Os preços das casas, tanto para compra como para arrendamento, têm vindo a fazer soar alarmes. A oferta é pouca e a que existe é para muitos a valores proibitivos. E para quem já tem deparou-se com prestações mais elevadas face ao aumento das taxas de juro – apesar de o Banco Central Europeu ter dado tréguas nos últimos meses – ou com subidas das rendas, já que no início do ano, os inquilinos não beneficiaram da norma travão de 2%, tal como aconteceu em 2023, e foram sujeitos à subida de 6,94%, o valor mais alto desde 1994. Ainda assim, o aumento foi parcialmente atenuada pelo reforço do apoio aos inquilinos e da parcela das rendas que pode reduzir na declaração de IRS.
As incertezas em relação ao futuro ainda são muitas. Os especialistas contactados pelo i admitem que os preços vão continuar altos, apesar de reconhecerem que não irão sofrer tantas alterações como em anos anteriores. A “culpa” deve-se à fraca oferta que não responde às necessidades da procura. E do lado da procura do crédito à habitação, as notícias são mais cautelosas. Os últimos dados divulgados pelo Banco de Portugal (BdP) apontam para uma nova quebra na procura da parte das famílias no primeiro trimestre de 2024. “O nível geral das taxas de juro e, em menor grau, a confiança dos consumidores e as perspetivas para o mercado da habitação contribuíram para reduzir a procura no segmento da habitação, que foi ligeiramente atenuada pelo aumento das necessidades de refinanciamento e renegociação da dívida”, disse a entidade liderada por Mário Centeno.
Quanto à oferta, o BdP diz que não houve alterações nos critérios de concessão de crédito para a compra de casa – e a expectativa é que assim continue. Já no que diz respeito às condições de crédito, houve mudanças no final de 2023: registou-se uma “ligeira diminuição do spread” nos empréstimos da casa, sobretudo nos de risco médio.
Já para quem está a pagar a casa ao banco também não pode esperar grandes novidades. Apesar de estarmos a assistir a uma paragem na subida dos juros, Natália Nunes da Deco reconhece que este cenário de “aflição” se irá manter e os portugueses não irão assistir a uma descida das prestações a pagar ao banco num curto prazo.
É certo que, ao contrário do que se verificou no tempo da troika, os consumidores tiveram agora a hipótese de renegociarem com a banca, desde que a taxa de esforço não fosse superior a 36% e cujo montante em dívida não excedesse os 300 mil euros.
Por outro lado, os bancos passaram a ter de fazer uma reserva de capital para os créditos a clientes particulares garantidos por imóveis destinados à habitação. Ou seja, uma almofada que os proteja de eventual crise no setor imobiliário.
De acordo com o BdP, a aplicação deste instrumento “tem uma natureza preventiva” e visa “aumentar a resiliência das instituições perante uma potencial materialização futura de risco sistémico no mercado imobiliário residencial em Portugal”.
Arrendar também dá dores de cabeça Com a atualização das rendas no início do ano, o impacto de pagar uma casa arrendada em Portugal agravou-se ainda mais, principalmente num mercado em que os preços não têm dado descanso nos últimos anos. Ainda assim, o Governo atribuiu alguns apoios, através do Pacote Mais Habitação.
Um deles diz respeito ao Apoio Extraordinário à Renda, que tem como objetivo ajudar as famílias que apresentem taxas de esforço superiores a 35%. O valor é atribuído automaticamente, caso estejam reunidas as condições de acesso, sem necessidade de candidaturas. Mas para isso, os contratos de arrendamento têm de ter sido celebrados até 15 de março de 2023 e cujos rendimentos não ultrapassem o sexto escalão do IRS (em 2024, 39 791 euros).
Outra hipótese é o Programa de Apoio ao Arrendamento (PAA), no entanto, não se trata de um apoio financeiro ao pagamento da renda, mas sim de uma plataforma de acesso a habitações para arrendar a preços mais em conta. Através deste programa público, poderá candidatar-se a arrendar um alojamento com uma renda um pouco mais reduzida do que os preços de mercado, mas funciona apenas para alojamentos disponibilizados pelos proprietários que, em contrapartida, beneficiam de isenção de IRS e IRC sobre as rendas, assim como de IMI e IMT.
O Arrendamento Apoiado – promovido pelo Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana – disponibiliza apoios habitacionais para pessoas com menores recursos que morem em condições indignas, sem alternativas de alojamento e que estejam em situação de carência financeira – assim como os apoios municipais ao arrendamento são outras alternativas.
Mas para quem está à procura, a tarefa não está mais facilitada, como admitem os responsáveis do setor ao i.
Quem são os responsáveis? Se quem tem casa vê-se a braços com contas acrescidas também quem procura não tem a tarefa mais facilitada. Ainda este sábado, milhares de portugueses saíram à rua e a opinião era unânime: “É difícil encontrar uma casa para viver”, mostrando-se contra os os preços praticados no arrendamento e venda de imóveis. Foi a terceira manifestação em menos de um mês e pretenderam exigir políticas que combatam a crise de habitação.
E se muitos culpam a aquisição e o arrendamento de imóveis por parte de cidadãos estrangeiros e o turismo – em que muitas casas se transformam nos últimos anos em alojamento local – vários especialistas do setor afastam responsabilidades, apontando o dedo ao Governo e às câmaras por falta de oferta.
A solução não é fácil nem existirá a curto prazo. Mesmo o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) que tem verbas destinadas à habitação para responder às necessidades ainda não apresentou resultados visíveis, como admitem ao nosso jornal vários responsáveis do setor. E como canta Sérgio Godinho na música Liberdade: “Só há liberdade a sério quando houver paz, pão, habitação, saúde e educação”.