A Câmara Municipal de Lisboa tem levado a cabo várias obras e projetos com vista à melhoria nas áreas da habitação, mobilidade e urbanismo. No entanto, a relação com a oposição não tem sido fácil e têm existido várias críticas. No caso da habitação, a oposição tem criticado a autarquia lisboeta, acusando o executivo de Moedas de “especulação imobiliária”.
Um dos problemas diz respeito a uma proposta da coligação que lidera a Câmara Municipal de Lisboa que previa a alienação de sete terrenos, avaliados em cerca de 70 milhões de euros. As críticas foram tantas que a proposta acabou por ser retirada. Em causa estava a alienação em hasta pública de sete terrenos municipais divididos por várias freguesias: Lumiar (um terreno), Marvila (dois), Beato (três) e Penha de França (um). O objetivo era obter financiamento para realizar investimentos na área da habitação.
Carlos Moedas, presidente da autarquia, comentou o assunto: “O PS propôs, de forma absolutamente inaceitável e incompreensível, um conjunto de obstáculos à criação de mais habitação municipal em Lisboa. Devido a esses obstáculos, o executivo municipal viu-se obrigado a retirar uma proposta” e o autarca já afirmou que não vai desistir de procurar soluções. O PS reagiu e atira que, “para ter luz verde, a alienação de terrenos dependeria sempre da construção ou reabilitação de novas casas” e que esses novos empreendimentos “tinham de ser identificados”.
Mas não é apenas o PS a apontar o dedo. O Bloco de Esquerda é da opinião que a retirada desta proposta que considera “ilegal e lesiva para quem vive e trabalha em Lisboa”, só prova que Moedas queria “vitimizar-se” e que esta decisão “demonstra total desorientação por parte de Carlos Moedas”.
As críticas surgem de todo o lado. Os vereadores do Cidadãos por Lisboa que atiram: “Não se percebe porque queria Moedas alienar os poucos terrenos que ainda temos, se esse património pode ser fundamental para o futuro”.
Em janeiro deste ano, a autarquia apresentou um novo modelo de habitação acessível em parceria com privados. O objetivo era desbloquear o impasse no avanço de projetos como os de Benfica e do Parque das Nações. A oposição – principalmente o PS – não concordou com a ideia e a proposta acabou por ser retirada.
Preços inacessíveis
Ao i, os vereadores do PCP começam por dizer que “a situação da cidade de Lisboa responde por si: embora o licenciamento urbanístico, que continua a agravar os problemas das zonas mais constrangidas da cidade (sobrecarga das infraestruturas e espaços públicos, expulsão de residentes e atividades económicas de proximidade, turistificação absoluta das áreas centrais) tenha respaldo nas múltiplas exceções permitidas pelo PDM [Plano Diretor Municipal] de Lisboa, não se encontra, no presidente Carlos Moedas e no executivo municipal com pelouros, uma avaliação de impactos negativos na vida dos lisboetas que justificariam a não utilização de tais exceções, nem se encontra uma dinâmica de elaboração de instrumentos de gestão territorial que permitam acautelar tais impactos”.
No que à habitação diz respeito, “além das crescentes situações de despejo de residentes encobertas em obras ditas de reabilitação ou de qualificação, a apregoada resposta do presidente Carlos Moedas e o atual executivo municipal com pelouros limita-se à continuidade de obras já iniciadas em património municipal disperso, muito longe do que se exigiria para dar resposta às necessidades bem patentes nas candidaturas a acesso a oferta municipal de habitação”. Por outro lado, acrescentam os vereadores comunistas “são proteladas operações de promoção municipal de habitação comprometendo a capacidade de resposta futura, de que é exemplo a operação PACA [Programa de Arrendamento a Custos Acessíveis] no Restelo”.
Ainda nesta área dizem ao i que o principal problema está nos preços elevados “inacessíveis para a maioria”, acrescentando que “o que existe, de facto, é falta de acesso à habitação existente e à que continua a ser produzida, obrigando à maior oferta pública de habitação, não apenas para responder às situações de carência económica absoluta, mas também para moderação dos valores de mercado de venda e arrendamento”.
Por isso, defendem ser “fundamental avançar com programas públicos de desenvolvimento habitacional bem como recuperar para o arrendamento, com custos acessíveis, os milhares de fogos devolutos e vagos na cidade”.
Ainda neste domínio, a vereação do PCP destaca que “falta uma cuidada e eficiente intervenção de manutenção do património habitacional do município e o investimento regular da promoção de habitação para arrendamento acessível e contenção da densificação do tecido urbano central da cidade, mitigando as ameaças de despejo dos atuais residentes, para além da necessidade de maior cuidado com a requalificação dos bairros municipais”.
Apesar de não acusarem a autarquia de especulação imobiliária, os vereadores do PCP falam numa “política municipal prosseguida pelo presidente Carlos Moedas e pelo executivo com pelouros, que, particularmente nas áreas centrais da cidade, legitima e aplaude a dinâmica de densificação do edificado e turistificação dos usos que o mercado aproveita numa repugnante e imparável especulação imobiliária que expulsa moradores e nega alternativas de residência na cidade”.
Já os vereadores do Livre dizem ao nosso jornal que “todas as boas propostas do Executivo têm sido aprovadas” mas nota que, “infelizmente, as boas propostas da oposição têm ficado meses na gaveta à espera de agendamento, incumprindo largamente os tempos impostos pelo regimento”.
O Livre fala em especulação imobiliária e diz que “basta olharmos para a mais recente proposta dos Novos Tempos para hasta pública de diversos terrenos municipais que estavam identificados como “Edifícios Públicos Municipais de Renda Acessível” na Carta Municipal de Habitação de modo a percebermos por que motivo o afirmamos”. É que essa proposta, na opinião do Livre, “visava submeter à especulação do mercado imobiliário esses terrenos, que a própria Carta prevê como terrenos para habitação pública de renda acessível. Obviamente não podíamos senão votar contra”.
O partido diz que levou várias propostas de alteração para discussão e votação da Carta Municipal de Habitação na reunião de câmara. “Infelizmente, as mais significativas foram chumbadas”, lamenta. E deixa um exemplo, como é o caso da proposta que visava reequilibrar as zonas com maior pressão turística sobre o parque habitacional da cidade de Lisboa, “com novas medidas ao nível do licenciamento urbanístico, obrigando novos empreendimentos turísticos a providenciar habitação de renda acessível, em áreas geográficas nas quais o parque habitacional está sob forte pressão turística, restringindo a conversão de frações com uso habitacional em uso turístico”. Outra proposta do Livre residia na expansão de áreas habitacionais a programar através de planos ou loteamentos municipais, “excluindo da Carta Municipal de Habitação a possibilidade de criação de habitação para o mercado especulativo em “Território Municipal de Expectante”, nomeadamente, a habitação considerada de luxo”. O objetivo, diz o Livre, “seria destinar a totalidade do solo disponível em “Território Municipal de Expectante” à habitação pública”.
E fala também de propostas com vista à regulação do Alojamento Local, “que visavam criar ferramentas mais eficazes na defesa do parque habitacional da cidade”. “Entre as medidas que defendíamos, estavam — desde logo — a oposição automática à renovação de todos os registos de alojamento local, nas zonas onde o Índice de Pressão Turística seja elevado ou onde o rácio estabelecido no Regulamento Municipal do Alojamento Local seja ultrapassado”, acrescenta o partido.
Urbanismo e mobilidade pelo mesmo camino
No que diz respeito ao urbanismo, o PCP reitera que é necessário “privilegiar a produção de instrumentos de gestão territorial abrangentes de zonas constrangidas da cidade, capazes de enquadrar as suas transformações na resolução de necessidades sentidas, pelas respetivas populações ou de constrangimento de relação com a cidade no seu conjunto, em alternativa ao licenciamento aleatório de obras particulares”.
Já o Livre diz que as propostas em que votou contra “não cumpriam o PDM, ou não garantiam a defesa do interesse público e do equilíbrio dos usos na cidade”. Tem sido o caso, por exemplo, “de propostas relativas a novos hotéis em zonas já muito saturadas pelo turismo e que para se instalarem propõem converter edifícios de uso exclusivamente habitacional em mais edifícios de uso exclusivamente turístico”.
Em relação à mobilidade, o PCP diz que “é também necessária uma intervenção de manutenção e requalificação dos espaços públicos pedonais saturados, investimento nos recursos de operação dos transportes públicos e de mobilidade suave, regulando a sua articulação e interoperabilidade, designadamente na adequação de espaços próprios de circulação capazes de otimizar as respetivas redes”.
E garante: “Não pode o presidente Carlos Moedas acusar o PCP de se opor a iniciativas tendentes à resolução dos problemas enunciados”.
Sobre as principais falhas que possam ser apontadas à autarquia, o Livre enumera: Não programar obra, “o que tem sido feito tem sido terminar as obras programadas no mandato passado”, junta-se “não atender ao interesse público no que toca à proporção de habitação de renda acessível, quando está em causa a análise das propostas urbanísticas. Assim, dificilmente se consegue controlar o mercado imobiliário especulativo” e ainda, ao nível da mobilidade, “em vez de expandir as ciclovias e os corredores BUS, tem-se deixado entrar cada vez mais carros, incentivando o seu uso com propostas de construção de “parques dissuasores” no centro da cidade (e da área metropolitana)”. O Livre adianta ainda que “se as pessoas utilizam o carro para entrar em Lisboa, a batalha da mobilidade está perdida à partida. E sobre a medida dos transportes gratuitos, sendo em quantidade insuficiente e não funcionando a tempo e horas, ocorre-nos inevitavelmente a “metáfora do iogurte” — aqueles iogurtes grátis mas que já estão fora de validade: provamos o primeiro, mas se estiver estragado, nunca mais voltamos a experimentar”.
O i tentou ainda perceber a posição do Partido Socialista e do Bloco de Esquerda mas não teve resposta até ao fecho desta edição.