O que muitos temiam, está a acontecer – uma divisão clara entre moderados e radicais da PSP. Aqueles que se escondem por detrás da sigla INOP estão a mobilizar os polícias para nova vigília que se realizará no princípio de março, em Lisboa. «Nas redes sociais, WhastApp e Telegram, a maioria apela à contenção nos protestos até à tomada de posse do novo Governo, dizendo inclusivamente que devemos afastar-nos da luta política, pois facilmente podemos ser acusados de estar a favorecer este ou aquele partido. Do outro lado, estão os radicais que dizem que não têm medo de ninguém e que precisam de seguir as palavras de Pedro Costa, o agente que está nas escadarias da AR há já dois meses. Não querem calar-se até as nossas reivindicações estarem garantidas, mas isso só vai jogar contra nós», diz ao Nascer do SOL, um destacado elemento sindical, que prefere o anonimato.
Esta decisão surge depois da Plataforma, que reúne seis sindicatos da PSP e quatro associações socioprofissionais da GNR, ter declarado que suspendia o encontro nacional de polícias, de 2 de março, dando tréguas aos políticos até às eleições, devido aos acontecimentos do Capitólio, onde mais de mil pessoas marcaram presença, tendo praticamente ‘bloqueado’ a entrada do Parque Mayer, local onde decorreu o debate entre Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro. Insatisfeito com esta posição da Plataforma, Pedro Costa logo difundiu um vídeo dando conta do seu desagrado. «Ao que parece, este último comunicado da plataforma veio originar dúvidas quanto à continuidade das vigílias já marcadas bem como [de] futuras vigílias. Pergunto-vos: a plataforma alguma vez teve participação nas nossas vigílias? Sendo a resposta do vosso conhecimento, as vigílias são para continuar. Pelo menos, eu irei continuar», disse nas redes sociais. Pelos vistos, não estará só, embora muitos duvidem da capacidade de mobilização sem o apoio dos sindicatos tradicionais que tratam da logística de transportes e afins.
Mas qual a razão para a Plataforma ter adiado o encontro nacional a 2 de março? «Anulámos as ações porque já que percebemos que terá de ser o futuro Governo a resolver esta questão, segundo, que já tínhamos levado a cabo inúmeras, várias, ações de protesto na rua ao longo de oito semanas e, portanto, faria sentido, tendo em conta que faltam pouco mais de duas semanas para a eleição, fazer aqui um compasso, não é de espera mas um compasso naquilo que são formas de luta mais presenciais. Não quero dizer com isto que vamos fechar os olhos ou descansar», diz Bruno Pereira, presidente do Sindicato de Oficiais de Polícia e membro da Plataforma.
Vamos então ao filme dos últimos acontecimentos. Tal como estava previsto, A Plataforma marcou uma ação de protesto para o Terreiro do Paço no dia do debate entre os líderes do PS e do PSD, mas fê-lo, apurou o nosso jornal, sem saber a hora e o local do ‘encontro’ televisivo. Caso tivessem sabido, garante fonte sindical, teriam marcado esse encontro para outra hora ou mesmo para outro dia. Questionado se foi um disparate o debate ter sido no Parque Mayer, que só tem uma entrada, Bruno Pereira diz de sua justiça. «Acho isso completamente irrelevante até porque não foi posto em causa quer a circulação, quer a liberdade seja de quem for que esteve no local. Aliás, tem-se vindo a alimentar uma ideia completamente errada e desproporcional daquilo que foi o protesto sóbrio, ainda que aparentemente irregular, e aparentemente irregular, digo, porque há um desvio àquilo que é uma obrigação de comunicação prévia para que a Polícia pudesse acertar e alocar os recursos necessários que zelassem por um desfile ou um cortejo feito em segurança por parte dos manifestantes sem causar grandes transtornos a terceiros».
Recorde-se que das três mil pessoas presentes em frente ao Ministério da Administração Interna, cerca de mil ‘arrancaram’ para a porta do Parque Mayer, quando por volta das 18h40 o movimento INOP lançou o apelo nas redes sociais. O SIS tomou conhecimento e terá alertado o Governo, que avisou a direção nacional da PSP que mandou para o local um pequeno dispositivo. E qual a razão para mandar um pequeno dispositivo? «Haveria outra forma de a Polícia agir? De um lado e de outro há gente armada. Neste caso não seria secos e molhados, seria pólvora e balas e foi por isso que a direção nacional só mandou aquele dispositivo», esclarece um oficial da instituição.
O Governo já solicitou a abertura de um inquérito e a direção nacional da PSP e o IGAI irão investigar a manifestação do Capitólio. «Não vai dar em nada, como é evidente. Muitos dos presentes nem são polícias, muitos estão na pré-aposentação e alguns reformados. E havia muita gente da GNR e dos Guardas Prisionais, além de populares que se juntam nestas ocasiões. No passado, estas coisas deram em nada, tendo alguns dos elementos pré-aposentados sido castigados com multas de dois ou três dias». Outro quadro da PSP insurge-se contra a abertura destes inquéritos. «Não vivemos no tempo da Santa Inquisição, não é por aí que se impõe obediência hierárquica».
Quando Luís Montenegro decidiu
O movimento inorgânico é-o mais de nome, pois na PSP muitos sabem quem está por detrás, havendo mesmo quem diga que elementos de sindicatos mais pequenos da Plataforma também fazem parte do INOP. «Estão em todas e querem é confusão. Quanto pior, melhor», explica um sindicalista. Como tem sido notório, a luta dos polícias vai perdendo apoio popular à medida que fazem manifestações impopulares e há mesmo quem dentro da instituição considere que Pedro Costa quer «ser o representante de todos os polícias e que anda à procura de uma medalha de campeão nacional de protesto policial».
Outra fonte da PSP recorda o que se passou em 2013 e que deveria seu uma lição. «Tínhamos quase tudo combinado com o Governo para alterar a lei 12 A, que na altura era a dos Vínculos, Carreiras e Remunerações da Função Pública. Entretanto, houve aquela manifestação em que se subiram as escadarias da AR e o povo começou a ficar contra nós. Então se os outros manifestantes não o podem fazer, vão os polícias fazê-lo? Dois meses depois as coisas pioraram quando se derrubaram as grades de acesso à AR. Miguel Macedo, que era o MAI, anulou as reuniões agendadas e só muitos meses depois conseguimos a aprovação devido à interferência de Nuno Magalhães e… Luís Montenegro. O que poderia ter sido resolvido em meses levou quase dois anos. Parece-me que Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro podem ficar com o trunfo que Miguel Macedo ficou então». O aviso, para que os polícias não cometam o mesmo erro duas vezes, é de um oficial que apela à contenção até às eleições.