Substantivo vs. verbo

Será mais importante ser voluntário de uma organização por pôr uma t-shirt uma vez por ano, ou comprar dois pães extra todos os dias e oferecer a viúvas durante o caminho para o trabalho?

Por Pedro Ramos

Nova Iorque, agosto 2023

 

[Perguntou Jesus:] Mas que vos parece? Um homem tinha dois filhos e, dirigindo-se ao primeiro, disse: Filho, vai trabalhar hoje na minha vinha. Ele, porém, respondendo, disse: Não quero. Mas, depois, arrependendo-se, foi. E, dirigindo-se ao segundo, falou-lhe de igual modo; e, respondendo ele, disse: Eu vou, senhor; e não foi. Qual dos dois fez a vontade do pai? Disseram-lhe eles: O primeiro.

Mateus 21:28-31

 

Queridas Filhas,

 

Na Somar Capital recebo muitos CVs de candidatos cheios de substantivos: presidente, líder de equipa, capitão, desportista, voluntário, filantropo… Atualmente nos media social gostamos muito de partilhar as nossas virtudes e identidade através de substantivos: ativista, influencer, pai, gestor, empresário, podcaster… Trata-se de uma formal fácil de pôr maquiagem na nossa identidade que nos engana a nós próprios. A verdade, aquilo que verdadeiramente somos não são os substantivos, mas o que de facto fazemos semana a semana e o que entregamos ano após ano. 

Nos CVs, impressiona-me menos os substantivos do que os verbos. Será mais importante alguém ter sido estudante de Harvard, ou, tendo sido recusado por Harvard ter ido para outra Universidade e ter sido o melhor aluno da história do professor e investidor profissional Ben Graham (Warren Buffett)?

 

Será mais importante se declarar como ativista do ambiente e mostrar vários selfies em demonstrações publicas, ou ter voluntariado para trabalhar com a junta de freguesia para melhorar a coleta de lixos e dessa forma melhorar significativamente a limpeza da vizinhança?

Será mais importante ser Pai de vários filhos de várias mulheres, que quase nunca estão com ele, ou ser Pai adotivo de uma criança e acompanhar o crescimento desta, encorajar a procura dos seus sonhos e a ajudar a levantar quando a vida traz desgostos?

 

Será mais importante ser capitão de equipa, mas jogar e preocupar-se só com si próprio, ou não ter título, mas ser o primeiro a chegar ao treino, apoiar os colegas no seu crescimento profissional e pessoal, assumir responsabilidades e assumir servir a equipa com exemplo?

Será mais importante ser embaixador, ser tratado com pompa e circunstância e gabar-se das pessoas que se conhece, ou ser cônsul, apoiar todas as iniciativas dos emigrantes, criar lassos de cooperação entre países e encontrar formas de servir os cidadãos a manterem a ligação com Portugal?

 

Será mais importante ter o título de voluntário de uma organização prestigiada por pôr uma t-shirt uma vez por ano e pedir alimentos durante algumas horas, ou comprar dois pães extra todos os dias e oferecer a viúvas durante o caminho para o trabalho?

 

Será mais importante dizer-se amigo e aparecer sempre para as celebrações, ou ser apenas conhecido, mas o primeiro a aparecer quando alguém for condenado a prisão ou passar por outras crises pessoais?

Se vivermos 100 anos, teremos 36.500 dias para mostrar o que somos. Cada dia que passa não volta. Os títulos fazem-nos sentir bem, e ficam muito bem junto das nossas melhores fotografias nos media sociais. Mas quem somos verdadeiramente? Isso não está escrito, mas vê-se nas ações e escolhas de cada dia.