A semana das definições, do cansaço e de algum circo  

o momento da semana foi sem dúvida a definição da AD em relação ao Chega, que esgotou tanto os argumentos do PS, como do próprio Chega, reforçando a ideia de voto útil na AD. Sem maiorias absolutas à vista, está tudo em aberto. Que comece a campanha!

Em mais uma semana de debates, as estratégias começam a definir-se. No caso do Chega, e mesmo reconhecendo que houve momentos em que André Ventura fez algum esforço para explicar as suas propostas, é impossível fazer uma avaliação positiva. A verdade é que não conseguimos lembrar-nos muito mais do que o barulho e as acusações, ditas quase em modo de verso, que podem fazer muito para segurar o seu eleitorado, mas pouco fazem pelo país e são de duvidosa eficácia para conquistar novos votantes.

Quanto a Paulo Raimundo e à CDU, é justo reconhecer que começa a encontrar o seu espaço, principalmente quando os debates assumem um modelo menos combativo. E a razão desta melhoria talvez esteja na personalidade de Paulo Raimundo, pouco dado a gritaria, mas também na dificuldade que o PCP tem em justificar em tão pouco  tempo muitas das suas posições. Até pode ser uma questão de coerência ideológica, mas, quando assistimos ao discurso das forças da paz para justificar a questão da Ucrânia ou da União Europeia, percebemos que o PCP parou no tempo e que a próxima eleição pode mesmo determinar o seu futuro.

Já Inês Sousa Real, que demonstrou consistência nos primeiros debates, tem vindo a desiludir, principalmente quando os temas fogem da sua zona de conforto. Creio que, se a estratégia de bipolarização do PS pegar, este é um partido que pode  ser seriamente prejudicado.  Até pela dificuldade que tem revelado em justificar o apoio ao Governo da Madeira e a fragilidade do argumento das causas desacompanhado de uma definição ideológica.

Rui Rocha, por sua vez, que na primeira semana tinha sido uma espécie de ‘candidato revelação’, perde o elemento da novidade e não gera grandes comentários, tendo eventualmente consolidado a sua base de apoiantes, que parecia pouco segura há semanas. Rui Tavares e Mariana Mortágua, em movimento ascendente, foram protagonistas de bons debates. A vantagem, ainda assim, é de Mariana Mortágua, que nunca se esquece com quem está a debater e, nesse sentido, é muito eficaz nas mensagens. Também Pedro Nuno Santos melhorou. Com uma estratégia clara de bipolarização e mensagens bem definidas, nomeadamente no que se refere ao legado dos seus Governos, apresentou-se tal como o recordamos. O apelo ao voto útil marcou muito dos debates, parecendo mesmo ter surpreendido Rui Tavares que, acompanhado nos argumentos pelos restantes partidos à esquerda e PAN, apressou-se a questionar a utilidade do voto no PS depois de terem desperdiçado uma maioria absoluta. Todavia, o momento da semana foi sem dúvida a definição da AD em relação ao Chega, que esgotou tanto os argumentos do PS, como do próprio Chega, reforçando a ideia de voto útil na AD. Sem maiorias absolutas à vista, está tudo em aberto. Que comece a campanha!

Mariana Mortágua vs. Rui Tavares – Jogar para o empate

Mariana Mortágua fez um saudável mea culpa em relação ao caso da avó, dizendo que não faz sentido trazer para o debate ‘questões particulares’. Teria sido igualmente importante estender este ato de contrição à verdade dos factos e ao âmbito de aplicação da ‘lei cruel’. Independentemente da validade do sentimento de injustiça, naquele caso concreto, se a lei causou sobressalto, foi mais pelo medo sem critério criado, do que pela realidade. De resto, mesmo depois de uma ação de charme de Rui Tavares, esteve bem ao não se esquecer de salientar o que une e separa o BE do Livre. Rui Tavares tentou desconstruir algumas propostas do BE.

Inês Sousa Real vs. Rui Rocha – Provocações

Com um PAN ao ataque a denunciar a falácia do liberalismo, sempre entre sorrisos, foi um debate equilibrado. Inês Sousa Real demonstrou superioridade nos temas ambientais, em particular na questão da energia nuclear, enquanto Rui Rocha foi firme na defesa de uma ideia de crescimento sustentável e na rejeição de qualquer solução proibicionista. Apesar da cassete liberal, que não trouxe novidade e reforçou as diferenças, coincidiram  na recuperação integral do tempo de serviço dos professores, com o líder liberal a acompanhar a ‘posição sensata’ da adversária, que defendeu a estabilidade das contas públicas.

Pedro Nuno Santos vs. Rui Tavares  – Voto útil 

Um debate em que Pedro Nuno Santos surge mais ao seu estilo e com mensagens claras no distanciamento da AD e no apelo ao voto útil. Rui Tavares, por sua vez, foi tímido nas críticas e chegou a ajudar o adversário a brilhar quando introduziu certos temas, como a aprovação do passe ferrovial nacional. Perante um Livre que mais parecia estar a fazer um ‘pitch’ de ideias perante um potencial investidor, Pedro Nuno Santos, passou o debate a equilibrar a depreciação com o elogio, foi demolidor nos minutos finais ao dizer que sem a vitória do PS, não haverá ‘boas medidas’ do Livre. O_debate podia ter terminado com a frase ‘não és tu, sou eu’.

Paulo Raimundo vs. André Ventura – Um cenário de tempestade

Um debate entre partidos com visões e perfis muito diferentes que em algumas partes do país disputam o mesmo eleitorado. André Ventura, perante um adversário menos experiente no frente a frente e que, goste-se ou não, assume uma vincada linha ideológica, não hesitou em adotar uma estratégia de provocação que acabou por ser eficaz. Não faltou a habitual demagogia, em particular no tema da corrupção, a cassete do PCP das privatizações e negociatas, e a ladainha do Chega sobre os valores que por via do confisco vão servir para subir pensões. Marcou o momento inusitado em que Paulo Raimundo, debitou os impostos pagos pelo PCP.

Paulo Raimundo vs. Luís Montenegro – Sem hipocrisias

Um debate à distância, onde Luís Montenegro, em modo tabu, voltou a não esclarecer sobre o que vai fazer se não ganhar as eleições. Com o primeiro tema a incidir sobre as pensões, Paulo Raimundo não resistiu ao fantasma da Troika e Montenegro foi obrigado a explicar a palavra ‘reconciliação’, rematando com um firme ‘podem confiar’. Perante um adversário indignado, o líder comunista tentou passar a ideia de ‘mais do mesmo’, com Montenegro a relembrar o apoio do PCP à governação socialista. O debate terminou com a questão do aeroporto. Ouvimos que se aguardam as conclusões de mais um estudo.

Mariana Mortágua vs. Paulo Raimundo – Troca de opiniões

Paulo Raimundo terá certamente as suas qualidades e está melhor, sejamos justos, mas se, nesta fase, com este adversário, continua a rejeitar o modelo de debate, arrisca-se ao pior resultado de sempre. Mariana Mortágua, em tom sereno, teve a oportunidade perfeita de debitar as suas propostas, de denunciar o ‘apelo esfarrapado’ do PS ao voto útil, ainda encostando Paulo Raimundo às cordas ao sumariamente referir o que os separa, como os temas da eutanásia, a Ucrânia, China e Angola. De Paulo Raimundo não houve grande novidade, tirando talvez o apelo quase inocente a que alguém coloque o tema da cultura em discussão. Mariana Mortágua pegou na deixa e ficámos mesmo a saber que no Museu do Traje chove. Foi ainda interessante ouvir o BE sobre a UE e a necessidade que esta organização tem de ter uma voz própria em matérias como geopolítica e cooperação para a defesa. Em suma, perante um PCP amigo, há que elogiar Mariana Mortágua, pois não só nunca se esqueceu que há uma disputa de eleitorado entre ambos, como permaneceu firme nesse propósito ao realçar com eficácia as diferenças.     

Pedro Nuno Santos vs. Inês Sousa Real – Pára-arranca 

Numa estratégia clara de bipolarização, Pedro Nuno Santos dramatizou a necessidade de defesa do Estado Social, apelou ao voto útil e apresentou-se como pessoa de ação, principalmente quando se falou do aeroporto e do lítio. Inês Sousa Real, por sua vez, com mais dificuldade em liderar o debate, mas convincente na necessidade de ponderação das causas ambiental e animal, quando acusada de ambiguidade, teve dificuldade em explicar o posicionamento ideológico do partido, identificando o PAN como ‘centro progressista’ e um partido de causas. Pedro Nuno Santos parece ter encontrado o seu tom e espaço com os ‘amigos prováveis’.  

Inês Sousa Real vs. Luís Montenegro   – As causas do PAN

Um debate marcado pela agenda do PAN, com ambos os candidatos a invocarem as suas condições de mulher e homem para poderem falar. Sejamos justos, quem começou foi Inês Sousa Real que parecia querer fazer de Luís Montenegro o bode expiatório de um parceiro da coligação que tem posições conhecidas, e inqualificáveis, relativamente ao estatuto das mulheres e em particular da violência doméstica. Talvez tenha sido o custo político a pagar, mas não me pareceu bem esta instrumentalização, nem a tentativa de assunção exclusiva de uma bandeira que, até aqui, tem pertencido – e bem – a todos os partidos.

Luís Montenegro vs. André Ventura  – Não é não  

Luís Montenegro marcou o debate ao esclarecer, logo no início e de forma muito direta, que não há entendimento possível com o Chega, por razões de princípio, de linguagem e de responsabilidade programática. A partir daqui, como seria de esperar, André Ventura apressou-se a traçar o diagnóstico, ou seja, Luís Montenegro é um líder que não decide, agarrado ao poder e responsável por um cenário de ingovernabilidade. Já o Chega ‘está como sempre esteve, disponível para conversar’, honrando os votos dos seus eleitores em derrotar a esquerda. Entre muitas interrupções, que Ventura chega a reconhecer não ser bom para o debate, Montenegro mostrou segurança e, sem entrar no tom do adversário, apontou à incoerência e irresponsabilidade das políticas do Chega, focando-se na relação de confiança que a AD está a procurar restabelecer com os eleitores portugueses. Uma nota quanto ao tema das Forças Segurança: Luís Montenegro trouxe para o debate o direito à greve e à filiação partidária defendidos pelo Chega, não se escusando a afirmar que se trata de uma instrumentalização por parte de André Ventura. Com postura de porta-voz, o candidato do Chega falou de traição, de falta de compromisso, dando mesmo a entender, quase em tom de ameaça, que está em causa a segurança do país. E repetiu, pausadamente, que nenhum governo, com Montenegro ou outro qualquer, persistirá no parlamento à direita se não der a estas pessoas o suplemento a que têm direito. Um debate difícil que deixou muito claro, para mal do Chega, que não há entendimento possível. 

Paulo Raimundo vs. Rui Tavares – Entendimentos

Mais uma troca de opiniões, com ambos os oradores a unirem-se na rejeição do voto útil e a conseguirem explicar, sem barulho de fundo, as respetivas posições em temas importantes como a Ucrânia, a União Europeia, as Forças de Segurança ou as questões laborais. Depois do debate entre AD e Chega, é impossível ficarmos indiferentes à forma respeitosa deste debate. Perante um europeísta convicto, Paulo Raimundo esteve mais seguro, apoiando-se no argumento da defesa da paz e hasteando bandeiras antigas , como a fusão da GNR e da PSP. Um debate que consolidou a imagem de Rui Tavares e melhorou a de Paulo Raimundo.

Mariana Mortágua vs. André Ventura – Quando os extremos se tocam

Um debate crispado e com muitas acusações de ética duvidosa. Em cena tínhamos dois partidos com visões opostas e duas personalidades cuja retórica e combatividade dificilmente gera a indiferença. Falaram ambos para o seu eleitorado, pelo que a forma contava. Mas, se nos conseguirmos abstrair dos ataques e olharmos para o conteúdo, alguns temas foram na verdade bem explorados, como a habitação, os vistos gold e a imigração, com André Ventura a tecer fortes críticas ao regime atual e a defender que deve ser a economia a determinar as necessidades migratórias do país. E o debate terminou como começou, de dedo em riste.

Rui Tavares vs. Inês Sousa Real  – Coerência 

Este foi um debate dececionante para o nível de conhecimento e oratória que vamos reconhecendo a ambos. O primeiro tema era a justiça e as respostas estiveram muito aquém da dimensão do problema. Em matéria de ambiente foi importante perceber as diferenças entre os dois quanto às questões energéticas, em particular do lítio. Inês Sousa Real teve muita dificuldade em justificar a sua coerência na defesa das causas ambiental e animal face ao apoio que o partido deu ao Governo na Madeira. Sente-se o cansaço e ambos terminaram a questionar o voto útil no PS, dizendo que este não serve nem mesmo para as ideias do PS.  

Paulo Raimundo vs. Rui Rocha – Concordar, discordar

Visões ideologicamente vincadas e debatidas com serenidade. Um bom momento de política. Paulo Raimundo, sem grande truculência, quase não parecia o mesmo. Rui Rocha foi eficaz na demonstração das diferenças, repetindo por diversas vezes ‘lucros privados, prejuízos privados’, como na saúde, ao salientar a importância da liberdade de escolha, ou na desburocratização como meio de combate à corrupção. Paulo Raimundo aproveitou bem todas as deixas e falou da ‘imoralidade’ das privatizações, do aumento dos salários, da necessidade de mais médicos, mais funcionários e meios na justiça. Foi bom sentir que havia ordem na política.   

Pedro Nuno Santos vs. André Ventura – O mau e o vilão

Perante um André Ventura que, com momentos de enorme demagogia, nunca hesitou em expor as fragilidades do partido e das governações socialistas, Pedro Nuno Santos teve dificuldade em liderar o debate, falando pouco das suas ideias e muito das do adversário. Na verdade, no caso em particular da justiça, e apesar de ter conseguido desconstruir com razoável eficácia a ligeireza dos argumentos de André Ventura, esperava-se mais. O mesmo se diga em relação à saúde, em que, para além de denunciar a ideia de um sistema nacional de saúde de André Ventura, o candidato socialista limitou-se a responder às sucessivas acusações de falhanço, acabando por também recorrer ao exagero quando entrou no discurso da luta pela sobrevivência do SNS. A partir daqui, seja quando falaram de fiscalidade, seja quando falaram de habitação, enquanto Pedro Nuno Santos acusava André Ventura de enganar as pessoas e de prometer tudo e o seu contrário, André Ventura realçava a impreparação, incompetência e falta de soluções do adversário. Com uma ligeira vantagem, principalmente pela postura, de Pedro Nuno Santos, não me parece que tenha havido grande alteração de sentidos de voto.