Elétricos. Riscos compensam a menor pegada ambiental?

Há vários casos de navios incendiados que carregavam carros elétricos, mas não foi provada a causa. Também a exploração do lítio usado para as baterias é pouco amiga do ambiente. 

Os carros elétricos são mais perigosos e poluentes do que os carros de combustão? As dúvidas continuam ainda a ser muitas, mas a suspeita de que um carro elétrico terá provocado um incêndio que durou dias num navio cargueiro próximo da costa da Holanda com quase quatro mil veículos a bordo, dos quais 500 eram elétricos, não foi confirmada. Este caso junta-se ao do navio Felicity Ace que há um ano e meio se afundou ao largo da ilha do Faial, no arquipélago dos Açores, quando transportava cerca de quatro mil automóveis do grupo Volkswagen, entre os quais 1100 Porsches e 189 Bentleys.

Na altura, o capitão do Porto da Horta afirmou que a maioria dos carros transportados eram elétricos, pelo que as baterias continuavam a arder até o navio se afundar.

No entanto, de acordo com um estudo da AutoInsuranceEZ, o risco de incêndio dos automóveis 100% elétricos não é superior ao dos carros convencionais – bem pelo contrário. O mesmo não acontece, no entanto, com os híbridos. Os dados, referentes ao ano de 2021, examinam a frequência de incêndios provocados por diversas causas, incluindo colisões. Em cada 100 mil automóveis, registaram-se 3475 ocorrências nos veículos híbridos, 1530 nos veículos com motor de combustão e 25 nos 100% elétricos. É certo que há em menos casos, mas quando ocorrem os incêndios também são mais difíceis de extinguir.

Perante estes estudos, o Automóvel Club de Portugal (ACP) afirma que “o risco de incêndio é cada vez mais diminuto, devido aos esforços empreendidos nos últimos anos para o reforço da segurança dos carros elétricos”, acrescentando que “a construção das baterias prevê a proteção da sua integridade em casos de choque ou embate”.

 

E o ambiente?

Se, por um lado, a componente ambiental é mais acautelada nos carros elétricos, por outro lado, a bateria que usam – o lítio – como não está a ser reciclada está a verdadeiras dor de cabeça aos ambientalistas. Aliás, a questão das baterias tem sido apontada com uma das desvantagens destes carros, já que a reciclagem é difícil e dispendiosa. A pensar nisso, a União Europeia está a estudar como pode garantir uma alta taxa de reciclagem de baterias, mas também como incorporar materiais reciclados nas novas baterias que venham a ser produzidas, o que poderá ajudar a minimizar o problema.

Outro ponto negativo diz respeito à exploração do lítio. Um estudo publicado na revista científica Environmental Earth Sciences concluiu que a atividade de extração do lítio tem impacto na qualidade no ar, uma vez que, na investigação, foram identificadas partículas nocivas, como dióxido de nitrogénio. A exploração do minério é, normalmente, realizada a céu aberto, o que leva a uma forte intrusão na paisagem natural. Além disso, deteriora o solo e destrói ecossistemas, devido às escavações feitas, o que causa um forte impacto na conservação da fauna e da flora das regiões exploradas.

Entre elétricos e carros a combustão não há uma solução milagrosa, como admite a associação ambientalista Zero. “Se tivéssemos de escolher entre carros elétricos – e referimo-nos a 100% elétricos a bateria – e carros a combustão (a gasóleo ou gasolina), escolheríamos os elétricos, mas com um asterisco: num mundo ideal, não usaríamos nenhum. O melhor seria mesmo andarmos a pé, de bicicleta ou de transporte público, sobretudo de comboio, porque sim, os carros elétricos também poluem”.

 

Preços altos

Também os preços praticados nem sempre ajudam à sua compra, apesar dos incentivos fiscais. Este ano, o Governo disponibilizou cerca de 10 milhões de euros para a sua aquisição no total. Na prática, cada condutor pode receber uma ajuda de 4 mil euros na compra de um carro novo 100% elétrico. Além disso, também há benefícios nos impostos: os donos destes carros não têm de pagar o Imposto sobre Veículos nem o Imposto Único de Circulação.

Ainda assim, de acordo com um estudo publicado pela Zero, os automóveis 100% elétricos irão ser mais baratos do que os convencionais em 2030. E refere que a queda no preço das baterias e a mudança para plataformas de fabrico dedicadas a veículos elétricos por parte das construtoras permitirão “grandes reduções” nos custos de produção.

De acordo com o documento, os ligeiros de mercadorias mais pequenos alcançarão a paridade de preço mais cedo, em 2025, e os ligeiros de passageiros em 2027, com os automóveis familiares de gama média e alta e os SUVs a atingir a paridade em 2026. Em 2030, os carros elétricos serão mesmo no preço base 18% mais baratos do que os com motor de combustão. “As conclusões a que o estudo chegou são válidas em diversas circunstâncias e partindo de várias premissas, e por isso é seguro afirmar que dentro de entre quatro a seis anos os automóveis elétricos serão a opção mais barata para os condutores, tornando acessível a transição para a mobilidade elétrica”, refere a associação. 

A Zero diz também que os resultados mostram que com um pacote de políticas públicas apropriado, os automóveis a combustão podem ser totalmente retirados das vendas em todos os países entre 2030 e 2035. Mas deixa um alerta: só “um incremento atempado na produção de automóveis elétricos permitirá consubstanciar estas projeções”. E defende que além da via da regulação há toda uma panóplia de políticas públicas de estímulo aos automóveis elétricos que serão necessárias, “como os incentivos fiscais criativos, a instalação de uma rede de carregamento ampla e densa, a limitação à circulação de automóveis a combustão no centro das cidades, e as metas nacionais”.