A minha mãe sempre me disse que os filhos dão mais trabalho quando são crescidos do que quando são crianças. No meio de fraldas, noites mal dormidas e viroses, foi difícil acreditar neste vaticínio. Nada podia ser mais cansativo do que passar os dias a correr atrás de crianças e ainda dormir aos bocados, pensava eu. Mas a minha tinha razão. É verdade que os filhos, quando são crianças, estafam-nos fisicamente. Transportar carrinhos, arrumar brinquedos, dar banhos e sermos recorrentemente chamados para limpar rabos quando finalmente nos sentamos, dá cabo das costas de qualquer um. Lembro-me com comoção dos dias em que larguei as fraldas ou que o meu filho mais novo prendeu o cinto de segurança sozinho pela primeira vez. Foram dias de libertação. Mas quando eles crescem é pior.
Quando os nossos filhos já têm idade para ter juízo, dão-nos conta do juízo: o cansaço é outro mas é muito pior. É um cansaço que nos chega da preocupação. Como diz a minha mãe, quando eles crescem «só podemos ficar a assistir», de mãos atadas. E tudo começa quando eles começam a fazer escolhas sozinhos. Escolhem os cursos – sempre os errados – e deixamos de saber as datas dos testes, dos exames, as notas. Ficamos às voltas na cama sem saber o que se passa para lá dos muros das faculdades, se as cadeiras atrasadas não lhes vão atrasar a carreira. Mas não podemos fazer nada porque os meninos são maiores e nas faculdades não se aceitam encarregados de educação. Cheios de sabedoria decidem mudar de curso, pararem um ano “para pensarem” na vida, “trabalhar”. E nós, angustiados, ficamos a assistir. Apreensivos e acorrentados pela sabedoria dos velhos que nos ensinou que o trabalho pode comprometer o estudo e que um ano parado pode comprometer tudo. Mas é a vida. É deixá-los voar, dizem. Tudo muito certo, mas aquilo que nos cansa e tira o sono é que não confiamos nas asas deles e muito menos nas carreiras de voo. Eles até podiam voar e nós até ficaríamos sossegados se soubéssemos em que direção vão, onde planeiam aterrar, se conhecêssemos todos os elementos do bando com quem voam e se as asas estão em condições para suportar a viagem. Mas como ninguém nos informa, damos voltas na cama sem conseguir dormir enquanto os meninos se divertem em bando.
Os filhos dão mais trabalho quando crescem porque os problemas da vida passam a ser só deles. E nós que nos tramemos e só somos chamados em situações de emergência. Tipo bombeiros. Nós, pais, estamos formatados para resolver os problemas dos nossos filhos. Somos mesmo muito bons nisso, temos experiência, know-how e, mais do que tudo, nascemos como pais para isso mesmo. Temos um chip que nos diz exatamente como gerir as vidas deles – que sabemos gerir melhor do que a nossa. O nosso chip começa a dar erro quando aquilo que programamos não é concretizado, executado. Temos a certeza absoluta quais as opções mais acertadas, as companhias recomendáveis e as soluções para todas as barreiras que a vida lhes põe à frente. Mas eles não perguntam, os incautos. Esse chip faz um barulho ensurdecedor que não nos deixa dormir. Filhos criados, trabalhos dobrados, diz o ditado. E pais estafados, digo eu.