Na próxima semana 60 mil militantes do Partido Socialista decidem quem vai ser o sucessor de António Costa. São três os candidatos que se apresentam a votos, Pedro Nuno Santos, José Luís Carneiro e Daniel Adrião, mas dos três, só dois têm possibilidade real de virem a vencer a corrida: Pedro Nuno Santos ou José Luís Carneiro. Desde o início da campanha interna que vários meios de comunicação social tentaram fazer um debate entre os dois, mas Pedro Nuno Santos recusou. Na ausência de debate, fizemos as mesmas dez perguntas aos dois candidatos para que os leitores possam verificar o que mais aproxima e distancia Pedro Nuno Santos e José Luís Carneiro. Curiosamente, ou talvez não, os dois coincidem numa resposta: de todos os ex-PM socialistas, Mário Soares é a referência dos dois.
- Mário Soares, António Guterres, José Sócrates e António Costa. Com qual dos ex-primeiros-ministros do PS mais se identifica?
Pedro Nuno Santos: Eu assumo todo o legado do Partido Socialista dos últimos 50 anos, seja no Governo, seja na oposição. As personalidades que refere fazem parte da história do país e do Partido Socialista, e deixaram a sua marca em momentos diferentes, perante exigências e desafios diferentes. No entanto, a personalidade socialista que mais me marcou foi Mário Soares. Foi ele o primeiro político que admirei, o que mais me influenciou e com quem mais aprendi.
José Luís Carneiro: Cada um deles e no tempo em que cada um exerceu funções, deixou marcas muito importantes nas políticas públicas do nosso País. Mário Soares legou-nos a liberdade, a democracia e a Europa. Todos fazem parte de um património de que somos herdeiros no PS. É nesse legado que temos o dever de alicerçar uma visão de futuro. De serviço ao País e à sociedade portuguesa.
- Saúde, educação, justiça, segurança social, demografia. Em que área, ou áreas considera útil fazer um acordo com o PSD?
Pedro Nuno Santos: As áreas em que entendo fazer mais sentido dialogar, e mesmo fazer acordos, com o PSD dizem respeito às áreas tradicionalmente ligadas às questões de soberania e política externa (justiça, segurança interna, defesa, negócio estrangeiros).
José Luís Carneiro: Defendo o diálogo político com os partidos democráticos sobre as políticas sociais, mas também sobre as funções de Soberania. Por vezes, tem sido mais fácil consensualizar com os partidos à nossa esquerda o reforço das áreas sociais e com o centro político e social as políticas de Soberania. Mas, quanto mais ampla for a convergência, mais duradouras e estáveis as reformas.
- Considera necessário/urgente regular a atividade de lobbying em Portugal?
Pedro Nuno Santos: A regulação do lobbying está nos programas eleitorais do PS desde 2015 e já deu origem a dois processos legislativos que ficaram pendentes. Contudo, temos sabido melhorar e aprimorar a nossa resposta ao longo dos anos – o foco tem de ser colocado no registo de contactos e na transparência da chamada pegada legislativa, e temos de assegurar que ao disciplinar a atividade não estamos a normalizar práticas negativas para a decisão pública (o recente escândalo nesta matéria no Parlamento Europeu mostra que há muito para aprender com outras experiências, evitando os mesmos erros). O essencial é mesmo garantir transparência e possibilidade de escrutínio.
José Luís Carneiro: Sim. Está na nossa moção de estratégia.
- O que fazer com a TAP? Privatizar? Vender apenas uma minoria da empresa? Manter na posse do Estado?
Pedro Nuno Santos: Defendi sempre, e continuo a defender, que a TAP não pode ficar sozinha no mercado global da aviação. Nesse sentido defendo, como já defendi no passado, que o capital da TAP seja aberto a um grupo de aviação.
José Luís Carneiro: Cumprir o que está na decisão do governo. Privatizar, mas, defendendo o hub de Lisboa. Como fator de posicionamento estratégico intercontinental, nomeadamente na ligação com a nossa diáspora, e de coesão territorial nacional.
- Que medidas defende para aumentar a transparência nos processos de decisão política?
Pedro Nuno Santos: As reformas de 2019 e 2021 criaram um quadro legislativo de muito melhor qualidade do que a legislação dispersa anterior. Não devemos ceder à tentação de estar sempre a alterar a lei, sobretudo à luz de casos concretos – seria quase sempre uma cedência ao populismo. Claro que isso não nos impede de fazer o balanço de 4 anos de vigência da legislação mais recente e de introduzir melhorias.
José Luís Carneiro: Temos propostas muito concretas. Desde logo a regulamentação do exercício de atividades de representação de interesses junto de entidades de natureza pública (lobbying), o registo da «pegada legislativa», que identifica a proveniência dos anteprojetos legislativos, bem como todas as interações entre os órgãos com poder legislativo e entidades terceiras e a clarificação dos impedimentos e incompatibilidades dos Deputados à Assembleia da República, designadamente no que concerne ao exercício do mandato em acumulação com o exercício de profissões liberais no quadro de sociedades que desenvolvam relações contratuais com o Estado e demais entes públicos ou que litiguem contra estes.
- Qual a sua prioridade política caso chegue a primeiro-ministro?
Pedro Nuno Santos: Promover a mudança do perfil de especialização da economia portuguesa e reformar, para proteger e aprofundar, o Estado Social nas suas diversas dimensões.
José Luís Carneiro: Garantir previsibilidade, procurar a estabilidade, confirmar e relançar a confiança dos cidadãos nas instituições.
- Acha necessário mexer nas políticas de imigração? Em que sentido?
Pedro Nuno Santos: Essa área das políticas públicas foi alvo de alterações recentes. Não podemos estar sempre a mexer na legislação. Passado algum tempo, é preciso avaliar com rigor o impacto das alterações introduzidas e depois tirar as devidas conclusões. Mais importante é mesmo criar as condições para que a imigração para Portugal seja acompanhada pelo necessário investimento nos serviços públicos e na habitação.
José Luís Carneiro: Temos de cumprir o Pacto das Migrações que o Estado português subscreveu e que estabelece a defesa de Migrações reguladas e seguras na origem, no trânsito e no destino.
- Se for primeiro-ministro defende uma alteração na atual proposta de reposição de salários
aos professores?
Pedro Nuno Santos: Já tive a oportunidade de dizer várias vezes que entendo ser necessário recuperar gradualmente o tempo de serviço dos professores que esteve congelado. É de elementar justiça. Primeiro, o Estado português não pode querer impor ao setor privado o cumprimento dos contratos com os trabalhadores e depois não fazer o mesmo com os seus; segundo, é fundamental valorizar e dignificar a profissão docente, e isso também passa pelo reconhecimento integral dos direitos dos professores.
José Luís Carneiro: Devemos manter a equidade entre as carreiras públicas. Assim, caso se verifique que o modelo utilizado para o descongelamento das carreiras dos professores os colocou numa situação de desvantagem face às demais carreiras públicas, estamos disponíveis para corrigir essas distorções.
- Se for primeiro-ministro o que defende em relação ao aumento de salários de médicos e outros profissionais de saúde?
Pedro Nuno Santos: Só teremos um SNS capaz de responder às necessidades dos portugueses se for capaz de recrutar e reter profissionais de saúde, desde logo os médicos. Para isso é fundamental fechar um acordo, o quanto antes, que melhore a grelha salarial, valorize as carreiras e incentive a investigação.
José Luís Carneiro: Celebrarei com os agentes e profissionais do setor um Compromisso Plurianual para a Saúde, que conterá medidas de dignificação profissional, designadamente de valorização da investigação, da formação e da transmissão de conhecimentos, mas também uma programação do investimento em infraestruturas e equipamentos.
- Admite governar com o apoio ou em coligação com o PCP e o BE?
Pedro Nuno Santos: O objetivo é vencer as eleições legislativas, obtendo o melhor resultado possível para o Partido Socialista. Só depois dos eleitores votarem e de ficarmos a conhecer a composição da Assembleia da República é que faz sentido começar a pensar em cenários possíveis. Até lá trabalhamos para um único cenário: a vitória do PS no dia 10 de março.
José Luís Carneiro: Bater-nos-emos por uma maioria clara do PS. Outros cenários serão avaliados depois das eleições. Mas não abdicamos da posição do PS no espetro político português e estaremos disponíveis para o diálogo com todas as forças democráticas, nas diversas matérias.