Quarta-feira, na véspera da apresentação do Programa de Governo, a nova ministra da Saúde, Ana Paula Martins, e Fernando Araújo encontram-se pela primeira vez desde que o novo Executivo tomou posse. O destino do diretor executivo do Serviço Nacional de Saúde (DE-SNS) não foi o tema central ou o propósito do encontro, mas sim as linhas orientadoras do programa do novo Governo. No entanto, durante a curta reunião, Fernando Araújo mostrou-se disponível para se manter na liderança do SNS e cumprir as novas orientações políticas. Sem mais detalhes.
A nova ministra da Saúde, que se demitiu no final do ano passado da presidência do Centro Hospital Lisboa Norte, que inclui o Hospital de Santa Maria, por discordar da forma de financiamento das novas Unidades Locais de Saúde (ULS), comunicou ao DE que, para já, conta com a sua confiança. Segundo o Nascer do SOL conseguiu apurar, não está em causa, por enquanto, a exoneração ou demissão de Fernando Araújo, mas sim alterações na estrutura orgânica da Direção Executiva. A tutela está disponível para manter o diretor mas o destino do resto da equipa não é tão certo. Francisco Goiana, membro do Conselho de Gestão e que ocupou o lugar de técnico do secretário de Estado Adjunto e da Saúde entre 2015 e 2018, deverá ser um dos dispensados.
Apesar das medidas no âmbito da Saúde não se reduzirem à reestruturação levada a cabo por Fernando Araújo, é esta reforma que está a mexer em todo o sistema. O fim das ARS – que foi uma das medidas aprovadas num dos últimos Conselho de Ministros do anterior Governo – a transferências de competências da Direcção-Geral da Saúde para a DE-SNS, concretizada no final do ano passado, e a criação e generalização das ULS transformaram a configuração do SNS e limitaram as competências diretas do poder político. Fernando Araújo criou, desta forma, um equilíbrio de poderes em que o DE é, em termos práticos, quem mais ordena na Saúde.
No entanto, com ou sem Araújo, o novo Governo quer agora reverter parte do plano do DE. E começa logo por uma medida que foi a causa alegada por Ana Paula Martins para apresentar a sua demissão: as ULS. Apesar de não ser contra este modelo, a nova ministra anunciou publicamente que a forma de financiamento dos hospitais universitários e de fim de linha – ou seja, os principais hospitais, como o Hospital de São João ou o de Santa Maria – comprometem o seu funcionamento e missão. Defendendo que estes não deviam estar integrados na nova estrutura na forma como esta foi desenhada em termos de financiamento.
O programa do Governo é claro. A nova ministra tem como missão «Avaliar o desempenho das Unidades Locais de Saúde (ULS), e rever a sua planificação com particular destaque para as que integram hospitais universitários». E ainda assume a criação de uma nova figura: «Sistemas Locais de Saúde flexíveis com participação de entidades públicas, privadas e sociais».
Quanto ás competências, poder e funções da DE-SNS, cujo estatuto foi aprovado no Verão passado, também estão prometidas mexidas: «Reformular a Direção Executiva do SNS, com uma alteração da sua estrutura orgânica – mais simplificada -, e das suas competências funcionais que visa uma governação menos verticalizada e mais adequada à complexidade das respostas em saúde, articulação entre redes de cuidados e modelos de contratualização e financiamento, infraestruturas, recursos humanos e transformação digital na saúde».
Outro compromisso do Governo que parece entrar em contradição com o desenho que a Fernando Araújo idealizou e concretizou na Saúde é o reforço da «autonomia das instituições através de um novo modelo de gestão descentralizada e suportada em princípios de sustentabilidade económico-financeira e de garantia da utilização das melhores práticas de gestão orçamental e de recursos humanos».
Em que termos, como e quando tudo isto será concretizado ainda não é conhecido, uma vez que a prioridade da nova tutela é negociar com os médicos e apresentar nos próximos meses as medidas de urgência para combater as listas de espera , o atraso das consultas, a nova reestruturação nas urgências e concretizar a promessa de um médico família para todos os portugueses. A permanência de Araújo parece depender só dele e da sua disponibilidade para rever «a maior reforma do SNS desde sempre», na qual se comprometeu.