O Chega pode ganhar as próximas eleições?

Ainda não conseguimos explicar aos portugueses que o que não faz a diferença é a indiferença…

Sim, pode. Há quatro anos o PS venceu as Europeias com um milhão e cem mil votos. Há um mês o Chega conseguiu nas Legislativas mais de um milhão e cem mil votos.

Pedro Pinto, deputado do Chega, dizia, há dias, que se o país estiver bem, o Chega também estará bem. Falso! O Chega precisa que o país esteja mal para que ele esteja bem.

E para que a extrema-direita possa fixar e voltar a mobilizar os mais de milhão e cem mil portugueses, necessita de nos atirar à cara mais escândalos. Aguardam-se os contributos do justicialismo saca-rolhas – os tartufos andam por aí e que as matilhas lhes rasguem as calças e as algemas se lhes atirem aos pulsos.

Dia 9 de junho, os populistas querem oferecer-nos a possibilidade de, ao votar neles, podermos dar mais uma bofetada nos governantes, de punirmos os poderosos e lançar óleo na fogueira. Eles não estão interessados em informar, mas em inflamar – querem-nos enervados. Esperam-se dois meses de pedrada.

As taxas de rejeição a Pedro Nuno Santos, Luís Montenegro e Pedro Passos Coelho mostram que nunca os políticos do centro foram tão desprezados como agora, mas eles continuam a brincar com caixas de fósforo. Um Pedro – que já não comunica por WhatsApp, mas por carta – afunila o PS na esquerda e diz que não devemos levar a sério o André; o outro Pedro – que não é do Chega, mas parece – fala da família, mas ataca a sua; o Luís – que de passista passou a cavaquista – arrisca escolhas e companhias a norte.

Sim, o Chega pode vencer as próximas eleições se PS e PSD (do presente e do passado) continuarem a brindar-nos com pérolas de imprudência, arrogância e incompetência. Os portugueses já perderam a tolerância naqueles que jogam com as suas vidas e os usam como esfregões de cozinha.

Nas últimas Europeias votaram pouco mais de 30% dos portugueses inscritos e outros quase 70% justificaram a indiferença com a falta de confiança na política e nos políticos que dizem desacreditados ou corruptos. E dos que votaram, 7% de irritados foram à urna para se expressar em branco ou anular o voto.

Naquela que foi a maior abstenção de sempre da nossa democracia, os portugueses manifestaram uma gritante ignorância sobre a União Europeia e o Parlamento Europeu. As eleições podem ser diferentes, mas os motivos são os mesmos: não se identificam com os partidos, não reconhecem os candidatos, não se reveem nas campanhas e na agressividade verbal.

Os líderes europeus estão preocupados pelas próximas eleições em Portugal estarem coladas a feriados, até porque, tradicionalmente, são momentos de protesto para com os partidos que governam. E se antes não havia um partido que desse força aos tópicos de café, agora há.

Sim, nas próximas eleições, os três maiores partidos poderão ficar empatados na margem de erro e o Chega conseguir mais deputados eleitos. Tudo porque ainda não conseguimos explicar aos portugueses que o que não faz a diferença é a indiferença.

Razão tinha Saramago quando escreveu que o que chamamos de democracia mais se assemelha ao pano solene que cobre a urna onde já apodrece o cadáver.