drones. No entanto, pelo menos alguns mostraram entusiasmo com a missão, como se fosse vingança. Nos destroços de um dos Shahed-136 – que os russos rebatizaram Geran-2, talvez ironicamente, dado que significa “gerânio” – lia-se uma mensagem para os ucranianos.
“Por Belgorod”, escreveram na fuselagem deste drone suicida, avançou a Reuters, referência a uma cidade russa, a meros oitenta quilómetros de Kharkiv. Belgorod raramente tem sido atingida – analistas apontam que deve alguma acordo entre Kiev e seus parceiros da NATO, exigindo que os militares ucranianos se limitem a atacar apenas o seu território, para evitar uma escalada – mas foi bombardeada este domingo. Fazendo quatro feridos, anunciaram as autoridades locais, no dia após a arder uma subestação elétrica, avançou a Ukrinform.
Esta ronda de ataques com drones contra a Ucrânia seguiu-se a outra vaga de bombardeamentos recorrendo a dezenas de mísseis de longo alcance e drones, fazendo pelo menos onze mortos, segundo as contas das Nações Unidas. Os ataques desta segunda-feira atingiram sobretudo alvos civis, mais uma vez, com foco na infraestrutura energética, deixando centenas de aldeias sem eletricidade, avaliaram as autoridades. Instalações da rede elétrica chegaram a arder em Dnipropetrovsk, no sudeste do país, após serem atingidas com um míssil, numa altura em que o gelado inverno ucraniano está à porta.
O Governo da Ucrânia tem-se mostrado plenamente consciente de que há um esforço do Kremlin para usar o inverno como arma. Aliás, até apelou à população que limite o uso de eletricidade entre as 17 e as 23h, dado que cidades como Kiev, Kharkiv e Lviv já viram o seu abastecimento perturbado por bombardeamentos nos últimos meses.
Enxames mortíferos O Governo ucraniano estima que o Kremlin tenha comprado mais de 2600 drones ao Irão. Estes Shahed-136 podem ser lentos, barulhentos, rudimentares, mas também são baratos, custando o equivalente a uns 20 mil euros cada. É essa a sua força. Podem ser lançados em vagas, avassalando com o peso dos números as defesas antiaéreas.
A NATO já enviou plataformas de mísseis terra-ar de última geração, os NASAMS – confiáveis o suficiente para ser usados na defesa do Pentágono – e os IRIS-T, que são mais eficazes contra esta tática do que as defesas antiaéreas soviéticas que a Ucrânia usado dependido. Mas também não fazem milagres.
Analistas apontam que o último bombardeamento massivo, recorrendo praticamente apenas a drones suicidas, é mais outra indicação da escassez de mísseis de longo alcance do Kremlin, que há tanto se fala. Começaram esta guerra com uns 900 Iskander, os poderosos mísseis balísticos preferidos dos militares russos, agora possuem menos de 125, avaliou um alto oficial da NATO, ao Guardian.
Não foi só a Rússia que ficou mal na fotografia com estes ataques contra civis. O Irão, que nega ter vendido drones ao Kremlin contra todas as evidências, também é alvo de críticas. Paris e o Londres até acusam a venda de ser uma violação das cláusulas relativas a mísseis do acordo nuclear de 2015, que Teerão tenta desesperadamente reatar, para escapar às sanções. Não que haja grande esperança disso que enquanto os seus drones kamikaze andarem a ser atirados contra grávidas em Kiev.