O país de bananas

A Europa já fala em Mario Draghi, mas, por cá, o ex-presidente do BCE só terá hipótese se o nosso António Costa não quiser o lugar que Charles Michel se apressou a vagar para o ex-líder do PS. Como se a Europa fosse uma união de ‘repúblicas das bananas’.

O Finantial Times noticiou esta semana que, na sequência do anúncio de Charles Michel da candidatura a um lugar de eurodeputado nas próximas eleições europeias, e consequente saída antecipada da presidência do Conselho Europeu, o nome do antigo presidente do Banco Central Europeu e ex-primeiro-ministro italiano Mario Draghi é apontado ao cargo por responsáveis políticos e diplomatas de vários Estados-membros da UE.
Esta informação do Finantial Times está longe de ser um dado adquirido ou facto consumado.

Aliás, se os jornalistas do Finantial Times tivessem estado por Lisboa e pelo Parque das Nações no fim de semana passado, teriam verificado que entre os responsáveis políticos portugueses, que fazem mexer os meios diplomáticos e mediáticos , o nome de Draghi não terá qualquer hipótese ao lado do de António Costa, ex-líder do PS e ainda primeiro-ministro em gestão.
No Congresso em que Pedro Nuno Santos foi consagrado como novo secretário-geral dos socialistas, Costa deixou claro que está aí para as curvas – muito mais até do que o seu sucessor gostaria – e a opinião largamente dominante é a de que o ainda chefe do Governo português terá agora uma distinta carreira internacional, sendo o mais do que provável sucessor de Charles Michel na presidência do Conselho Europeu.

Para os socialistas, como se viu ao longo das sucessivas intervenções na FIL – a começar pela do próprio, quando disse e repetiu que conseguiram derrubá-lo mas não derrotá-lo –, António Costa e o PS foram vítimas de mais uma ‘cabala’ montada pelo Ministério Público, desta vez em conluio com o Presidente da República, a quem atribuem a responsabilidade pela atual crise política no país.

Tanto assim que reina a confiança numa vitória do PS de Pedro Nuno Santos já nas eleições de 10 de março.
Como se nada se tivesse passado nos últimos dois anos e como se a governação socialista liderada por António Costa ao longo dos últimos oito tivesse transformado o país num mar de rosas.

Não, ali mesmo ao lado, na Gare do Oriente, não há sem abrigo a fugirem do frio e a precisarem de assistência; não, as urgências dos hospitais não estão em rutura e não continua a haver 1,7 milhões de portugueses sem médico de família; não, não há dezenas de milhares de alunos sem professores a todas as disciplinas e os resultados do PISA não são preocupantes, antes pelo contrário, o ainda primeiro-ministro vangloria-se de ter baixado a taxa de abandono escolar (abandonar para quê, quando o facilitismo e os furos são tantos?); não, os Tribunais não andam pelas ruas da amargura com greves sem fim e falta de pessoal e de meios… embora aí, sim, Costa e o PS reconhecem que a Justiça tem problemas e é urgente intervir (percebe-se bem! sobretudo para quem acha normal enviar a ‘lei malandra’ para Belém dois dias depois de ter recebido um mandado de busca na Residência Oficial de S. Bento); não, a imigração não está descontrolada e as forças policiais e de segurança não estão a seguir o exemplo de professores, técnicos e pessoal auxiliar da Educação, e dos profissionais da Saúde e dos agentes da Justiça???…

E por aí fora. Está tudo bem. E cá está o PS para continuar a fazer melhor. Enfim…
Afinal, António Costa e o PS tinham condições para continuar a governar?
A 7 de novembro, Costa demitiu-se por considerar não ter condições para o exercício do cargo de primeiro-ministro nem para continuar secretário-geral do PS, na sequência de buscas que encontraram milhares de euros em notas escondidas na Residência Oficial de S. Bento.
Se achava que Mário Centeno podia substituí-lo e evitar uma crise política, por que não continuou então secretário-geral do PS?
Aliás, só teria legitimidade para propor aquela solução, se continuasse secretário-geral do PS.
E o Governo, óbvia e naturalmente, caiu.

Os casos de Justiça envolvendo governantes socialistas – uns já constituídos arguidos, outros ainda não – sucederam-se de forma vertiginosa nestes oito anos de governação socialista e particularmente nos últimos dois anos, envolvendo o núcleo mais próximo do próprio PM. Não havia, de facto, condições para esta maioria socialista continuar no poder. Sobretudo, depois de se terem confirmado as suspeitas sobre o ministro João Galamba, que António Costa, contra tudo e contra todos (incluindo a opinião dominante no PS), se recusou a deixar cair, apenas e só para contrariar o Presidente da República.

O PS precisa de uma reflexão profunda, de se reconstruir e depurar, de uma ‘cura’ dos vícios e defeitos do poder.

Como a cegueira e arrogância ou o sentimento de impunidade.
Só António Costa e seus indefetíveis seguidores podem continuar a achar que, não tendo condições para continuar primeiro-ministro, mantém-nas intactas para o exercício de um cargo internacional e de primeiro plano na União Europeia.
Não é possível.

A ‘tese da cabala” pode fazer caminho em repúblicas das bananas com uma máquina de informação e contrainformação bem oleada por anos de poder, mas esbarra nas malhas mais finas da Europa.

Ou acaso os responsáveis europeus acham que Portugal é mesmo um país de bananas em que António Costa é a exceção?

O Presidente Marcelo já desfez a tese da ‘cabala’ e da ingenuidade do primeiro-ministro demitido com uma Nota da Presidência sem precedentes e que não deixa margem para qualquer dúvida.
Mas só leu quem a quis ler.

António Costa passou-lhe ao lado, o novo líder do PS também e a Oposição, em peso, idem.
Anda tudo mesmo entretido neste país de bananas.
E quando assim é…