Ex-militante do PSD, nem sempre esteve ligado ao Chega – que até é recente – nem tão pouco só à política. Conheça o homem que – bem ou mal – conseguiu que o partido que fundou em 2019 se tornasse, muito poucos anos depois, a terceira força política portuguesa.
É daquelas pessoas de quem ou se gosta ou se odeia e, independentemente do que possa considerar-se, é um nome que conhecido de toda a gente. É provocador, de ideias fixas e tem sempre de levar a sua avante. Não deixa nada por dizer. André Claro Amaral Ventura nasceu a 15 de janeiro de 1983, em Algueirão – Mem Martins, na linha de Sintra. O pai era comerciante e a mãe trabalhava no apoio ao secretariado. Não veio de uma família rica, como chegou a dizer ao SOL em 2018. “Tiveram algumas dificuldades em pagar-me os estudos, sobretudo na universidade”.
É católico praticante e tem uma fé inabalável, mas não foi educado dessa forma. Não foi batizado porque os pais lhe deram a oportunidade de o escolher mais tarde. E escolheu. Aos 14 anos foi à Igreja, descobriu Deus, fez o batismo, primeira comunhão e Crisma e nunca mais largou a religião. De tal forma que pensou mesmo ser padre e frequentou o seminário de Penafirme com esse intuito. Mas desistiu por amor. Apaixonou-se. E foi estudar.
A entrada e permanência na faculdade onde cursou Direito – não apenas pelas questões financeiras mas pelo local de onde vinha –, confessa, não foi fácil. “Tinha o objetivo de ser o melhor. E isso orgulha-me muito. Fui um dos melhores alunos de sempre da Universidade Nova de Lisboa. Lutei sempre muito por isso”, disse ao SOL numa entrevista de vida em 2018. E, apesar de os pais morarem perto da faculdade onde estudou, durante esse período viveu na Igreja de São Nicolau. “O padre Mário Rui convidou-me para fazer a vida da universidade dentro da igreja. Vivi interno e ia a casa só aos fins de semana às vezes. É uma igreja e por cima tem uma residência”. Licenciou-se com 19 valores.
Fala muito rápido. Diz que sempre falou. E que o raciocínio acompanha essa rapidez. Talvez por isso a sua vida profissional tenha sido tão ativa e variada.
De professor a político
A carreira de André Ventura começou como professor na Universidade Autónoma de Lisboa, de 2013 até 2019, e na Universidade Nova de Lisboa, de 2016 até 2018. Mas fez sempre outras coisas. Foi consultor na Caiado Guerreiro, Sociedade de Advogados, de 2018 até 2019, e comentador desportivo na CMTV de 2014 até 2020. Foi também inspetor da Autoridade Tributária.
Foi, aliás, como comentador desportivo que se lançou nas luzes da ribalta. Sempre com língua afiada e, às vezes, em verdadeiras barracadas. É benfiquista ferrenho e defendia sempre o seu clube.
Mas, antes de se tornar mediático, já tinha andado na política. Primeiro, no PSD, mas foi sol de pouca dura. Em 2015 avançou que talvez fosse candidato pelo PSD à Câmara de Sintra, mas a candidatura não aconteceu. Dois anos mais tarde, foi escolhido pelo PSD para liderar a candidatura à Câmara de Loures nas eleições autárquicas. Perdeu mas foi eleito vereador. Renunciou do ano seguinte.
O Chega vem a seguir. Funda o partido a 9 de abril de 2019 e concorre às eleições legislativas de 2019 como cabeça de lista pelo círculo eleitoral de Lisboa, acabando por ser eleito como primeiro (e único)_deputado do partido por si fundado.
Prometeu em 2019 ao i, depois de ter ganho pela primeira vez lugar como inquilino do Parlamento, que “a Assembleia da República nunca mais vai ser a mesma”. E não foi.
A associação do seu partido à extrema direita começou logo aí, mas André Ventura pouco abanou: “Os rótulos, a nós, preocupam-nos muito pouco. Nós consideramo-nos essencialmente um partido antissistema”. E, apesar de ter sofrido até à última na noite eleitoral desse ano, conseguiu um lugar no Parlamento, tendo nessa altura afirmado ao SOL: “Acho que todos os partidos deveriam perguntar-se como é que um partido com quatro meses elege para a AR um deputado”. Cinco anos depois, conta com 12 deputados e as sondagens apontam para um grande aumento neste próximo ato eleitoral de 10 de março.
Polémicas atrás de polémicas
É impossível falar de André Ventura sem destacar todas as polémicas em que se vê envolvido e os vários ‘bate-boca’ dentro e fora a Assembleia da República.
Associações à extrema direita, racismo, castração química, prisão perpétua, entre outros são vários dos tópicos que são temas principais das polémicas do líder do Chega. Quem não se lembra da frase “Eu proponho que a própria deputada Joacine seja devolvida ao seu país de origem”. Deu pano para mangas, mas não foi a única.
A etnia cigana sempre foi o seu principal calcanhar de Aquiles. Diz o que pensa e o que o sente mas nem sempre é levado a bem. Ou a sério. E a perceção que tem da etnia cigana vem desde cedo. “Foi na Baixa de Lisboa que comecei a perceber que muita da comunidade cigana que hoje temos – não toda, mas muita – dá uma má imagem de Portugal para fora”, disse ao SOL em entrevista.
Polémicas que se mantiveram ao longo dos últimos anos e que continuam nesta nova campanha que agora começa. Ao longo dos – ainda poucos – anos que se mantém à frente do Chega já levou com processos por assédio e discriminação racial ou por causa de uma publicação sobre Joacine Katar Moreira. É também alvo de ameaças de morte, já foi quase agredido em campanhas e chegou a dizer-nos que não podia ir às compras. A relação de amor-ódio que tem com os portugueses levam a que, ainda assim, os debates em que participa sejam dos que mais audiência têm.
E, antes disso, afirmou qual o seu objetivo na apresentação da sua candidatura. “Candidato-me a presidente do Chega com um objetivo ambicioso e difícil, mas claro: vencer as eleições legislativas de 2024”. E o lema escolhido da VI Convenção do Chega não passou despercebido: “Limpar Portugal”. É que, no fundo, sempre foi a sua principal prioridade e, ainda que não tenha chegado aos lugares que almeja, André Ventura levou o partido a ocupar o lugar da terceira maior força política em Portugal.
Até quando estará na política, não se sabe. Se conseguirá os seus objetivos, também não. Mas ao SOL garantiu: “Sempre defendi que os políticos têm o seu tempo e o seu prazo de validade”. Só não diz qual é o seu.