“O que fizemos com o mundo?”

por Nélson Mateus e Alice Vieira

Querida avó,
Hoje começa um novo mês. Para muitos é o regresso ao trabalho depois de umas merecidas férias.
 
Quem não tem tido férias, nem mãos a medir, são os Bombeiros.
 
Agosto foi (mais) um mês em que existiram imensos incêndios de Norte a Sul de Portugal. A maioria dos fogos é de origem criminosa ou devido a queimadas. A sério? Vemos incêndios por toda a parte, Canada, Tenerife, Grécia, Havaí… São milhares de hectares em floresta que desaparecem diariamente. Aldeias que ficam reduzidas a cinzas, vidas que desaparecem… Como diria a minha avó: «É o fim do mundo!».
 
A minha avó também dizia muitas vezes «A mil chegarás; de dois mil não passarás». Efetivamente, os mais antigos previam o “fim do mundo” com a viragem do século… mas já chegámos a 2023.
 
A minha avó nunca foi dada a profecias nem a cenários apocalípticos!
 
No entanto, contava que os avós delas diziam que: «O outro mundo tinha acabado com o dilúvio, este iria acabar em chamas».
 
Tudo isto faz-me recuar, a 1995, à musica “Earth Song” (Canção da Terra), de Michael Jackson, que, como te deves recordar, fala dos problemas ambientais, causados “por nós” e negligenciados pelos governos.
 
«Você já parou para pensar/ Em todas as crianças mortas pela guerra?/ Você já parou para pensar/ Na Terra chorando, nessas praias de lágrimas?/ Agora já não sei mais onde estamos/ Eu só sei que fomos longe demais!».
 
Penso que já não há como remediar o irremediável!
 
O videoclipe, gravado há 28 anos, termina com um apelo à Paz entre a Rússia a Ucrânia. Incrível como a raça humana tende a cometer os mesmos erros inúmeras vezes.
 
Muitas vezes, quando ligo a televisão, pergunto se os meus antepassados “do tempo nos dinossauros” não seriam visionários. Espero que não!
 
Falando de coisas boas, espero que gostes da tua exposição no Palácio Baldaya, em Benfica. Até ao final deste mês temos muito para fazer. 
 
Bjs
 
 
Querido neto,
Não imaginas como estou feliz por a minha exposição estar no Palácio Baldaya. Antes de vir viver para a Ericeira estava sempre lá caída. Vai ser bom lá voltar ao longo deste mês.
 
Por falar em Ericeira, como sabes, venho para aqui desde criança. É e foi sempre um caso de paixão e, como todos sabem, as paixões não se discutem e muitas vezes nem se entendem. As poucas vezes em que deixávamos a Ericeira era – imagine-se! – no Verão. Como vivíamos sempre junto à praia, quando chegava Agosto fazíamos a trouxa, enfiávamo-nos no carro e íamos para Aveiro.
 
E lembro-me que levávamos imenso tempo até lá chegar! Como os meus filhos eram pequenos, às vezes até fazíamos a viagem em dois dias! É claro que Aveiro também tinha lindas praias mas nós, muitas vezes, nem lá púnhamos os pés. Os miúdos ficavam com uns amigos nossos e nós íamos para a “Bruxa” (um grande café), ou à Fábrica da Vista Alegre comprar por uns míseros tostões as peças com algum (pequeníssimo) defeito que a fábrica punha à venda numas escadas perto da estrada, falamos disso recentemente.
 
E depois voltávamos para a Ericeira. Ou seja: para o frio, para os edredons na cama, para o sol a nascer só lá para depois das quatro da tarde.
 
Recentemente confesso que me ri a pensar no que diriam os meus amigos desses tempos se me vissem chegar aqui a casa… com uma enorme ventoinha!!!
 
Pois é verdade. Como muito bem sabem os que cá vivem tem feito um calor que não se aguenta… De madrugada venho à varanda e não corre uma aragem. Nem o mais leve lençol se aguenta na cama, dormimos com as janelas todas abertas.
 
As mudanças climatéricas estão a dar cabo disto tudo.
 
Não sei se é o “fim do mundo” que referes ou não, mas que está tudo muito diferente está!
 
A gente gosta deste calorzinho (da Ericeira) e ri-se.
 
Mas vamos amargá-lo, ai isso vamos.
 
Bjs