A taxa de inflação continua a não dar tréguas e o Banco Central Europeu (BCE) prepara-se para voltar a subir as taxas de juro, na próxima reunião marcada para o dia 2 de fevereiro. Os analistas contactados pelo i esperam um aumento de 0,5%, o mesmo que se verificou em dezembro.
Esta nova subida dos juros irá ter um impacto nas taxas Euribor, que também subirão, o que tornará o crédito mais caro, aumentando por exemplo o valor das prestações mensais das hipotecas. Uma situação que também terá reflexos em quem está a pensar em pedir um empréstimo.
De acordo com as simulações feitas para o i pela plataforma ComparaJá.pt, para um imóvel avaliado no valor de 125 mil euros a pagar em 33 anos, se a prestação no início do ano fixava-se em 366,15 euros (com uma taxa de juro média de 0,87%), em novembro já subiu para 503,16 euros (taxa média de juro de 3,08%) e em fevereiro irá subir para 538,42 euros, aliando a taxa de juro ao acréscimo previsível de 0,5%. Isto é, uma subida de 35,36 euros por mês, mas mais 172,27 euros face a fevereiro.
Já para um imóvel de 186 mil euros, a pagar no mesmo prazo (33 anos), se em janeiro pagava 540,51 euros, a prestação subiu para 748,71 euros em outubro. Com este aumento dos juros irá pagar em fevereiro uma prestação de 801,17 euros. Ou seja, um aumento mensal de 52,46 euros e uma subida 260,66 euros em relação a fevereiro.
O cenário repete-se para uma casa de 257 mil euros também a pagar a 33 anos. A prestação que em fevereiro era de 799,15 euros subiu para 1096,96 euros em novembro deste ano. A concretizar-se esta subida de 0,5%, irá pagar em fevereiro uma prestação mensal de 1184,63 euros. Feitas as contas, mais 87,68 euros por mês e um aumento de 386,48 euros em relação ao início do ano.
Portugueses penalizados
Com as taxas de referência a aumentarem, naturalmente que todas as outras taxas, como é o caso da Euribor, serão também afetadas. Henrique Tomé lembra que, em Portugal, “como mais de 90% dos créditos à habitação têm taxa variável, as famílias irão ver o seu poder de compra ser reduzido mais uma vez”.
Uma opinião partilhada por Paulo Rosa, economista do Banco Carregosa. “Aqueles que têm empréstimos indexados às taxas Euribor a três e seis meses terão, com alguma certeza, ainda atualizações em alta do seu contrato no prazo de renovação”. Mas nem tudo são más notícias, uma vez que acredita que será provável que os empréstimos à habitação vinculados à Euribor a 12 meses já tenham algum alívio daqui a 12 meses, ou seja, em janeiro de 2024, relativamente aos valores atualmente observados.
Também Ricardo Evangelista, analista da ActivTrades, admite que “para os que estão a pagar empréstimos com taxa variável, o impacto será negativo, já que as taxas Euribor acompanharão a subida”, o que irá representar prestações das hipotecas mais altas.
Novos aumentos
De acordo com os analistas contactados pelo i a opinião é unânime: “Se o BCE avançar com o aumento esperado, as taxas de juro de referência passarão para o patamar dos 3%, sendo que ainda existem expectativas para novas subidas ao longo deste ano”, refere o analista da XTB, Henrique Tomé. E as contas são simples: “Durante a primeira metade deste ano espera-se que os juros continuem a subir. No entanto, também se espera que a partir do 1.º trimestre do ano a escala destas subidas seja inferior às decisões anteriores”.
O responsável admite que embora a inflação permaneça elevada reconhece que começam a surgir sinais de que o pico já poderá ter sido atingido e, por isso, refere que não se devem esperar aumentos sobre os juros de forma tão agressiva como os que foram registados ao longo de 2022.
“Depois da decisão da reunião de fevereiro do BCE, espera-se que os novos aumentos dos juros possam voltar a ser revistos em baixa, iremos observar, eventualmente, subidas de ‘apenas’ 25 pontos base ao longo das próximas reuniões, isto se a inflação continuar a dar sinais de abrandamento”, refere ao nosso jornal.
Também Paulo Tomé, economista do Banco Carregosa, diz que o mercado antecipa uma nova alta de mais meio ponto percentual na reunião de 16 de março, seguida por uma nova subida na reunião agendada para 4 de maio, mas de apenas um quarto de ponto percentual. “O mercado antecipa ainda uma alta de mais 25 pontos base durante o próximo verão, fechando assim o ano de subidas num aumento total de mais 150 pontos base, ou seja, 1,5 pontos percentuais. Assim sendo, as taxas terminais atualmente projetadas seriam de 3,5% para a taxa de depósitos do BCE, 4% para a taxa de referência e 4,25% na cedência de liquidez”.
“Entretanto, o mercado antecipa também algum alívio das taxas de juro no final do ano em 25 pontos base”, acrescenta.
Suficiente para controlar a inflação?
Para Henrique Tomé estes aumentos dos juros servem para arrefecer a atividade económica de modo a que seja possível controlar a inflação e nem sempre o impacto destas medidas é imediato como se observou na Europa e também nos EUA. E, por isso, dá nota positiva à entidade liderada por Christine Lagarde nessas decisões. No entanto, reconhece que “é importante também notar que existem determinados setores, como os serviços, que continuam a dar sinais de pressões inflacionistas e por isso é cedo para tirar conclusões finais sobre as medidas adotadas, até então, pelo BCE”, recordando que o organismo foi um dos principais bancos ocidentais a levar mais tempo para subir as taxas de juro (sem contar com o Banco do Japão) e como consequência, na Europa, a inflação só há pouco tempo é que começou a dar sinais de abrandamento.
Já o economista do Banco Carregosa recorda que a inflação é maioritariamente do lado da oferta e impulsionada em grande medida pelos preços da energia, sobretudo do gás natural, e pelos preços dos alimentos, aumentos estes ditados pela guerra na Ucrânia. Todavia, alerta que a reposição dos salários é uma ameaça à estabilidade dos preços. E dá como exemplo, o salário mínimo na Alemanha que aumentou 22%, “intensificando a pressão sobre a inflação, sobretudo sobre o índice de preços no consumidor subjacente, o que exclui alimentação e energia”, recordando que “a inflação germânica é precisamente aquela que mais pesa nas decisões do BCE, podendo deste modo além de atrasar um alívio das taxas de juro, alimentar mais essa mesma alta”.
Quanto ao trabalho levado a cabo pelo banco central, Paulo Rosa diz que o BCE está a operar o seu trabalho, “procurando travar a inflação mais elevada das últimas décadas, mesmo esta sendo inicialmente do lado da oferta, correndo assim o risco acrescido de culminar numa recessão, esta postura monetária energicamente restritiva do banco central da Zona Euro. Além de que o seu trabalho está a ser colocado em causa por políticas remuneratórias inflacionistas germânicas”.
Mais otimista está Ricardo Evangelista ao garantir que as subidas das taxas de juro têm contribuído para um abrandamento da inflação. No entanto, chama a atenção para o facto de os valores totais continuarem bastante acima do objetivo dos 2%, e a chamada inflação core, que não inclui os preços da energia e das matérias-primas alimentares, ainda não começou a descer. “Este cenário deixa antever a continuação da subida dos juros, pelo menos nas duas próximas reuniões de fevereiro e março”, já a partir daí reconhece que tudo dependerá do comportamento da inflação e também do crescimento económico, o que no seu entender, “é difícil de prever neste momento”.
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