A semana parlamentar foi recheada de audições, da comissão de Economia à comissão parlamentar de inquérito (CPI) à tutela política da gestão da TAP, foram muitos os responsáveis políticos deste Governo e de outros que foram ouvidos na Assembleia da República.
Logo na segunda-feira, os trabalhos no Parlamento arrancaram com a audição de Mário Centeno, ministro das Finanças entre o final de 2015 e junho de 2020, na CPI à TAP, que teve pouco a acrescentar sobre as questões que os deputados queriam ver esclarecidas. Relativamente ao estado da TAP quando o primeiro Governo de António Costa chegou aos comandos para tomar o controlo estratégico da companhia aérea, o ex-ministro das Finanças deu a garantia que na passagem de pasta «a dimensão TAP era inexistente» na documentação que foi entregue pela sua antecessora no final de 2015, Maria Luís Albuquerque.
Centeno esclareceu que apenas lhe foi chamada a «atenção para a extrema fragilidade financeira da TAP» numa reunião ocorrida «ainda antes de ser sequer ministro».
Já sobre os fundos Airbus, questão que os deputados também quiseram aprofundar, o governador do Banco de Portugal referiu que não teve «nenhum conhecimento no momento da transição» de governos. «Só fui confrontado com a informação recentemente quando a comunicação social chamou a atenção para isso», argumentou. «Não sei muito bem o que se passou, a resposta não pode ser sim nem não, preciso de mais informação para responder», acrescentou.
Os fundos Airbus, no valor de 227 milhões de dólares, estão ligados à compra de 53 aviões pela companhia aérea, havendo a suspeita de que o seu preço tinha sido superior ao do mercado. A tese já foi contrariada por responsáveis do Executivo PSD/CDS, como o ex-ministro da Economia, António Pires de Lima. O caso está em investigação pelo Ministério Público.
Questionado também sobre a indemnização paga a David Neeleman, de 55 milhões de euros, Centeno disse não ter conhecimento, sublinhando que «nesse momento não tinha responsabilidade governativa». «Não tinha visibilidade sobre o processo», acrescentou.
Já na terça-feira, seguiu-se nova ronda de explicações, com Pedro Nuno Santos a inaugurar uma série de audições. Cinco meses após a saída do Executivo de António Costa, o ex-ministro das Infraestruturas regressou ao Parlamento, à comissão de Economia. Sobre os temas mais quentes, como a indemnização paga a Alexandra Reis, prometeu pronunciar-se na comissão de inquérito, no próximo dia 15, onde conta estar «umas dez horas». Mas também deixou por responder a questão dos 55 milhões pagos a David Neeleman para sair da TAP, em 2020.
«Estávamos a ser assessorados por um escritório de advogados. Havia uma avaliação dos riscos que nos levou a optar por uma negociação. Não pagámos zero como desejávamos, mas pagámos menos do que o privado pediu», explicou.
Relativamente aos fundos da Airbus usados pelos privados na capitalização da TAP em 2015 deixou alguns alertas: «Hoje sabemos que a TAP pediu uma auditoria cujos resultados são conhecidos. Sabemos que a capitalização foi feita com fundos da Airbus e é muito provável que essa capitalização tenha sido feita, afinal, com fundos da TAP.»
«Por que é que o vendedor de aviões dá à empresa [de Neeleman] 224 milhões?», questionou, frisando que «há uma auditoria que diz que é possível que todos (TAP, Governo do PSD e país) tenham sido enganados». Perante essa suspeita, o ex-ministro sugeriu que os contratos sejam revistos. «Se temos preocupação com a TAP e com o país, temos de garantir que haja consequências e uma renegociação dos contratos», defendeu.
A questão de como se chegou aos 55 milhões de euros que foram pagos a David Neeleman para sair da TAP voltou a ser tema durante a tarde de terça-feira na audição a João Leão. O ex-ministro das Finanças também insistiu que o valor resultou de um processo, assessorado por uma sociedade de advogados com base num «referencial de valores máximos e mínimos».
Questionado se tinha sido feito um pagamento de 11,9 milhões de euros relativos a prestações acessórias ao outro acionista privado do consórcio Atlantic Gateway, Humberto Pedrosa, João Leão respondeu que «a única verba que o Estado suportou para assegurar o controlo da TAP foram 55 milhões de euros» a David Neeleman.
Os deputados voltaram igualmente a abordar a questão dos fundos Airbus, tendo o ex-governante reiterado que não sabia dos fundos e que, a ser verdade que a operação envolveu um desconto comercial na troca da encomenda de aviões e que essa verba ficou para o acionista privado, parece haver «uma dimensão em que são lesados os interesses legítimos da TAP», tal como alegou Pedro Nuno Santos.
«Parece-me ser uma apropriação ilegítima, a ser verdade, por parte do investidor privado, de uma verba que pertence a uma empresa que não é exclusivamente dele», reforçou.
Já na quarta-feira, foi a vez de António Pires de Lima, antigo ministro da Economia, de contar a sua versão dos factos sobres os fundos Airbus.
Pires de Lima disse estar convencido que a operação não terá nada de ilegal e que o «negócio foi feito a preços de mercado». «A TAP não foi prejudicada, foi capitalizada em 226 milhões de euros», contrapôs.
Sobre o parecer pedido pela TAP que apontará para a ilegalidade da operação, o ex-ministro desvalorizou, indicando que a conclusão é sempre a mesma: a capitalização apenas seria ilegal se fosse feita com fundos que tivessem origem na própria TAP, o que só aconteceria se a transportadora estivesse a pagar a encomenda de aviões trazida por Neeleman da Airbus a um preço superior ao do mercado. Algo que, segundo os pareceres de 2015, não era o caso, mas que é agora contrariado por pareceres recentes pedidos pela própria TAP e entregues ao Governo.
Mendonça Mendes contraria Galamba
Ainda na terça-feira, a audição do secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro no Parlamento veio também levantar mais dúvidas sobre a verdade dos acontecimentos da noite de 26 de abril no Ministério das Infraestruturas.
António Mendonça Mendes confirmou o telefonema que o ministro das Infraestruturas disse ter feito, mas contrariou a versão que João Galamba deu na CPI à TAP, rejeitando que tivesse dado qualquer indicação para que os serviços de informações atuassem no caso do computador levado por Frederico Pinheiro.
Segundo Mendonça Mendes, quando lhe ligou, o ministro já estava preocupado com os documentos classificados e tinha já a «listagem» de «todas as entidades» às quais devia reportar a situação,