Os alarmes já estão a soar junta das instituições financeiras. O Fórum para a Competitividade não tem dúvidas que março deu arranque ao início de perturbações bancárias «cujo fim é incerto, porque a confiança demora a conquistar mas perde-se rapidamente», defendendo que «esta turbulência tem um efeito equivalente a uma subida das taxas de referência pelos bancos centrais».
Mário Martins, analista da ActivTrades, defende que a subida dos juros, a redução de liquidez e a incerteza sobre novos focos de preocupação no setor bancário, «resultam numa menor disponibilidade dos bancos em conceder crédito, o que é perfeitamente natural dentro de uma política de gestão prudente, mas o impacto não é quantificável em subidas de juros, são processos e impactos diferentes», diz ao Nascer do SOL.
Já Henrique Tomé, analista da XTB afirma ao nosso jornal que, numa primeira fase, «onde os juros começam a subir, a banca tende a sair beneficiada». Só que, à medida que os juros continuam a subir, «os riscos aumentam significativamente no setor, sobretudo para as instituições com menos liquidez e expostas às circunstâncias do mercado». O analista diz que concorda quando se diz que o fim é incerto, «contudo, os recentes acontecimentos na banca voltaram a relembrar as instituições sobre a importância dos mecanismos de defesa que estas podem adotar para mitigar parte dos riscos relacionados com a atual conjuntura económica».
O Fórum para a Competitividade avançou também, na síntese de conjuntura económica, que a inflação caiu pelo quinto mês consecutivo, embora a inflação subjacente tenha subido de novo, de 7,4% para 7,5%, «o que deverá ser encarado com preocupação pelo BCE». Mas como deverá reagir o Banco Central Europeu? «O trabalho do BCE não é nada fácil, muito por culpa da sua própria inação em 2022, mas a mentalidade hawkish deverá persistir, ou seja continuar com a subida dos juros, visto que a inflação é o principal problema da economia europeia nesta fase».
Por sua vez, Henrique Tomé não tem dúvidas que a taxa de inflação subjacente «é claramente o maior desafio para o BCE» e diz acreditar que «nos próximos meses deveremos observar uma diminuição na taxa de inflação subjacente, embora esta seja possível também de combater dado que a atividade económica está de facto a diminuir e a longo prazo deverá refletir-se também na inflação – sobretudo nos serviços que é onde as pressões sobre os preços são mais persistentes».
O analista é da opinião de que o BCE tem seguido o caminho certo ao aumentar os juros «e deverá continuar a fazê-lo durante as próximas reuniões de política monetária». Só que, diz, por outro lado, «os aumentos dos juros não têm um impacto imediato na economia real, pelo que deverá levar algum tempo até que se sintam os efeitos das fortes subidas dos juros».
BCE deve conter política de controlo à inflação?
Questionados sobre se o BCE deveria rever a sua política de controlo à inflação, uma vez que tudo indica que deverá continuar a subir as taxas de juro, os dois analistas defendem que esta é a melhor forma.
«A única forma de condicionar a subida de preços nesta fase é condicionar o consumo e a melhor opção do banco central é a subida dos juros, até porque depois têm os governos a implementar pacotes de incentivo ao consumo, incluindo o PRR, que ameniza o impacto da subida dos juros», defende o analista da ActivTrades.
Já Henrique Tomé lembra que a inflação na Europa continua em níveis elevados e, por isso, «é necessário que o BCE continue a aumentar os juros». Contudo acredita que nas próximas reuniões «o banco central possa começar a diminuir a subida dos juros, tal como já aconteceu com outros bancos centrais».
Redução do IVA não ajuda a diminuir inflação
No que diz respeito à descida do IVA, o fórum liderado por Pedro Ferraz da Costa defende que «não deve ajudar muito a diminuir a inflação portuguesa, quer porque os preços dos produtos alimentares já estão a desacelerar, quer porque deve gerar um efeito substituição que tem fortes condições para contrariar o efeito fiscal».
Opinião que é partilhada por Mário Martins ao garantir que «o impacto benigno na inflação deverá ser diminuto, devido às inúmeras deficiências no sistema que possibilitam aproveitamentos dos retalhistas em não refletir a descida na totalidade, para além de que uma descida generalizada para todos os cidadãos abrange uma parcela significativa de destinatários que não precisam desse auxílio, resultando assim numa descida de receitas fiscais, que será colmatada com menos apoios para aqueles que precisam efetivamente de mais apoios».
Também Henrique Tomé concorda com o Fórum para a Competitividade e defende que estas medidas «acabam acabam por ir contra todas as políticas monetárias que o BCE tem adotado para travar a subida dos preços», defendendo que «é preciso ter consciência de que é necessária uma diminuição na atividade económica para travar a inflação, ainda que as famílias sejam penalizadas, faz parte do processo que infelizmente todos teremos de ‘pagar’. Não obstante, as classes sociais menos favorecidas, estas sim, devem ser apoiadas pelo Estado».
Inflação continua a abrandar
Mas a verdade é que a inflação tem desacelerado – não só no nosso país como na zona euro e nos países da OCDE.
Em Portugal, caiu pelo quinto mês consecutivo em março e ficou nos 7,4%. Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), esta desaceleração é explicada, em parte, com o «efeito de base resultante do aumento de preços dos combustíveis e dos produtos alimentares, verificado em março de 2022».
Questionado sobre o que é esperado daqui para a frente no que diz respeito à inflação, Mário Martins diz que é esperada a sua manutenção «num patamar demasiado elevado», o que vai forçar o BCE «a manter o rumo da política monetária restritiva».
E Henrique Tomé defende que a inflação «tem desacelerado quando comparamos em termos homólogos e tem refletido um pouco a diminuição da atividade económica na qual tem sido afetada pelas atuais políticas monetárias», acrescentando que ao longo do tempo, «as pressões inflacionistas deverão abrandar ainda mais, considerando que o BCE deverá continuar a subir os juros e o impacto destas subidas são visíveis apenas a médio e longo prazo».
Portugal é dos países mais pobres da UE
A síntese do Fórum para a Competitividade lembra outros dados: é que, no ano passado, Portugal era o 6.º país mais pobre dos 27 Estados-membros da União Europeia. E atira: «O mais grave é a trajetória de divergência nacional, um fenómeno raro no contexto europeu, só se tendo verificado também nos casos de Chipre, Espanha e Grécia».
E este problema será para continuar como defendem os analistas contactados pelo Nascer do SOL.
Para Mário Martins é claro que «não há milagres». E explica: «Enquanto mantivermos uma ausência de estratégia económica competente, que transforme a economia nacional para produtos e serviços baseados em maior valor acrescentado e não em volume, o caminho do empobrecimento relativo é inevitável».
Por sua vez, Henrique Tomé defende que «infelizmente em Portugal a aposta no crescimento económico é muito pequena, o setor privado continua sem estímulos e as políticas adotadas dentro do país não promovem, de todo, o crescimento económico».
E defende que apesar de Portugal ter sido dos países que mais cresceu no último ano na Zona euro, «acredito que os próximos anos voltem a ser marcados por um fraco crescimento em comparação com os pares na Zona euro».