As aparições públicas de Passos Coelho tiveram um claro objectivo de dar um recado a Montenegro: o de que se não aproveitar a maioria de direita que existe no Parlamento, o Governo ficará completamente bloqueado e incapaz de fazer as reformas de que o país precisa. Neste âmbito Passos Coelho deu o seu próprio exemplo pessoal de ter gerido uma coligação de governo com um parceiro não confiável, o que não o impediu de ter levado a bom termo uma legislatura na situação mais difícil que o país conheceu em democracia. Perante a situação igualmente complexa que atravessamos, especialmente a nível internacional, seria por isso importante um acordo entre os partidos da maioria de direita, que permitisse alterar a pesada herança dos governos da ‘geringonça’ e da maioria do PS.
A AD tem, no entanto, privilegiado uma aproximação ao PS, pelo que não está a ser apresentada nenhuma política reformista, como se exigiria e o país tanto aguardava. Na verdade, a AD entendeu-se com o PS para eleger o presidente do Parlamento, tendo em contrapartida aceitado reduzir o mandato do mesmo em metade. Em seguida, a AD abdicou de apresentar um orçamento rectificativo, aceitando governar com o orçamento do governo anterior, que na altura tanto criticou. Em consequência, a AD abdicou também do choque fiscal prometido na campanha eleitoral, tendo-se limitado a acrescentar os pozinhos à redução do IRS que tinha sido aprovada por António Costa. E finalmente a AD apresentou o mesmo programa de estabilidade e crescimento que tinha sido elaborado pelo Governo anterior, não lhe tendo feito qualquer mudança de relevo.
A única mudança que se realizou foi a nível simbólico, com a alteração do logótipo do Governo, o que plenamente se justificava dado o carácter claramente inadequado do logótipo anterior. No entanto, perante a clara ausência de uma mudança de políticas nestes dias iniciais, a sensação que essa mudança deixa corresponde à célebre afirmação do Príncipe Salina no romance Il Gattopardo: «É preciso que alguma coisa mude para que tudo continue na mesma».
É por isso fundamental que o Governo comece a apresentar as reformas de que o país carece. Neste âmbito, perante a crise de habitação que o país atravessa é fundamental reverter toda a política socialista dos últimos oito anos. Tal passa por revogar todas as leis penalizadoras do arrendamento que foram publicadas desde 2016, com especial destaque para o Mais Habitação. É também necessário abolir o adicional ao IMI, o célebre imposto Mortágua, que só incide sobre prédios de habitação e por isso afasta os particulares de investir na aquisição desses prédios, preferindo antes optar por imóveis comerciais. É preciso dar um sinal claro aos proprietários e investidores de que o período negro para a habitação em Portugal está finalmente para trás e que agora podem ter confiança num quadro justo e estável para a construção e arrendamento.
Não há uma segunda oportunidade para criar uma primeira impressão. A primeira impressão que deixou este Governo não foi positiva, devido à enorme proximidade que tem mantido com o PS. Mas ainda vai a tempo de corrigir a situação.