‘Olha a bolinha’: Como a bola de Berlim chegou a Portugal e às praias

Com creme ou sem creme são as combinações mais conhecidas. Mas as variedades têm aumentado ao longo dos anos: de chocolate, doce de morango ou até de alfarroba. É quase obrigatório o seu consumo nas praias portuguesas. Ainda que este doce não seja originário do nosso país  – como o próprio nome indica – e…

Muito tradicionais em Portugal, principalmente nesta altura do verão, as bolas de Berlim, como o próprio nome indica, são originárias da Alemanha. A Portugal, chegaram só por altura da Segunda Guerra Mundial e há muitos anos que, para muitos portugueses, não há praia sem a típica bola de Berlim que, no fundo, já adotámos como nossa.

Foi por mera coincidência que este doce tão conhecido agora em terras lusas chegou a Portugal durante a Segunda Guerra Mundial. Portugal vivia por essa altura sob a mão autoritária de António Oliveira Salazar que decidiu manter a sua neutralidade e, assim, Lisboa e Porto recebiam milhares de refugiados que tentavam chegar à América. Ao chegarem a Portugal, muitas dessas famílias ficavam meses à espera de documentos necessários para embarcar nos navios que lhes dariam a entrada para outra vida.

Mas o tempo em que os judeus estiveram em Portugal, muitos começaram a trabalhar para pequenos empresários portugueses e passaram a surgir nas pastelarias vários doces típicos alemães, como é o caso da bola de Berlim.

O doce original chama-se Berliner ou, no seu nome completo, Berliner Pfannkuchen – conhecida dentro de Berlim, de onde é originário, apenas como Pfannkuchen. E não deu só origem à bola de Berlim portuguesa como ao donut americano. Mas isso fica para outro texto.

Com o passar dos anos, os pasteleiros portugueses desenvolveram a sua própria receita – ainda que muito parecida com a original – e passaram a rechear o bolo com doce de ovos ou mesmo sem creme, em substituição dos originais creme ou marmelada.

A historiadora Irene Flunser Pimentel, que escreveu o livro Judeus em Portugal durante a II Guerra Mundial, abordou este tema e diz que os principais responsáveis pelo doce em Portugal foi uma família que viu nele uma fonte de rendimento.

«Os refugiados judeus ou outros alemães ou austríacos não podiam trabalhar em Portugal e começaram a exercer trabalhos mais ou menos clandestinos: venda ambulante de gravatas, confeção de comida para outros refugiados e também de bolos que vendiam a alemães, não necessariamente refugiados, que viviam em Portugal», chegou a confessar a historiadora.

A verdade é que a moda pegou e atualmente as bolas de Berlim são o terceiro bolo mais consumido em Portugal com uma média de cerca de 250 mil por dia.

O sucesso das praias

Não há uma forma científica que explique o porquê de as bolas de Berlim serem tão adoradas nas praias mas diz-se que é pela combinação do doce do bolo com o salgado do mar.

Antes de chegarem à praia, começaram a ser vendidas na rua. O motivo era fácil: o seu tamanho e a forma redonda eram ideais para agarrar com a mão, o que a torna um doce fácil de ser consumido em qualquer lugar. 

E, chegando à praia, o sucesso foi imediato. Parece até já ser uma tradição portuguesa todos os verões ouvirmos: «Olha a boliiinha», «Olha a bolinha de Berlim fresquinha», «Há com creme e sem creme». As variações do chavão diferem de vendedor para vendedor mas a ideia é muito esta: anunciar que estão por perto as tão adoradas bolas que fazem as delícias de miúdos e graúdos.

E se inicialmente as conhecíamos apenas com creme e sem creme, nos dias de hoje as variações são muitas. Existem as de chocolate, doce de morango, chocolate branco e até de alfarroba, que lhe dão um aspeto mais escuro. É basicamente à escolha do freguês. Este ano, os preços rondam os dois euros por bola.

A Deco Proteste lançou um artigo sobre o tão aclamado doce onde explica que pode ser vendido na praia mas com algumas regras. Qualquer pessoa pode vender bolas de Berlim na praia mas os vendedores ambulantes são obrigados a ter um título de exercício da atividade. Além disso, os produtos comercializados devem ser provenientes de estabelecimentos de fabrico devidamente licenciados. «Esses estabelecimentos, por sua vez, devem cumprir todos os requisitos legais no que diz respeito à produção, transformação e distribuição dos produtos alimentares», explica a Deco Proteste.

Mas há mais: as condições de transporte têm de ser adequadas para o efeito, ou seja, os bolos devem estar protegidos de qualquer contaminação. Mas, «ao contrário do que se possa pensar, não é obrigatório os bolos serem transportados na praia em caixas refrigeradas. Estes produtos são geralmente comercializados e consumidos num curto espaço de tempo», o que justifica também o sucesso nas praias. «O que deve ser considerado pelo vendedor é quanto tempo circulará pela praia e, se nesse período, consegue vender os bolos sem perderem a frescura». Recorde-se que a fiscalização do cumprimento das regras é feita pela Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE).