Há processos judiciais que nos acompanham há anos, como se fossem já da família. Na consoada sentaram-se à mesa dos portugueses e dobram agora o réveillon sem que se adivinhe o destino final. Alguns escancararam esquemas criminosos muito rentáveis e lucrativos que os portugueses estavam longe de imaginar. O mais emblemático desta quadra festiva é a Operação Marquês (2014) que envolve o ex-primeiro ministro José Sócrates, que, apesar de ter sido preso preventivamente, acabou, ao arrepio da acusação do MP, por ser pronunciado apenas por três crimes de branqueamento e por crimes de falsificação de documentos e ainda não foi julgado. Aguarda-se o desfecho de múltiplos recursos em bolandas nos tribunais superiores.
Na banca, também em 2014, nasceu o caso BES/GES, que continua à espera de um veredicto. Ricardo Salgado, que aparece envolvido em vários outros processos, é a figura de cartaz deste presépio que é considerado um dos maiores da história da justiça portuguesa. Contrariando a maior parte dos arguidos, o juiz que foi substituir Ivo Rosa na fase de instrução deste megaprocesso, esquivou-se a mais manobras dilatórias por parte da defesa dos arguidos. Pedro Santos Correia recusou declarar-se incompetente para seguir com a instrução e decidir se os arguidos deverão ou não ser julgados.
Na área económica, o caso EDP também passará as doze badaladas. Manuel Pinho e Ricardo Salgado já têm acusação, mas o mesmo não acontece com os ex-administradores da empresa, António Mexia e Manso Neto, uma vez que o MP optou por uma separação processual.
Dez anos depois do inicio da investigação Monte Branco, só agora está na reta final para acusação. A firma de construção civil Bento Pedroso – que integra o grupo internacional de construção civil Ofereci (de origem brasileira) –, uma das empresas constituídas arguidas após o desmantelamento pelo DCIAP (Departamento Central de Investigação e Ação Penal) e pela Inspeção Tributária de Braga da maior na maior rede suíça de lavagem de dinheiro e fuga ao fisco que operou em Portugal, pediu ao Ministério Público (MP) a suspensão provisória do processo. Em troca, a construtora está disposta a pagar os cinco milhões de euros de imposto que desviou dos cofres do Estado.
Mais recente, a Operação Tutti Frutti também dobra o ano que entra. A investigação remonta a 2017, sendo Carlos Eduardo Reis, antigo conselheiro nacional do PSD, o principal suspeito desta alegada teia de crimes de corrupção, participação económica em negócio, tráfico de influência e eventual financiamento político, que envolve ainda outras personalidades do PS e do PSD. No centro da operação estão adjudicações superiores a um milhão de euros de juntas de freguesia de Lisboa a militantes destes dois partidos.
O julgamento do criador do Football Leaks, Rui Pinto – que está a ser julgado desde 4 de setembro de 2020 no âmbito de um processo no qual responde por um total de 90 crimes –, também estará connosco para mais uma passagem de ano.
A justiça também não escapou à balança. O caso Lex é o exemplo. O julgamento estreia com o novo ano e entre os acusados encontram-se três antigos desembargadores – Rui Rangel (expulso pelo Conselho Superior da Magistratura), Fátima Galante (ex-mulher de Rangel e aposentada compulsivamente pelo órgão de gestão e disciplina dos juízes) e Luís Vaz das Neves (ex-presidente da Relação de Lisboa, entretanto jubilado) –, bem como o ex-presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira, o vice-presidente encarnado Fernando Tavares e o empresário José Veiga. Estes dois últimos, por não fazerem parte da magistratura, seguem em processo separado. Em causa no processo estão os crimes de corrupção passiva e ativa para ato ilícito, recebimento indevido de vantagem, abuso de poder, usurpação de funções, falsificação de documento, fraude fiscal e branqueamento
No reino do futebol, entre outras investigações a dar os primeiros passos, continua a decorrer o processo Cartão Vermelho (2018) que envolve também Luís Filipe Vieira, o filho (Tiago Vieira), o empresário José António dos Santos (conhecido como ‘O Rei dos Frangos’) e o empresário desportivo Bruno Macedo. Em causa está a venda de 25% do capital do capital da Benfica SAD a um empresário estrangeiro, obtendo com esta alienação ganhos milionários, sem terem comunicado ao regulador dos mercados (o que representa uma contraordenação considerada muito grave, sujeita a multa elevada). Vieira acumula ainda as suspeitas da prática de crimes de burla qualificada ao Fundo de Resolução bancária, de fraude fiscal qualificada e de branqueamento de capitais.
A somar a este há ainda o ‘Caso dos Emails’. Em fevereiro de 2020, o MP acusou o diretor de comunicação do FC Porto, Francisco J. Marques, o diretor do Porto Canal, Júlio Magalhães, e Diogo Faria, comentador, de violação de correspondência e de acesso indevido, por divulgarem conteúdos de emails do Benfica naquela estação televisiva.
O clube dos dragões também não passa incólume. A operação Prolongamento, com Pinto da Costa no centro do furacão, faz companhia aos outros. O presidente do FCP, suspeito de desviar 40 milhões de euros do clube, foi o foco da megaoperação. O MP investiga empresários no seu círculo íntimo, suspeitos de obter comissões ilícitas com jogadores e na venda de direitos televisivos à Altice.