Mercado de trabalho em revolução

Apesar dos trabalhadores reconhecerem que a inteligência artificial pode melhorar o trabalho, receiam que possa ameaçar os seus empregos e salários. Dados referentes a Portugal são mais pessimistas face à média da OCDE.

Cerca de 30% dos postos de trabalho em Portugal poderão ser postos em causa devido à inteligência artificial (IA). Os dados são da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) que foram divulgados no seu último relatório sobre o emprego. Um número que fica acima dos 27% registado no conjunto dos países.

No entanto, nem todos estão no mesmo patamar. Se, por um lado, o Luxemburgo, o Reino Unido e a Suécia apresentam as percentagens mais baixas de emprego nas profissões com maior risco, a Hungria, a Eslováquia e a República Checa apresentam as percentagens mais elevadas.

De acordo com os mesmos dados, três em cada cinco trabalhadores estão preocupados em perder o seu trabalho para a inteligência artificial nos próximos dez anos, enquanto dois em cada cinco trabalhadores revelam preocupações de que os seus salários possam baixar na próxima década face ao avanço da tecnologia.

O diretor do departamento do Emprego, Trabalho e Assuntos Sociais da OCDE, Stefano Scarpetta, já veio admitir que as consequências económicas e sociais do ritmo de desenvolvimento da IA são incertas ao contrário de outras mudanças, referindo que a robotização  “tem o potencial de afetar todas as indústrias e profissões”.

Mas nem tudo são más notícias. Mais de 50% dos trabalhadores afirmou que a inteligência artificial trouxe um impacto positivo na qualidade dos seus empregos. Ainda assim, a OCDE deixa um aviso: “O impacto da inteligência artificial nos níveis de emprego tem sido limitado até à data, e, atualmente, não está associada a quaisquer alterações importantes nos salários, positivas ou negativas”. Não se sabe é o futuro.

E as empresas?

Se do lado dos trabalhadores há muitas reticências e incertezas, do lado das empresas esta aposta tem vindo a dar cartas. Aliás, já em 2021, Portugal foi o segundo país da União Europeia onde as empresas mais utilizaram a inteligência artificial para apoiar o seu trabalho (17,3%) . A liderar o ranking está a Dinamarca com 24%, de acordo com os últimos dados do Eurostat.

Valores que estão bem acima da média dos restantes Estados-membros, cujo peso ronda os 8%. Para trás ficou a Roménia, onde a utilização não chega sequer aos 2%, e a Grécia e o Chipre com 2,6%.

De acordo com o gabinete estatístico, a inteligência artificial “dá às máquinas e sistemas a capacidade de aprender e tomar decisões com algum grau de autonomia para atingir objetivos específicos”, destacando ainda o facto de esta nova funcionalidade estar numa fase de acelerado desenvolvimento.

Uma vantagem que é apontada por um estudo da KPMG que questionou os CEO portugueses em relação ao uso da inteligência artificial. Cerca de 84% dos inquiridos reconhecem que não é uma prioridade de investimento para a sua organização, quando a nível global esse valor atinge os 69%.

Já para aqueles que apostaram nesta nova tecnologia, 82% esperam começar a rentabilizar esse investimento num prazo superior a cinco anos (enquanto a nível global 24% esperam fazê-lo até três anos e 52% até cinco anos). “Apesar da dinâmica que pretendem criar na IA, os líderes empresariais reconhecem que as tecnologias emergentes trazem desafios que devem ser abordados”, revela o documento.

Entre eles, 48% dos CEOs portugueses destacam a segurança e o compliance (conjunto de regras) mais 14% do que a percentagem a nível global (34%) – e 78% destacam os aspetos éticos (57% global). O custo de implementação desta tecnologia (38%), a falta de competências adequadas (50%) e a falta de regulamentação (54%) constituem também desafios. “À medida que o escrutínio e a regulamentação em torno da lA aumentam, as estratégias terão de ser construídas em torno da criação de confiança. Dadas as oportunidades e os riscos é urgente que os CEOs liderem a sua implementação, através de quadros que respondam aos desafios éticos colocados por esta tecnologia e garantam a segurança e o compliance”.

Impulsionar economia

Do lado económico, os números estão à vista. O uso da inteligência artificial (IA) generativa – capaz de gerar texto, imagens e vídeo – “poderá aumentar a dimensão da economia portuguesa em 15 mil milhões de euros”, o equivalente a 6% do Produto Interno Bruto (PIB) ou a 8% do Valor Acrescentado Bruto,  revelou um estudo da Public First encomendado pela Google. E permite poupar, em média, mais de 80 horas por ano a cada trabalhador, o equivalente a duas semanas de trabalho.

“Ao ajudar todos em Portugal a concentrarem-se em tarefas mais produtivas e criativas, a IA pode acelerar o crescimento económico e, por sua vez, trazer progressos nos desafios sociais”, diz o documento. E, ao mesmo tempo, poderá eliminar tarefas monótonas no trabalho ou ajudar a fazer escolhas mais sustentáveis em termos ambientais.

A implementação da IA nas empresas poderá também ser importante “para ajudar na monitorização preventiva dos riscos e na melhoria das competências dos trabalhadores em matéria de cibersegurança” e revela que Portugal poderia mitigar 690 milhões de euros de riscos com a cibersegurança.

E há setores que poderão ser os maiores beneficiários e que ultrapassa a dimensão nacional. Segundo um relatório da McKinsey, a adoção de tecnologias de inteligência artificial pode impulsionar os lucros dos bancos em 340 mil milhões de dólares (mais de 316 mil euros) por ano. Em causa está o aumento da produtividade, o que poderá resultar num aumento de 9% a 15% nos lucros operacionais.